Pedro Nuno Santos, que começa a ser ouvido às 14h, terá que esclarecer os deputados sobre o processo indemnização de Alexandra Reis, ex-Administradora da TAP, um dia depois de o seu antigo secretário de Estado, Hugo Mendes, ter estado presente na CPI para responder às principais dúvidas dos participantes. Recorde as principais polémicas em que Pedro Nuno esteve envolvido. E tudo o que ficou por esclarecer.
Afinal, o ministro sabia ou não da indemnização de Alexandra Reis?
A 29 de dezembro do ano passado, quando apresentou a sua demissão, Pedro Nuno Santos garantiu que sabia da existência do acordo de rescisão de Alexandra Reis com a TAP. O que o então ministro não sabia – ou não disse que sabia – era o valor da indemnização a pagar à ex-Administradora. No comunicado enviado às redações nesse dia, o gabinete de Pedro Nuno Santos escreveu que o acordo de rescisão da TAP com Alexandra Reis, em fevereiro de 2022, tinha sido comunicado ao secretário de Estado das Infraestruturas, Hugo Mendes, que “não viu incompatibilidades entre o mandato inicial dado ao Conselho de Administração da TAP e a solução encontrada”. Os dois saíram do Governo.
Antes disso, a 26 de dezembro, quer o ministro quer o seu secretário de Estado assinavam um despacho a pedir esclarecimentos à TAP sobre o processo de saída de Alexandra Reis. O motivo era o montante chorudo de 500 mil euros que a TAP se preparava para pagar a Alexandra Reis.
Apenas um mês depois, Pedro Nuno Santos admitia que, afinal, sabia da indemnização de 500 mil euros paga pela TAP a Alexandra Reis e que, para mais, acordou por escrito que fosse esse o valor a pagar. No esclarecimento público feito pelo próprio, lê-se o seguinte: “Da análise complementar à comunicação informal, há efetivamente uma anuência política escrita por parte do Secretário de Estado à CEO da TAP (…) Neste processo de reconstituição, foi encontrada ontem (19 de janeiro de 2023), por mim, uma comunicação anterior da minha então Chefe do Gabinete e do Secretário de Estado, de que nenhum dos três tinha memória, a informarem-me do valor final do acordo a que as partes tinham chegado.”
“Nessa comunicação dizem-me que é convicção dos dois, em face da recomendação da CEO da TAP e da sua equipa de advogados e das informações que receberam dos mesmos, que não era possível reduzir mais o valor da compensação. Aquilo que me foi pedido nessa comunicação foi anuência política para fechar o processo e a mesma foi dada”, corrigiu o ministro.
TAP estava em condições de pagar o “empréstimo” do Estado em 2025, mas não o vai fazer
A confirmação surgiu a 2 de novembro de 2022, quando a Administração da TAP assumiu que não vai devolver os 3,2 mil milhões de euros que o Estado português tinha emprestado à companhia aérea no âmbito do plano de reestruturação aprovado por Bruxelas em 2021.
Empréstimo ou injeção de capital? Gonçalo Pires, diretor financeiro da empresa, defende que o plano de reestruturação não envolve dívida, pelo que a devolução do montante cedido pelo Estado não está sequer prevista no documento assinado entre a TAP e a Comissão Europeia.
Nesse sentido, o Polígrafo analisou os documentos oficiais.
De acordo com a Comissão Europeia, o financiamento da reestruturação da TAP através dos 3,2 mil milhões de euros incluía o “empréstimo de resgate de 1,2 mil milhões de euros, a ser convertido em capital próprio”. Bruxelas apontou ainda, à data, que “ao abrigo da medida de compensação, o auxílio assumirá a forma de (i) uma injeção de capital; ou (ii) um empréstimo que pode ser convertido em capital. A escolha entre estas formas de apoio caberá ao Governo português”.
A última tranche da ajuda do Estado vai ser transferida até dezembro de 2022 e ascende a 990 milhões de euros (montante que está inscrito no Orçamento do Estado para 2022), mas o Estado também já não vai reaver esse dinheiro.
Contudo, na perspetiva do ex-ministro das Infraestruturas e da Habitação, Pedro Nuno Santos, a TAP “está a pagar aos portugueses desde o primeiro dia em que foi salva. Em passageiros, nas exportações, nas compras que faz, no apoio que dá ao turismo do país”.
