Depois de no debate a dois frente a António Costa ter sido confrontado com algumas medidas do programa eleitoral do PSD relativas à saúde, o debate a nove de ontem foi uma nova oportunidade para Rui Rio esclarecer aquilo que os sociais-democratas realmente pretendem para o Serviço Nacional de Saúde (SNS), com destaque para várias reversões do que tem sido implementado nos últimos anos pelo Governo do PS.
“António Costa inventou agora a narrativa de que nós queremos os portugueses a pagar. Sim, pagam, através dos seus impostos, mas mais nada do que isso. Outra coisa é: ‘Querem privatizar o SNS.’ Não. Público, universal e gratuito. Coisa diferente é nós termos a performance que temos no SNS em que António Costa prometeu os médicos de família e não há. Piorou ainda. As listas de espera para cirurgias aumentam, as listas de espera para consultas de especialidade aumentam, a taxa de mortalidade não-Covid-19 bateu os recordes dos últimos cinco anos”, acusou Rio.
Mas será que, quanto às listas de espera, o líder do PSD acertou nos indicadores?
Se tivermos em conta a média do tempo de espera para operações e o número de utentes inscritos nas Listas de Espera Cirúrgica (LIC) em 2019 (último ano com dados disponíveis), não.
“Da análise efetuada aos indicadores do SIGIC, associados à procura de cuidados por parte dos utentes do SNS em 2019, constata-se que o número de propostas cirúrgicas (entradas) apresentou um acréscimo de 2,6%, face ao ano anterior, o correspondente a mais 18.131 utentes que tiveram acesso à Lista de Inscritos para Cirurgia”, informa-se no mais recente relatório anual sobre o acesso a cuidados de saúde nos estabelecimentos do SNS e entidades convencionadas.
Apesar disso, “o aumento da atividade cirúrgica programada que se registou no SNS em 2019 continuou a ser inferior ao aumento do acesso dos utentes à inscrição na LIC (entradas), pelo que no final do ano referido estavam 242.949 utentes em LIC (-0,6%, face a 2018)”.
“O crescimento do indicador que corresponde às novas inscrições em lista cirúrgica (entradas), evidencia, de forma objetiva, não só uma maior disponibilidade dos hospitais do SNS para acolher mais utentes com necessidades cirúrgicas, como também o reforço da transparência do processo de gestão da LIC ao nível nacional, o qual é efetuado através de uma plataforma nacional sujeita a escrutínio público e que garante coerência dos processos de gestão de inscritos para cirurgia em qualquer instituição hospitalar do SNS (ou com acordo ou convenção para esta área)”, destaca-se no relatório.
Ainda no que toca à média do tempo de espera para cirurgias, o relatório demonstra que o valor de 2019 se manteve “em linha com o período homólogo, ou seja, nos 3,3 meses“, não tendo por isso aumentado.
Assim, desde 2015, ano em que foram operados 560.401 portugueses, este indicador tem vindo a subir e, em 2019, foram operados 628.282 utentes, mais 33.304 do que em 2018. Ou seja, registou-se uma subida de 5,6%. “Este valor é o mais elevado de sempre desde que existe o SIGIC, tendo sido operados mais 67.881 doentes do que em 2015 (+12,1%) e mais 144.217 do que em 2010 (+29,8%)”, salienta-se.
No mesmo documento realça-se ainda que, no final de 2019, “existiam 27.279 utentes em espera para cirurgia com mais de um ano (+27% do que em 2018)”, mas que “cerca de 20% dos hospitais terminaram o ano sem doentes à espera para cirurgia com mais de um ano, 45% mantinham esta realidade circunscrita a especialidades específicas e o restantes continuavam a perseguir o objetivo traçado, registando ainda assim melhorias em diversas especialidades”.
No que respeita às consultas, “em 2019, o número total de consultas externas hospitalares atingiu os 12.420 milhões, um aumento de 1,9% face ao período homólogo. De salientar que este é o valor mais elevado da última década, resultando num acréscimo de 14,2% face a 2010, fruto das constantes melhorias registadas”. Foi registado ainda “um crescimento no número de primeiras consultas hospitalares, que aumentaram 15,7% desde 2010 e 2,2% quando comparado com o ano de 2018″.
Este acesso às primeiras consultas hospitalares, no âmbito do programa Consulta a Tempo e Horas (CTH), “continuou a apresentar melhorias, com um total de 1.832.621 novos pedidos de primeira consulta, um crescimento de 3,2% face a 2018″.
Por sua vez, a mediana do tempo de espera até à realização da primeira consulta registou um ligeiro aumento para os 83,6 dias em 2019. Por sua vez, “o tempo médio de triagem dos pedidos de primeira consulta a nível nacional em 2019 foi de 13,7 dias, um ligeiro acréscimo em relação a 2018″.
“A evolução destes dois indicadores pode estar relacionada com o aumento do número de pedidos inscritos no CTH (+ 57.003) em 2019″, sublinha-se.
Em suma, as declarações em causa de Rio carecem de contexto e podem ser enganadoras, já que não têm em conta outros indicadores importantes, como o aumento do número de doentes inscritos para cirurgias e consultas, que influencia naturalmente as listas de espera. Mais, o tempo de espera no caso das cirurgias manteve-se igual ao período homólogo, tendo aumentado apenas no que respeita às consultas.
Importa também ressalvar que ainda não há dados disponíveis para os anos mais recentes de 2020 e 2021.
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Avaliação do Polígrafo: