
As constantes travessias marítimas feitas por refugiados e migrantes que, ao longo dos últimos anos, têm procurado nos países da União Europeia (UE) melhores condições de vida, continuam a ser alvo de preocupação por parte do Parlamento Europeu.
O tema esteve em destaque no plenário desta manhã, numa altura em que os Estados-membros continuam a trabalhar para concluir a reforma do Pacto sobre Migração e Asilo.
Até porque, só este ano, mais de 2.500 pessoas morreram ou foram dadas como desaparecidas no mar Mediterrâneo enquanto faziam a viagem com destino à Europa, segundo os mais recentes dados do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR). Por outro lado, 186 mil migrantes provenientes do Norte de África acabaram por conseguir desembarcar no continente europeu.
Em causa está uma realidade que, além disso, tem motivado muitas narrativas de desinformação e levado à criação de alguns mitos - com o discurso anti-imigração a ganhar, inclusive, cada vez mais força. O Polígrafo reúne, neste artigo, alguns dos mitos mais recorrentes que têm percorrido as redes sociais.
Migrantes são um “fardo económico” para os países
Argumentos que defendem que os migrantes acabam por sobrecarregar o sistema económico dos países que os acolhem são uns dos mais comuns no discurso anti-imigração. Estudo de 2016 do Fundo Monetário Internacional (FM) mostra que estes não passam de um mito. Um aumento de um ponto percentual na percentagem de migrantes entre a população adulta pode mesmo aumentar o PIB (Produto Interno Bruto) per capita até 2%, a longo prazo. Isto tendo em conta tanto a contribuição dada pelos migrantes altamente qualificados, como por aqueles com menos qualificações - derivada da sua produtividade.
Migrantes são “preguiçosos” e “não querem trabalhar”
Muitas vezes, os migrantes são descritos como pertencendo a “culturas avessas ao trabalho”, que é o mesmo que dizer que não querem trabalhar. Mas será mesmo esse o caso? Dados recentes do Eurostat revelam que, em 2022, no conjunto da UE, a taxa de empregabilidade dos nativos na faixa dos 20 aos 64 anos era de 75,4%, ao passo que no caso dos cidadãos de outros Estados-membros da UE a percentagem era de 77,1%.
O caso dos cidadãos provenientes de países terceiros é, de facto, ligeiramente diferente, com uma taxa de empregabilidade na ordem dos 61,9%. Apesar de mais baixa, esta percentagem não é um comprovativo claro de que estas pessoas não têm intenções de desempenhar uma atividade laboral.
Até porque a “Alemanha, a Estónia, a Grécia, a Espanha, a França, a Hungria, a Finlândia e a Suécia foram os únicos Estados-membros em que a taxa de empregabilidade dos cidadãos nacionais foi superior à das duas categorias de cidadãos estrangeiros” no ano em análise, segundo o serviço de estatísticas da União Europeia.
Migrantes “não pagam impostos” e beneficiam de inúmeras “regalias” estatais
Esta é outra ideia, que circula também na sociedade portuguesa, desmistificada pela investigação científica. Um estudo citado pela publicação “São as migrações boas para a economia?” da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico) considerou o caso dos migrantes que chegaram aos países que fazem parte desta organização económica nos 50 anos anteriores a 2013, bem como ao Canadá, Austrália e Estados Unidos. A conclusão foi que estes indivíduos “contribuem mais em impostos e contribuições sociais do que recebem em benefícios individuais”.
A mesma fonte dá ainda conta de que, ao contrário daquilo que é a “crença generalizada do público, os imigrantes com baixos níveis de educação têm uma melhor situação fiscal - a diferença entre as suas contribuições e os benefícios que recebem - do que os seus pares nativos”. Quando isso não acontece, “tal não se deve a uma maior dependência dos benefícios sociais, mas antes pelo facto de terem frequentemente salários mais baixos e, por conseguinte, tenderem a contribuir menos”.
Migrantes vêm promover uma “substituição populacional”
Trata-se de uma alegação que também se disseminou em Portugal, dando conta de que, atualmente, mais de 50% da população lisboeta seria já imigrante. Mas, tal como o Polígrafo tinha já noticiado, é uma afirmação inteiramente falsa.
O mesmo é válido se olharmos para o conjunto da UE. Os mais recentes dados do Eurostat sobre o tema remontam a 2021 e mostram que, das pessoas com idades entre os 15 e os 74 anos pertencentes a agregados familiares na UE, apenas 13% das mesmas nasceram no estrangeiro. Contabilizam-se ainda 4% de indivíduos nativos com um dos progenitores nascido noutro país, e outros 3% em que ambos os pais são estrangeiros.
Nos restantes casos (80% do total), estamos perante indivíduos nativos cujos pais também o são, o que contraria a alegação de que está em curso uma “substituição populacional” no bloco europeu.
Migrantes enquanto fonte de “insegurança” e “terrorismo”
Nas redes sociais têm circulado, ao longo dos últimos anos, várias publicações que relatam alegados ataques perpetrados por migrantes, tanto em Portugal como em outros países da UE. Tudo isto com o intuito de fazer crescer na opinião pública uma sensação de insegurança que seria causada por estes indivíduos, que são muitas vezes associados a causas terroristas. Apesar de ter já sido identificado (e noticiado) o envolvimento de requerentes de asilo em alguns ataques perpetrados em território europeu - em países como Alemanha, Suécia e Finlândia, entre outros -, importa lembrar que as generalizações são sempre perigosas.
Aliás, um relatório do “think thank” eslovaco GLOBSEC fez um mapeamento sobre “Quem são os Jihadis europeus?”, com base nos dados dos 11 países europeus com o maior número de detenções por crimes de terrorismo. De um total de 197 indivíduos identificados - que acabaram detidos, abatidos ou expulsos do bloco europeu -, 144 tinham passado a grande maioria da sua vida em países da UE.
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Este artigo foi desenvolvido pelo Polígrafo no âmbito do projeto "EUROPA". O projeto foi cofinanciado pela União Europeia no âmbito do programa de subvenções do Parlamento Europeu no domínio da comunicação. O Parlamento Europeu não foi associado à sua preparação e não é de modo algum responsável pelos dados, informações ou pontos de vista expressos no contexto do projeto, nem está por eles vinculado, cabendo a responsabilidade dos mesmos, nos termos do direito aplicável, unicamente aos autores, às pessoas entrevistadas, aos editores ou aos difusores do programa. O Parlamento Europeu não pode, além disso, ser considerado responsável pelos prejuízos, diretos ou indiretos, que a realização do projeto possa causar.
