“O casamento homossexual é anulado. Estrasburgo, França. Por unanimidade, o Tribunal de Direitos Humanos mais importante do mundo estabeleceu literalmente que ‘não há direito ao casamento entre pessoas do mesmo sexo‘”. Esta legenda repete-se em vários posts a circular no Facebook e Twitter desde 2016.
Conforme é explicado na publicação em análise, a alegada decisão do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) terá sido “fundada numa série de considerações filosóficas e antropológicas baseadas na ordem natural, família, senso comum, relatórios científicos e, é claro, no direito positivo”.
É falso que este órgão judicial europeu tenha decidido que “não há direito ao casamento entre pessoas do mesmo sexo”. O TEDH apenas é “competente para se pronunciar sobre queixas individuais ou estaduais que aleguem violações dos direitos civis e políticos consagrados na Convenção Europeia dos Direitos Humanos”. Ou seja, nunca teria o poder para “anular o casamento entre pessoas do mesmo sexo”.
A decisão em que se baseia a falsa declaração, emitida em 2016, apenas determina que cabe aos Estados decidir se permitem ou não as uniões matrimoniais entre pessoas do mesmo sexo. Em causa estava uma ação movida por dois franceses, Stéphane Chapin e Bertrand Charpentier, cujo casamento foi anulado em 2007 pela justiça francesa, porque as uniões entre pessoas do mesmo sexo não eram legais na época em França. O casamento entre pessoas do mesmo sexo foi aprovado neste país em 2013, em conjunto com a legalização da adoção por parte destes casais.
A anulação desta união, considerada por muitos como o primeiro casamento entre pessoas do mesmo sexo em França, deu início a uma longa batalha judicial nos tribunais franceses que culminou no recurso para a última instância: o TEDH. Em junho de 2016, a quinta secção do Tribunal de Estrasburgo, composta por sete juízes, decidiu sobre o litígio em causa: “Caso Chapin e Charpentier vs França“. Mas não se procedeu à anulação desta união, ou até a sua confirmação. O tribunal europeu entendeu, sim, que os Estados são livres de “não conceder o direito ao casamento mais do que aos casais heterossexuais”, tal como se lê na referida sentença.
Neste caso, o casal denunciou o Estado francês de ter violado os direitos previstos nos artigos 8º, 12º e 14º da Convenção Europeia dos Direitos Humanos (CEDH), referentes aos direitos de respeito pela vida privada e familiar, ao casamento e à não discriminação. Ora, o tribunal entendeu que a decisão de não legalizar o casamento entre pessoas do mesmo sexo – que vigorava em França em 2007 – é uma decisão estadual que anula a potencial violação destes direitos.
Tal como concluído pela “EFE Verifica“, a alegação partilhada nas redes sociais de que a sentença se baseia em “questões filosóficas e considerações antropológicas baseadas na ordem natural” não tem qualquer fundamento, uma vez que não existe qualquer referência deste tipo no acórdão.
Em suma, é falso que o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos tenha decidido que “não há direito ao casamento entre pessoas do mesmo sexo” ou tenha anulado um matrimónio específico. Na verdade, determinou que são os Estados que decidem se devem introduzir estas uniões matrimoniais na sua legislação.