
João Rendeiro tinha "apenas uma condenação" em tribunal?
Foi a primeira vez que João Rendeiro foi visto desde que fugiu de Portugal, em setembro de 2021. Em entrevista à CNN Portugal, o ex-banqueiro revelou a sua intenção de não regressar ao país para cumprir a pena de prisão a que tinha sido condenado e referiu até que apenas tinha sido condenado uma vez a prisão efetiva em tribunal.
O Polígrafo verificou, em novembro de 2021, que o fundador e antigo presidente executivo do Banco Privado Português (BPP), ao contrário do que afirmou na entrevista, já tinha sido condenado três vezes em tribunal a penas de prisão efetiva (uma das quais com possibilidade de suspensão da execução), por crimes de burla qualificada, falsidade informática e fraude fiscal.
No dia 15 de outubro de 2018, Rendeiro foi condenado a cinco anos de prisão por crimes de falsidade informática e falsificação de documentos, com pena suspensa se pagar 400 mil euros à associação Crescer. A defesa de Rendeiro apresentou recurso, mas o Tribunal da Relação de Lisboa decidiu agravar a pena aplicada pelo tribunal de primeira instância em oito meses.
No dia 14 de maio de 2021, Rendeiro foi condenado a 10 anos de prisão efetiva num processo judicial que incide sobre a prática de crimes de fraude fiscal, branqueamento de capitais e abuso de confiança no BPP, por factos que ocorreram entre 2003 e 2008. O tribunal deu como provado que os arguidos (João Rendeiro e outros três ex-administradores do BPP) retiraram, no total, cerca de 31,2 milhões de euros.
Poucos meses depois, no dia 28 de setembro de 2021, Rendeiro foi condenado a três anos e seis meses de prisão efetiva num processo por crimes de burla qualificada. O julgamento teve origem numa queixa do embaixador jubilado Júlio Mascarenhas que, em 2008, investiu 250 mil euros em obrigações do BPP, poucos meses antes de ser público que a instituição estava numa situação grave e ter pedido um aval do Estado de 750 milhões de euros.
Avaliação do Polígrafo: Falso
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Rendeiro apresentou moradas de postos diplomáticos dos países para os quais viajou. Podia tê-lo feito?
Em setembro de 2021, João Rendeiro, que nessa altura já tinha sido condenado a três penas de prisão efetiva por crimes de burla qualificada, fraude informática e fraude fiscal, anunciou que não tencionava regressar a Portugal e descreveu este ato como de "legítima defesa". O Polígrafo respondeu a quatro perguntas sobre a fuga do ex-banqueiro, uma delas sobre a legitimidade de Rendeiro para apresentar moradas de postos diplomáticos dos países para os quais viajou.
Segundo um despacho emitido pela juíza de um dos processos em que o ex-líder do BPP era arguido, não estando sujeito à medida de Termo de Identidade e Residência, o ex-banqueiro podia viajar para qualquer país do mundo, ficando apenas obrigado a informar os processos em que é arguido sobre o destino para o qual se iria deslocar, bem como fornecer a morada do local onde ficaria instalado. No entanto, Rendeiro apresentou a morada dos postos diplomáticos como contacto nestas viagens.
Tal como foi noticiado pelo jornal "Observador", o Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa ordenou a sua presença em audiência no dia 1 de outubro de 2021. Ora, neste despacho lê-se o seguinte: "é inequívoco que uma representação consular ou uma embaixada não são lugares de livre disposição e fruição pelos cidadãos, sendo portanto desprovido de razoabilidade que o arguido as indique como constituindo o seu paradeiro."
Avaliação do Polígrafo: Falso
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Defesa pediu uma caução de apenas 2.190 euros para João Rendeiro sair em liberdade? Valor era considerado justo pelo Ministério Público sul-africano?
A defesa do ex-banqueiro, João Rendeiro, pediu uma caução de 40 mil rands sul-africanos, cerca de 2.190 euros. O valor foi avançado pelo advogado Sean Jelly ao defender pedido de liberdade sob caução no tribunal. Naveen Sewparsat, procurador da National Prosecuting Authority (NPA), Ministério Público sul-africano, afirmou na altura que o pedido de liberdade sob caução devia ser negado a bem da justiça.
Ao Polígrafo, em dezembro de 2021, o advogado e especialista em Código Penal Paulo Saragoça da Matta explicou que "a defesa pedir, num caso desta magnitude, uma caução de 2.190 euros é uma verdadeira afronta". Mais uma, refere, "às Justiças portuguesas e à soberania do Estado de que é nacional e de que se encontra foragido para cumprir uma pena de prisão".
A sobrelotação, indicou o advogado, "pode tornar os tribunais mais 'abertos' a aceitarem cauções, mas se a justiça sul-africana aceitar semelhante dislate, é de temer o pior para todo o processo de extradição. Além de ser um desrespeito por um Estado parte da Convenção que se obrigou a cumprir".
