A ausência do PCP na sessão no Parlamento destinada a apoiar Volodymyr Zelensky – convidando-o a discursar – foi explicada pela líder parlamentar do PCP, Paula Santos, na quarta-feira, com este argumento: “Volodymyr Zelensky personifica um poder xenófobo e belicista, rodeado e sustentado por forças de cariz fascista e neonazi, incluindo de carácter para-militar, de que o chamado Batalhão Azov é exemplo.”
O Polígrafo olhou para os argumentos do PCP e verificou um a um.
1.
O que está em causa: Desde que Zelensky é presidente, foi iniciado algum conflito militar, interno ou externo, pela Ucrânia enquanto Estado (com exceção da defesa à agressão russa, desde 24 de fevereiro deste ano)?
A análise: Volodymyr Zelensky foi eleito a 21 de abril de 2019. Todos os conflitos armados – civis e militares – anteriores a 2022 que tiveram ou têm a Ucrânia como palco iniciaram-se na primeira metade da década: Euromaidan (2013/2014); Donbass (2014). Também a crise na Crimeia – com a perda do território, mas sem confronto militar, apesar do posicionamento de tropas russas – é dessa época (2014).
No discurso de posse, a 20 de maio, Zelensky afirmou que o cessar fogo no Donbass era uma prioridade.
Avaliação do Polígrafo: Falso
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2.
O que está em causa: No mandado de Zelensky, desde 2019, houve alguma medida segregadora em relação à presença ou direito à cidadania de algum povo ou etnia ou a proibição do uso da língua russa?
A análise: Não houve nenhuma lei aprovada nem a evidência de prática reiterada discriminatória relativamente a algum povo ou etnia.
No que concerne o idioma russo, a 25 de abril de 2019, quatro dias depois da eleição de Zelensky (mas ainda sem este ter tomado posse), o parlamento ucraniano (órgão de soberania autónomo) aprovou uma lei que obrigavao uso do idioma ucraniano na administração pública e ao seu reforço nos órgãos de comunicação social.
A iniciativa legislativa foi elogiada pelo então ainda presidente ucraniano, Poroshenko, que acabara de perder as eleições presidenciais. Zelensky dissolveu o Parlamento logo no discurso da sua investidura, menos de um mês depois da aprovação desta lei.
Recorde-se que na Ucrânia, os idiomas ucraniano e russo eram ambos de uso generalizado. Zelensky, por exemplo, falava primacialmente russo.
Avaliação do Polígrafo: Falso
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3.
O que está em causa: O Batalhão Azov foi criado ou institucionalizado durante o mandato de Zelensky?
A análise: Este batalhão tem, de facto, a sua matriz em movimentos neonazis e supremacistas brancos, desde logo indiciada pelo símbolo que adotou.
Contudo, foi criado em 2014 – para combater as forças pró-russas no conflito no Donbass – e integrado na Guarda Nacional Ucraniana no final de 2014, mais de quatro anos e meio antes de Zelensky chegar à política e ao topo da hierarquia de Estado.
São imputadas a este grupo várias atrocidades nessa guerra civil que decorre na parte leste do país. Atualmente, é uma das forças militares que constitui o bloco militar ucraniano que combate as tropas russas, tentando travar o avanço dos invasores no território da Ucrânia, embora minoritária no relativamente ao contingente global de soldados e milicianos.
Avaliação do Polígrafo: Falso
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4.
O que está em causa: Nas eleições presidenciais de 2019, Zelensky foi apoiado por algum movimento de cariz fascista e/ou neonazi?
A análise: Quando concorreu na primeira volta das eleições presidenciais de 2019 (31 de março), Zelensky não tinha qualquer experiência de cargos políticos e alicerçava a sua candidatura no partido que os seus amigos e colegas (da produtora audiovisual Kvartal 95) tinham fundado precisamente um ano antes: “Servo do Povo”.
Os outros dois candidatos mais votados foram:
- Petro Poroshenko – presidente desde 2014, símbolo da rutura com a Rússia, justamente por suceder a um presidente alinhado com Moscovo, o deposto Víktor Ianukóvytch (entre ambos, o país foi dirigido interinamente por Olexandr Turtchynov). Politicamente, tinha o suporte do partido “Solidariedade”.
- Yulia Timochenko – antiga primeira-ministra, ligada à revolução laranja (2004/5), defendia também a ocidentalização da Ucrânia e a autonomia total da influência russa. O partido que a apoiava era o Pátria.
Todos eram pró-europeus e defensores do liberalismo, embora no espectro político Yulia Timochenko fosse considerada a candidata mais à direita.
Já no quadro geral das candidaturas, eram outros dois os concorrentes que reclamavam o ultranacionalismo (e a ele eram associados) e concentravam o voto radical: Oleh Lyashko (Partido Radical) e Ruslan Koshulynskyi (Svoboda).
À partida para a segunda volta das presidenciais (Poroshenko e Zelensky) e também logo após a eleição, a vitória de Zelensky era vista – também pela Rússia – como uma esperança para uma solução política para o conflito entre os dois países, que tinha no Donbass o seu epicentro.
O próprio Zelensky não fechou a porta a uma solução diplomática, marcando a diferença para o seu adversário e depois antecessor.
Avaliação do Polígrafo: Falso
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5.
O que está em causa: Desde 2014 morreram mais de 15 mil habitantes na região do Dombass, porque há um poder que ataca e massacra a própria população ucraniana?
A análise: O conflito armado no Donbass, que opõe desde o primeiro semestre de 2014 grupos separatistas pró-Rússia (com o apoio deste país) e as forças militares ucranianas, consubstancia uma situação de guerra civil nesta região do extremo leste da Ucrânia.
A indicação de 15 mil habitantes do Donbass mortos na guerra civil não é confirmada por qualquer fonte da ONU. Se analisarmos o relatório das Nações Unidas (ACNHUD) verificamos:
– 3.375 civis mortos (oito meses depois, esse número, conforme já foi citado, era estimado em 3.393)
– 4.150 militares ucranianos
– 5.700 membros de grupos armados pró-russos
Avaliação do Polígrafo: Falso
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Não se confirmam, assim, as imputações de um poder “xenófobo e belicista, rodeado e sustentado por forças de cariz fascista e neonazi” que o PCP faz ao atual presidente eleito da Ucrânia.
Zelensky herdou o conflito militar no Donbass (existente desde 2014), bem como, nesse contexto, a participação do lado ucraniano (contra os separatistas pró-russos) de um grupo que, de facto, é formado por vários elementos de extrema-direita e até nazis (Batalhão Azov), mas que é minoritário no quadro da Guarda Nacional Ucraniana. Politicamente, Zelensky não beneficiou do apoio da extrema-direita na sua eleição, em 2019.