“Depois de mais de dois anos sem lançar qualquer concessão de renda acessível, Carlos Moedas apresentou uma proposta onde muda a forma de cálculo das rendas. Assim, deixará de ser 30% do rendimento líquido para passar a depender do valor de mercado em cada freguesia”, destaca-se num tweet de 16 de janeiro na página da vereação do PS na Câmara Municipal de Lisboa (CML),
De seguida é apresentado “o resultado” dessa mudança através de dois gráficos, referentes às freguesias de Benfica e Parque das Nações, com dados sobre o “valor médio das rendas acessíveis definidas pelo PS” em comparação com o “novo modelo de renda acessível apresentado por Moedas”.
No caso do valor médio definido pelo PS, os preços variam entre 312 e 395 euros em ambas as freguesias. Já no que respeita ao novo modelo apresentado pelo autarca do PSD, esse valor passa a fixar-se entre 790 a 1.170 euros na freguesia de Benfica e 900 a 1.375 euros na freguesia do Parque das Nações.
A proposta para o modelo de parceria com privados das operações de habitação acessível gerou discórdia entre Carlos Moedas e a oposição na CML. Esta visava uma mudança na forma como seriam fixadas as rendas dos apartamentos, que deixariam de ter como limite máximo uma taxa de esforço de 30% sobre o rendimento das famílias e passariam a ser definidas por um corte de 20% não sobre o rendimento, mas sobre o valor mediano de mercado em cada freguesia, segundo informou o jornal “Público“.
Moedas acabou por recuar, retirando a proposta minutos antes de se iniciar a sua discussão. Não foi apresentada justificação para o passo atrás nem anunciada outra data para levar o novo modelo a votos, como reportou o “Diário de Notícias“.
Também no X/Twitter, Inês Drummond, vereadora do PS na CML, comentou que este “deixou de ser ‘programa renda acessível’ para passar a ser ‘programa construção acessível’ a privados”, em que a “CML oferece terreno para construção (benefícios fiscais, IVA 6%) e garante exploração [de] rendas 20% abaixo do valor do mercado ultra especulado, que as pessoas não conseguem pagar“.
Contactada pelo Polígrafo, Drummond explicou que “hoje a renda acessível em Lisboa é calculada sobre 30% do rendimento líquido da pessoa”. Logo, para se candidatar a um apartamento T1, “uma pessoa que receba 1.000 euros líquidos só deve pagar 300 euros de renda, já se ganhar 2.000 euros líquidos deve pagar 600 euros de renda”. Com a nova proposta de Moedas, a renda passaria a ter um valor fixo determinado pelo valor do mercado, ou seja, “20% abaixo do valor da mediana por freguesia do mercado”.
Na perspetiva da vereadora do PS, “a pessoa, para pagar aquela renda, não pode ter uma taxa de esforço superior a 35%, portanto para conseguir cumprir a taxa de esforço de 900 euros, no caso de um T1 no Parque das Nações, tem que ter um rendimento de 2.220 euros, isto se receber 14 meses, porque uma pessoa que recebe 12 meses, então tinha que receber 2.771 euros.”
Estas contas do PS baseiam-se nos rendimentos das pessoas que se candidataram aos apartamentos de renda acessível. De acordo com Drummond, “em 2021, o salário médio das pessoas que se candidataram à renda acessível foi de 1.154 euros” e “o valor médio que as famílias pagavam num T0 era de 294 euros, T1 era de 312 euros, T2 era de 348 euros, T3 era de 395 euros e no T4 era de 413 euros.” A vereadora sublinha que esta era a média de 2021, não havendo ainda dados de 2022, mas salvaguarda que havia pessoas que “pagavam mais, outras pagavam menos”.
Por sua vez, em resposta ao Polígrafo, o gabinete de comunicação da CML esclareceu que a proposta em causa “aceita outros limites de renda (os definidos pelo Governo em 2019, Decreto-lei 68/2019, artigo 10º + Portaria 176/2019), sem abdicar da primeira condição, a de que cada família paga 30% do seu rendimento”.
E como executar este novo modelo? Segundo o gabinete, “todas as casas a construir pelos promotores privados são acessíveis, tendo como teto máximo as rendas acessíveis” definidas no regulamento municipal que se fixam entre os 400 euros (T0) e os 800 euros (T3). Para os privados, o “único critério concorrencial para a adjudicação é o desconto proposto pelo promotor em relação aos limites máximos de renda”. Ou seja, “constrói aquele que conseguir oferecer as rendas mais baixas”.
E os “contratos de arrendamento que vierem a ser celebrados são coordenados com o programa de apoio à renda do Município (SMAA)”, de modo a garantir que os arrendatários que necessitem “pagam, no máximo, 30% do seu rendimento em renda”. Refere-se ainda que “as rendas definidas para este programa de parcerias de habitação acessível exclui os jovens, polícias e professores”. Mais, assegurou que “o modelo é coordenado com o já existente apoio universal à renda que a Câmara tem vindo a praticar”.
Quanto aos valores apresentados pelo PS, o gabinete de comunicação da CML refutou-os justificando que o “programa de renda acessível concessões (PRA Concessões) nunca chegou a ser concretizado”. Garantiu também que o valor das rendas atribuído ao modelo de Moedas é “totalmente assente na legislação de habitação acessível aprovada pelo Governo PS em 2019“. Ou seja, o que está estabelecido no Decreto-lei 68/2019 e Portaria 176/2019.
_____________________________
Avaliação do Polígrafo: