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É preciso pensar para além do “zero waste”

Este artigo tem mais de um ano
Rita Tapadinhas, criadora de conteúdos sobre ambiente, escreve sobre o conceito de zero desperdício, lembrando que a adoção de um estilo de vida com menos lixo não é "a única dimensão relevante para a sustentabilidade".

O termo “zero waste” – em português, “zero desperdício” – tem-se tornado sinónimo de um estilo de vida sustentável um pouco por todo o mundo, mas, apesar de ser uma filosofia muito importante do ponto de vista ambiental, esta não é, de todo, a única dimensão relevante para a sustentabilidade.

O estilo de vida “zero waste” é, em linhas gerais, aquele cujo objetivo é reduzir, ao mínimo possível, o “lixo” ou o “desperdício” gerado. Neste contexto, podemos considerar vários “R’s” como linhas de ação orientadoras, nomeadamente a pirâmide de redução de desperdício popularizada por Bea Johnson, que nos indica que, por ordem de prioridades, devemos:

  1. Recusar tudo aquilo de que não necessitamos;
  2. Reduzir o consumo daquilo de que precisamos à quantidade que realmente nos faz falta;
  3. Reutilizar aquilo que já existe;
  4. Reciclar tudo aquilo que não podemos reutilizar;
  5. Reincorporar (ou compostar) os resíduos orgânicos.

Esta filosofia de vida contribui verdadeiramente para um estilo de vida mais sustentável, uma vez que permite uma gestão muito consciente do consumo e assim, de modo geral, uma tendência para a redução da pressão sobre os recursos naturais e da quantidade de lixo gerada e enviada para aterro ou incineração.

Apesar de, na verdade, o “zero waste” dever abarcar todo o ciclo de vida de um objeto, tentando-se reduzir o desperdício desde a fase de design, passando pela produção, transporte, utilização e descarte, este conceito é muitas vezes aplicado apenas à última fase, que é aquela que os indivíduos conseguem pôr em prática mais direta e imediatamente. Se um objeto for reciclável, então pode cumprir os requisitos mais básicos do “zero waste”, mesmo que a sua produção tenha envolvido um considerável nível de poluição ou, por outras palavras, “desperdício”. Um exemplo é o alumínio de origem não reciclada, que é produzido através da extração e transformação da bauxita.

Estes processos geram, em níveis diferentes, dependendo das práticas aplicadas, impactos e desperdício através da exploração mineira e transformação da bauxita, não obstante o alumínio ser infinitamente reciclável. Assim, apesar do facto de ser infinitamente reciclável, é importante conhecer, entre outros fatores, a própria origem do material.

Existem, na realidade, inúmeras dimensões relevantes a considerar, para além do desperdício, quando avaliamos a sustentabilidade de um objeto. As emissões de gases de efeito de estufa, a pegada hídrica, a origem das matérias-primas, a poluição gerada pelos processos de produção e transporte, a incorporação de uma lógica circular na produção e seleção das matérias-primas e o potencial de desflorestação ou perdas de biodiversidade são apenas mais alguns dos fatores relevantes.

Para identificar o impacto de um objeto, é necessário adotar uma perspetiva de ciclo de vida, e não focar exclusivamente no desperdício – esta é uma das razões pelas quais a sustentabilidade tem tantas nuances e, frequentemente, não há respostas taxativas que se apliquem a todos os contextos, existindo muitas áreas cinzentas.

O “zero waste” é, sem dúvida, uma excelente forma de tornar a sustentabilidade em algo tangível, apelativo e fácil de comunicar. É por isso, talvez, uma das melhores ferramentas que temos para trazer mais pessoas para a causa ambiental.

Além disso, o “zero waste” é, claramente, uma dimensão muito importante neste contexto. No entanto, à medida que a crise ambiental se vai tornando mais eminente, é importante ter consciência de que devemos ter uma perspetiva mais holística na avaliação do impacte ambiental de cada objeto ou estilo de vida.

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EMIFUND

Este artigo foi desenvolvido no âmbito do European Media and Information Fund, uma iniciativa da Fundação Calouste Gulbenkian e do European University Institute.

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