Facto: o Pedro Nunismo sobreviveu pouco mais de um ano ao comando do PS. Não há uma resposta única para a determinante queda dos socialistas no último domingo, mas há uma verdade incontornável: Pedro Nuno Santos (PNS) nunca conseguiu livrar-se dos fantasmas que ele próprio alimentou. Com três letras apenas, o maior de todos escreve-se assim: TAP.
Pouco experiente nas lides de secretário-geral, Pedro Nuno andava “nisto” há anos. É até comum depararmo-nos com vídeos e fotografias da sua juventude, esguio e com óculos, a passear por programas de televisão. Ou com momentos como aquele em que o então vice-presidente da bancada dos socialistas, durante os tempos da troika, sugeriu que o país poderia simplesmente não pagar a dívida: “Estou-me marimbando para os nossos credores. Ou os senhores se põem finos ou nós não pagamos. E se nós não pagarmos a dívida e se lhes dissermos, as pernas dos banqueiros alemães até tremem!”Antes de se tornar secretário-geral, PNS ainda teve tempo de assinar um despacho à revelia de António Costa para avançar com o aeroporto de Lisboa e de afirmar (falsamente) que não sabia da indemnização milionária a Alexandra Reis, ex-Administradora da TAP. O país, ao contrário do PS, não esqueceu o passado de Pedro Nuno. Logo depois das primeiras eleições perdidas para a AD, era tempo de mudar isso. A solução: permitir a aprovação de um orçamento marcado por compromissos longe do ideal socialista.
Crenças: Ao contrário de outros líderes políticos, foram raras as vezes em que Pedro Nuno Santos desprezou o papel do jornalismo e até do fact-checking. O líder do PS pediu, vezes sem conta, a verificação de frases e a intervenção de um qualquer “Polígrafo”. Respondemos várias vezes aos seus pedidos. Para validar dados, sim, mas também para contrariar o socialista. Enquanto ministro das Infraestruturas, escrutinámos ao pormenor as suas declarações e as várias polémicas em que se envolveu.
No ano de 2023, ao lado de João Galamba, Pedro Nuno foi a “Mentira Nacional do Ano” do Polígrafo. A síntese, que agora até soa curta, era esta: ”Uma teia de falsidades, omissões, versões contraditórias. Da indemnização de 500 mil euros à reunião ‘secreta’ com deputados do PS, por entre mensagens no WhatsApp e culminando no mistério do assalto noturno ao Ministério das Infraestruturas. Foi a série de casos que mais desgastou o último Governo de António Costa e uma das principais fontes de trabalho para a redação do Polígrafo ao longo de 2023.”
Pedro Nuno lutou várias vezes com a verdade e é possível que tenha perdido antecipadamente o embate com Montenegro quando, por exemplo, a 2 de novembro de 2023 a Administração da TAP anunciou que não iria devolver os 3,2 mil milhões de euros que o Estado português tinha emprestado à companhia aérea no âmbito do plano de reestruturação aprovado por Bruxelas em 2021. Ou até antes, em 2021, quando defendeu o direito à estabilidade no emprego mas anunciou que ia despedir 500 pessoas na TAP.
Até agora, à medida que este texto se vai escrevendo, é inevitável fugir à palavra-mãe: TAP. Pedro Nuno esteve sempre à mercê de uma companhia aérea.
De volta aos factos: o Pedro Nunismo no PS termina hoje. O seu criador, um radical que se revelou moderado, demitiu-se ainda em noite eleitoral, depois de um resultado trágico que terá dias ainda piores (quando os votos dos emigrantes revelarem o número de deputados que o Chega pode ainda conquistar). PNS leva consigo uma ideia de vitória que colapsou muito antes das eleições e que não sobreviveu ao peso da verdade nem ao confronto com a memória política recente.
“Até breve, obrigado a todos”. As últimas palavras enquanto líder, no hotel Altis, não precisam de fact-check. Pedro Nuno Santos vai voltar. Resta saber quando e como.