No tradicional debate quinzenal, o Primeiro-Ministro voltou a esgrimir as estatísticas que já exibiu noutras ocasiões - a última foi no debate final do Orçamento do Estado para 2019. Alguns argumentos foram repetidos, outros sofreram ligeiras alterações relativamente a anteriores afirmações, outros ainda revelaram-se incorretos. Mas uma vez mais, como sucedeu noutros debates parlamentares, António Costa protegeu-se, utilizando genericamente estatísticas fiáveis.

Vamos por pontos:

  • SOBRE A QUEDA DO DÉFICE

Este é um tema que António Costa aborda sempre que quer sublinhar os feitos macro-económicos da sua governação - e a verdade é que tem motivos para isso. No que respeita a 2018 e 2019, ainda temos de nos basear em estimativas não passíveis de verificação, mas tudo aponta para que tenhamos este ano um défice próximo de zero - o mais baixo de sempre da democracia portuguesa.

Quanto a 2016, registou-se um défice público de -2% do PIB, o mais baixo em democracia até então.

Relativamente a 2017, as coisas não são tão lineares, uma vez que dependem de quem lê os números. O Governo prefere encará-los numa perspetiva "bondosa"; o INE e a oposição nem por isso. O Executivo considera que o défice do ano passado foi de -0,9% do PIB, mas a contabilização da injeção de capital (cerca de 4 mil milhões de euros) pelo Estado português na Caixa Geral de Depósitos (CGD) faz elevar o défice para -3%. O INE seguiu uma recomendação do Eurostat e incluiu o efeito da CGD no cálculo do défice público em 2017. No entanto, o ministro das Finanças, Mário Centeno, não concordou com essa inclusão. Para Centeno, tratou-se de “um investimento fora do regime de ajuda de Estado e não tem assim impacto, porque Portugal cumpriu todas as metas com que se comprometeu”.

Avaliação do Polígrafo: Verdadeiro, mas...

  • SOBRE A CRIAÇÃO DE EMPREGO

O Primeiro-Ministro afirmou que temos mais 341 mil postos de trabalho do que em 2015. Mais: que na sua esmagadora maioria (87%) são trabalho "com estabilidade" - ou seja, sem vínculo precário.

De acordo com os dados oficiais do Instituto Nacional de Estatística (INE), a população empregada em Portugal passou de 4.495 milhões de pessoas em novembro de 2015 (no início da legislatura) para 4.814 milhões de pessoas em setembro de 2018 (são os dados mais recentes, plasmados nas Estimativas Mensais de Emprego e Desemprego de outubro de 2018). Ou seja, foram criados cerca de 319 mil novos postos de trabalho ao longo da legislatura, ligeiramente abaixo do número evocado por Costa.

Quanto à precariedade, Costa mudou ligeiramente o último número que utilizou no debate sobre o Orçamento do Estado, em que afirmou que, do emprego criado, 89% é não precário. Hoje disse que esse número se cifra em 87%. No 10º Relatório de Acompanhamento do Acordo sobre a Retribuição Mínima Mensal Garantida, especificamente a Tabela 6 ("Evolução da população empregada por situação na profissão") contabilizaram-se, no final de 2017, 3.080 milhões de trabalhadores com contrato sem termo e 728 mil trabalhadores com contrato com termo. No terceiro trimestre de 2018 contabilizam-se 3.182 milhões com contrato sem termo e 760 mil com contrato com termo.
Quanto à precariedade, Costa mudou ligeiramente o último número que utilizou no debate sobre o Orçamento do Estado, em que afirmou que, do emprego criado, 89% é não precário. Hoje disse que esse número se cifra em 87%. 
 Em suma, a tabela indica mais 134 mil contratos (102 mil sem termo e 32 mil com termo) entre o final de 2017 e o terceiro trimestre de 2018. A percentagem dos contratos sem termo nos novos postos de trabalho é assim de 76,1%, número inferior ao salientado pelo primeiro-ministro.

Avaliação do Polígrafo: Impreciso

  • SOBRE A SUBIDA DO RENDIMENTO DAS FAMÍLIAS

Uma vez mais, o Primeiro-Ministro alterou ligeiramente os números face ao debate do OE para 2019. Na ocasião referiu que o rendimento médio líquido dos trabalhadores por conta de outrem cresceu 6,8% durante a legislatura. Hoje falou (erradamente) em 6,4%. Quando o Governo de António Costa assumiu funções no final de 2015, o salário médio mensal líquido em Portugal estava nos 834 euros. Passados três anos, o rendimento líquido mensal dos portugueses atinge os 891 euros, segundo os dados do INE relativos ao terceiro trimestre deste ano.

Desde o início da legislatura até agora, o salário médio mensal líquido dos portugueses subiu 6,834%, dos 834 euros para os 891 euros.

Avaliação do Polígrafo: Verdadeiro, mas...

  • SOBRE A REDUÇÃO DA DÍVIDA

A questão da dívida é outra que António Costa aborda sempre que fala dos indicadores macro-económicos - o que não é de estranhar, uma vez que se trata de um elemento fundamental para medir a saúde das contas da nação. Hoje o chefe do Executivo voltou a dizer que este governo reduziu a dívida - o que é certo e é errado. Uma vez mais, depende com que olhos analisamos os indicadores.

Porque é errado?

Porque desde que António Costa tomou posse que a dívida absoluta aumentou, num total de 17,419 mil milhões de euros. Dos 231,526 mil milhões de euros registados em Novembro de 2015, a dívida continuou a subir desde então. Nos últimos três anos, a dívida subiu 7,5% para um total de 248,955 mil milhões de euros em Setembro de 2018, segundo os dados do Banco de Portugal.

Porque é certo?

Porque a dívida em percentagem do PIB (Produto Interno Bruto) está efetivamente a descer. Dos 125,7% registados em 2017, o FMI prevê que atinja os 120,8% no final de 2018. Para o próximo ano, a dívida deverá atingir os 117,2% do PIB português. Isto acontece porque a economia portuguesa está a crescer, logo a criar mais riqueza. O PIB nacional fechou 2017 nos 193,1 mil milhões de euros. Para este ano, o FMI espera que o país crie 200,6 mil milhões de euros de riqueza. Para 2019, a expectativa do Fundo é que Portugal atinja um PIB de 207,5 mil milhões de euros. Em resumo, é correto afirmar-se que o Governo conseguiu reduzir a dívida em percentagem do PIB, mas não podemos esquecer que dívida absoluta aumentou e vai continuar a aumentar.

Avaliação do Polígrafo: Verdadeiro mas...

Orçamento do Estado
créditos: José Caria
  • SOBRE FRANÇA E ANGOLA

António Costa referiu a especial importância que as boas relações com Angola têm para a economia portuguesa. O Primeiro-Ministro referia-se à visita recente do Presidente angolano João Lourenço  a Portugal, onde foi recebido, no entender de alguns, com uma certa reverência. Para justificar o peso de Angola em termos de potencial, António Costa decidiu fazer uma comparação da área total de Angola com a de França: "Angola tem 3 vezes a área de França." Não é verdade. Na realidade, tem cerca do dobro: 1.246.700 km2 contra 643.801 km2. 

Avaliação do Polígrafo: Pimenta na Língua

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