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Voto antecipado mostra identificação do eleitor no envelope e por isso deixa de ser secreto?

Legislativas 2022
Este artigo tem mais de um ano
O que está em causa?
"Um excelente convite a cometer fraude eleitoral". É assim que uma eleitora descreve o processo de voto antecipado em mobilidade, dizendo que sentiu "desconforto" ao colocar o boletim de voto dentro de um envelope branco e depois num envelope azul que mostra alguns dos seus dados de identificação. "Não consigo encontrar explicação para os nossos votos estarem identificados", sublinha. O Polígrafo questionou a Comissão Nacional de Eleições para esclarecer esta dúvida.

As eleições legislativas estão agendadas para o próximo domingo, dia 30 de janeiro, mas cerca de 315 mil eleitores já puderam votar no passado domingo, dia 23 de janeiro, através do processo de voto antecipado em mobilidade (mediante inscrição prévia). Sofia Afonso Ferreira, candidata à Câmara Municipal de Lisboa nas últimas eleições autárquicas (pelo partido Nós, Cidadãos!), foi uma das pessoas que votou antecipadamente e diz ter sentido “desconforto” ao exercer o seu direito.

No dia em que votou, Ferreira publicou um texto no Facebook com a descrição do processo: “Só no fim, ao dirigir-me por último à minha própria secção no local, percebi a questão quando me esclareceram os procedimentos. Teríamos de colocar o nosso voto num envelope branco e depois esse envelope num outro azul… Identificado com o nosso nome e Cartão de Cidadão. E na urna entra o envelope azul”.

Numa publicação em que mostra esses envelopes, Ferreira sublinha: “Não consigo encontrar explicação para os nossos votos estarem identificados. E se a desculpa é evitar alguma ilegalidade, eu afirmo que pelo contrário este procedimento é um excelente convite a cometer fraude eleitoral“.

Mas será verdade que este procedimento coloca em causa o princípio basilar do voto secreto?

De facto, os eleitores que optaram pelo voto antecipado em mobilidade tiveram de colocar o seu boletim de voto dentro de um envelope branco e, posteriormente, inseri-lo num envelope azul no qual constam dados como o “nome, número do documento de identificação civil, concelho, freguesia e posto de inscrição no recenseamento eleitoral”. É o procedimento regular que está determinado no Artigo 79.º da Lei Eleitoral da Assembleia da República.

Questionado pelo Polígrafo, o porta-voz da Comissão Nacional de Eleições (CNE), João Tiago Machado, assegura que “o envelope azul só é identificado para saber qual é o destino dele, isto é, para ser entregue à mesa onde o eleitor iria votar no dia 30 de janeiro, caso não tivesse requerido o voto antecipado em mobilidade”.

A referida Lei Eleitoral da Assembleia da República estabelece também que “no dia seguinte ao do voto antecipado, as forças de segurança procedem à recolha do material eleitoral das mesas de voto em mobilidade, em todo o território nacional, para entrega aos presidentes das câmaras municipais, que providenciam pela sua remessa às juntas de freguesia onde os eleitores se encontram inscritos”.

Machado explica que o passo seguinte acontece a 30 de janeiro, no dia das eleições legislativas: “É na abertura dos trabalhos que se abre esse envelope azul, que está selado, descarregando-se o voto do eleitor no caderno eleitoral. Esse trabalho é feito no início para impedir que o eleitor vá lá votar segunda vez“.

“À medida que se vão abrindo os envelopes azuis, os envelopes brancos são todos postos de lado. Depois de descarregados os votos, abrem-se os envelopes brancos, já completamente descaracterizados, e insere-se o voto na urna, sem ser desdobrado”, afirma Machado.

Esta informação é confirmada pelo Artigo 87.º da Lei Eleitoral que detalha os quatro passos do procedimento da mesa em relação aos votos antecipados.

Por isso, garante o porta-voz da CNE, “a única coisa que se fica a saber é que essa pessoa votou antecipadamente. Em quem é que votou não se sabe“. Ou seja, o voto continua a ser secreto.

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Avaliação do Polígrafo:

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