"Basta atentar que com dados de 2021, o salário mínimo na África do Sul é de 255 euros e o salário médio é de 992 euros", acrescentou o especialista em Direito Penal.
Avaliação do Polígrafo: Falso
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Cavaco fez discurso em 2006 a louvar João Rendeiro e outros empresários?
Em outubro de 2021, circulava nas redes sociais um vídeo em que o antigo Presidente da República, Cavaco Silva, discursava ao lado de João Rendeiro, elogiando "os empresários e gestores de sucesso". O Polígrafo verificou e era autêntico.
"Se, à capacidade do homem de negócios de sucesso, se juntar a grandeza humana de uma atitude filantrópica, a sociedade portuguesa será duplamente ganhadora. Por isso, quem quer o bem de Portugal e dos Portugueses não pode ter inibição em afirmar que precisamos de mais e não de menos empresários e gestores de sucesso (…)". As palavras são de Cavaco Silva, então presidente da República, e tinham também como referente João Rendeiro, que estava ao seu lado, na qualidade de presidente da Comissão Instaladora da Associação EIS – Empresários pela Inclusão Social.
O discurso foi proferido a de 20 de novembro de 2006, no Palácio da Ajuda, em Lisboa, no jantar comemorativo da constituição da Associação EIS, que juntou diversos políticos e empresários. Nessa ocasião, Cavaco Silva afirmou que "é de esperar que, cada vez mais, os nossos homens de negócios bem sucedidos dêem exemplos visíveis de partilha e de solidariedade, contribuindo pessoalmente para que as novas gerações beneficiem de um Portugal mais justo, coeso e progressivo" e deixou uma saudação especial aos empresários e gestores que constituíram a associação "não só pela generosidade demonstrada, mas também pela visão moderna de que dão prova: a empresa pode, em simultâneo, criar valor e justiça social".
Avaliação do Polígrafo: Verdadeiro
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João Cravinho e David Justino enalteceram qualidades de João Rendeiro em prefácios de livros?
"João Rendeiro, o banqueiro do Bloco Central dos prefácios", começava por ironizar Paulo Morais, antigo candidato à Presidência da República e atual presidente da associação Frente Cívica, em publicação no Facebook datada de 11 de dezembro de 2021.
Apresentava em seguida duas citações: "No prefácio de um dos livros de Rendeiro, o socialista João Cravinho elogia-o encomiasticamente: 'Chegar mais alto pelo seu próprio mérito, com toda a limpeza, é também apontar caminhos aos outros'. Noutro dos seus livros, no prefácio, David Justino (PSD) enaltece-o: 'João Rendeiro conhece bem os meandros da política e dos negócios'".
No que respeita a João Cravinho, ex-ministro do Equipamento, Planeamento e Administração do Território (no primeiro Governo liderado por António Guterres, entre 1995 e 1999) e ex-deputado do PS, trata-se do prefácio de um livro intitulado como "Testemunho de um Banqueiro" (Deplano Network, 2008), da autoria de João Rendeiro em colaboração com Myriam Gaspar.
"Chegar mais alto pelo seu próprio mérito, com toda a limpeza, é também apontar caminhos aos outros, um pouco como quem abre portas a futuras marés que levantam os barcos à medida que a linha de água sobe", escreveu Cravinho nesse texto, confirmando-se assim a veracidade da citação destacada no post sob análise.
Em fevereiro de 2009, aliás, quando a derrocada do Banco Privado Português (BPP) já se tornara evidente, Cravinho foi questionado pelo jornal "Diário de Notícias" sobre esse prefácio, dizendo então que não se tinha arrependido de o ter escrito. "O prefácio representa o que penso de João Rendeiro, até prova em contrário. Continuo a pensar que é um homem de bem", justificou o antigo governante.
Quanto a David Justino, ex-ministro da Educação e atual dirigente do PSD, trata-se do prefácio de um livro intitulado como "Arma Crítica" (Chiado Editora, 2014), colocado à venda através de uma editora de auto-publicação.
"João Rendeiro conhece bem os meandros da política e dos negócios em Portugal e não se coíbe de tomar posição, quantas vezes em contra-corrente ao mainstream construído diariamente entre política, negócios e media. É esta atitude que o distingue do discurso politicamente correto que domina o dia-a-dia desta minúscula praça financeira sediada em Lisboa. Quando estes meios são de reduzida escala tudo se torna mais previsível, salvo as tempestades financeiras que a globalização faz chegar ao mais recôndito lugar do mundo, principalmente quando a sua exposição é inversamente proporcional ao seu tamanho e relevância", escreveu Justino nesse texto, confirmando-se assim também a veracidade dessa citação.
Avaliação do Polígrafo: Verdadeiro