Recuemos até dezembro de 2020, quando o antigo ministro marcava presença numa conferência de imprensa sobre a TAP. Nessa altura, Santos garantia: “Em 2025, a TAP já estará em condições de devolver algum do dinheiro ao Estado português.”
Por seu lado, Miguel Cruz, o secretário de Estado do Tesouro, que também estava presente na conferência de imprensa, foi mais contido: “Não podemos perder de vista que o plano tem como objetivo a sustentabilidade da TAP a médio prazo. A companhia tem de atravessar este período de recuperação e ser sustentável.”
“Temos de ter a noção que quando olhamos para o setor, qualquer coisa como 220 mil milhões de dólares foram acrescidos à dívida das companhias aéreas. Vamos ter de dar atenção à reestruturação do balanço. Em 2025, a procura estará muito próxima do que foi fechado em 2019. Estamos a falar de estar acima dos 3 mil milhões de euros de receitas da TAP em 2025. Isso significa que o equilíbrio operacional será entre 2023 e 2024. Isso é um tema importante para a reestruturação e para a posição da TAP perante os mercados”, afirmou Cruz.
“Só em 2025 é que conseguimos ter uma situação que permita à TAP gerar os recursos necessários para a operação e começar, marginalmente, a reembolsar o empréstimo“, sinalizou. Mas cerca de dois anos depois, a principal e única forma de o Estado poder reaver o dinheiro que injetou na companhia aérea seria através da venda da participação no capital, ou seja, da reprivatização da TAP.
Pedro Nuno Santos defendeu direito à estabilidade no emprego, mas anunciou que ia despedir 500 pessoas na TAP
Também em maio de 2021, Pedro Nuno Santos enfrentava uma aparente contradição, enquanto ministro das Infraestruturas e da Habitação e deputado da oposição (durante o Governo liderado por Pedro Passos Coelho, baseado numa coligação entre o PSD e o CDS-PP), quando dois excertos de declarações proferidas pelo visado nessas duas situações distintas foram difundidos no Facebook.
O primeiro excerto foi recolhido a partir de uma entrevista à SIC do ministro das Infraestruturas e da Habitação, a 23 de abril de 2021. Questionado sobre o plano de reestruturação da TAP, Pedro Nuno Santos declarou que “neste momento há um conjunto de perto de 500 trabalhadores que estão identificados para um processo de despedimento coletivo, mas obviamente que ainda há tempo para poderem optar pelas medidas voluntárias que já tinham sido apresentadas antes”.
Quanto ao excerto mais antigo, é preciso recuar até setembro de 2011 para identificar a origem de tal declaração. Foi recolhida a partir de um discurso proferido por Pedro Nuno Santos no âmbito do XVII Congresso Nacional do PS. O então deputado afirmava que “a direita ganhou quando nos convenceu que para criar mais emprego é necessário flexibilizar o mercado de trabalho. A direita ganhou quando nos explicou que o trabalho para toda a vida acabou. A direita ganhou quando conseguiu dizer à minha geração, habituem-se, isto até é bom, hoje trabalham num emprego, amanhã noutro, hoje numa terra amanhã noutra, como se a estabilidade do emprego não fosse um direito legítimo de qualquer cidadão, como se nós não soubéssemos que para qualquer jovem construir uma vida a médio ou longo prazo precisa de estabilidade. Não é um privilégio, é um direito“.
Pedro Nuno garantiu que despedimentos na TAP não eram “inevitáveis” mas anunciou, em 2020, 1.600 despedimentos
No dia 15 de outubro de 2020, Pedro Nuno Santos participou em audição na Comissão de Economia, Inovação, Obras Públicas e Habitação, na Assembleia da República, a propósito dos objetivos do plano de reestruturação da TAP, mediante requerimento do Bloco de Esquerda. Durante a sua intervenção, revelou que “no total do grupo [da TAP], neste momento, saíram já 1.200 [trabalhadores] e prevê-se que saiam 1.600 até ao final do ano“.
Nesse âmbito, defendeu que os despedimentos são inevitáveis. “Nós não podemos fazer de outra maneira, nomeadamente manter emprego que depois, obviamente, não tem trabalho”, alegou. Há cerca de quatro meses, porém, quando o Governo preparava a renacionalização da TAP, o mesmo ministro assegurara: “Os despedimentos não têm que ser inevitáveis. Há várias formas de fazermos uma reestruturação da empresa. O que ela tem é de ser feita com os sindicatos e há várias formas de fazermos isso. Os sindicatos têm várias sugestões e propostas. É um trabalho que vamos fazer.”