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Como as fake news conduziram os britânicos à confusão do Brexit

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Este artigo tem mais de um ano
Ao longo dos últimos anos, a imprensa inglesa tem publicado centenas de notícias comprovadamente falsas que disseminaram entre a população britânica ideias xenófobas, segundo as quais uma boa parte dos problemas da sociedade poderia ser explicada pela entrada excessiva de migrantes.

No dia em que o Parlamento britânico recusou o acordo proposto pelo Governo da primeira-ministra, Theresa May, para a saída da União Europeia (UE) com 202 votos a favor e 432 votos contra, o Polígrafo divulga um vídeo que ajuda a explicar a importância das fake news no processo do Brexit.

Trata-se de uma conferência de Jon Danzig, jornalista de investigação e fundador da plataforma Reasons2Remain, que defende a permanência do Reino Unido na União Europeia.

A tese de Danzig passa por defender, através da exibição de casos práticos, que os jornais e as televisões da Grã-Bretanha foram vítimas (e protagonistas) de uma campanha organizada de desinformação cujo objetivo foi disseminar o ódio e a xenofobia contra a entrada de migrantes em território britânico.

Para materializar esta finalidade, foram publicadas, sobretudo pela imprensa tabloide, primeiras páginas totalmente falsas sobre privilégios a migrantes que nunca existiram, sobre violência alegadamente perpetrada por refugiados contra cidadãos britânicos ou sobre a perda de privilégios que a sua entrada em fronteiras britânicas significaria para os ingleses de uma forma geral.

Para Jon Danzig, estas pessoas foram tratadas com se fossem sub-humanas, instrumentalizadas em nome de uma ideia: a de que a sua presença em território britânico era perigosa e que só havia uma maneira de acabar com o fenómeno: a saída da União Europeia.

Vejam a intervenção:

[facebook url=”https://www.facebook.com/Reasons2Remain/videos/749797652046273/”/]

Os migrantes estiveram no centro de todos os debates sobre o Brexit, mas a desconfiança dos britânicos relativamente à União Europeia vem de longe, tendo sido largamente potenciada pela imprensa inglesa, que ao longo dos últimos tem vindo a publicar centenas de fake news sobre a Europa, algumas delas totalmente fantasiosas. Veja 7 das mais escandalosas:

  • Notas de Euro provocam impotência

A mentira: publicada pelo tabloide The Sun a 2 de março de 2002, a história garantia que uma nota de 10 euros fora testada num laboratório alemão a pedido da revista “Ökotest” e surgiu depois de um condutor de autocarros alemão afirmar que uma nota de 10 euros lhe tinha causado impotência.

O facto: Antes do lançamento das notas em euros, o Banco Central Europeu (BCE) fez todos os testes  todas as sete denominações contra de acordo com as mais rigorosoas regras de saúde e segurança, tendo concluído que não causam quaisquer problemas de saúde em condições normais de utilização.

  • UE acaba com varão dos quartéis de bombeiros

A mentira: de acordo com uma notícia do Daily Mail de 16 de junho de 2002, a União Europeia queria proibir nos quartéis a utilização dos varões por parte dos bombeiros devido às novas diretivas europeias de segurança.

O facto: as normas que eram citadas no artigo do Daily Mail não existem e nas diretrizes da UE, que estavam em vigor à data da publicação do artigo, não existia nenhuma referência aos varões de bombeiros.

brexit
  • Corgis serão banidos pela UE

A mentira: Segundo o Daily Mail do dia 30 de abril de 2002, os corgis, a raça canina favorita da rainha de Inglaterra, poderiam vir a ser banidas, ao abrigo da chamada “Convenção da UE”.

O facto: a “Convenção da UE” nada tem a ver com a UE, sendo um organismo sem qualquer poder deliberativo, constituído por um comité de especialistas em proteção animal. A Convenção Europeia para a Proteção de Animais de Estimação em 1987, criada pelo comité sob os auspícios do Conselho da Europa, não obriga nenhum Estado a segui-la – a adesão é totalmente voluntária e o Reino Unido nunca tomou essa iniciativa.

  • UE prepara-se para banir as fotos do London Eye

A mentira: a famosa atração que se tornou um ícone da capital inglesa é uma das mais fotografadas da cidade. Em 24 de Junho de 2015 o Daily Express noticiou que em 2015 que a UE se preparava para banir as fotos de vários monumentos, entre os quais o London Eye, tornando ilegal a sua publicação nas redes sociais.

O facto: esta medida nunca esteve em cima da mesa. E, caso estivesse, teria de ser aprovada por larga maioria dos Deputados Europeus e ainda de ser aceite pelos Estados-Membros.

  • UE quer padronizar as dimensões dos preservativos

A Mentira: o The Independent on Sunday noticiou, a 12 de Março de 2000, que a UE tencionava padronizar as dimensões dos preservativos.

O facto: realmente houve uma intenção de padronizar, só que não foi a União Europeia que tomou essa iniciativa. Foi sim, a Agência Europeia de Normalização, um organismo de adesão voluntária, constituído por agências nacionais de normalização,que não está sequer ligada à União Europeia.

  • União Europeia quer acabar com exames britânicos

A mentira: segundo o Sunday Express de 23 de janeiro, a presidência portuguesa da UE desejava que os diplomas e graus de ensino britânicos se extinguissem, de modo a harmonizar todos os graus de ensino na UE.

O facto: para que isso acontecesse teria de se rever toda a legislação europeia sobre a matéria, uma vez que de acordo com a que estava em vigor toda a organização e conteúdos educativos eram da responsabilidade de cada Estado-Membro.

fake news
  • UE planeia acabar com as bebedeiras

A mentira: em 2005, tanto o The Sun como o Daily Star noticiavam a intenção da União Europeia de acabar com o excessivo consumo de bebidas alcoólicas. Mais concretamente, referiam a vontade da UE de controlar as licenças de venda específica deste tipo de bebidas.

O facto: a notícia era falsa. A UE não planeava mexer em nenhuma destas leis, até porque é uma matéria de competência exclusiva dos governos de cada país. O que a União Europeia estava a estudar era a possibilidade de implementar medidas que reduzissem os danos do excessivo consumo de álcool, com especial foco nos jovens.

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