O primeiro jornal português
de Fact-Checking

Quem recebe pensões de “cerca de mil euros” perde “todos os anos” poder de compra?

Sociedade
O que está em causa?
Durante o programa "Linhas Vermelhas", a eurodeputada do Bloco de Esquerda disse que, segundo a lei, "as pensões [de cerca de mil euros] são atualizadas à inflação menos meio ponto percentual". Verifica-se?
© Agência Lusa / Hugo Delgado

Esta segunda-feira, 18 de Novembro, no programa “Linhas Vermelhas”, transmitido na SIC Notícias, com o tema do aumento das pensões em cima da mesa, a eurodeputada do Bloco de Esquerda, Catarina Martins, afirmou que pensionistas que recebem “cerca de mil euros” perdem “todos os anos poder de compra” devido à forma como a lei está escrita.

“A lei como está escrita – e a lei foi melhorando ao longo dos últimos anos, mas continua uma lei muito reduzida – faz com que quem tenha pensões de cerca de mil euros, acima de pouco mais de mil euros, perca todos os anos poder de compra. Porque as pensões são atualizadas à inflação menos meio ponto percentual”, afirmou a eurodeputada durante o programa. Será verdade?

Catarina Martins, referindo-se às “pensões de cerca de mil euros, acima de pouco mais de mil euros”, está a falar das pensões que se enquadram no segundo escalão de pensões, “de valor compreendido entre duas vezes e seis vezes o valor do IAS [Indexante dos Apoios Sociais]” – atualmente fixado em 509,26€ –, de acordo com a lei nº53-B/2006.

A lei prevê que as pensões neste intervalo são atualizadas, a partir do 1 de Janeiro de cada ano, de acordo com três cenários distintos.

  • Se o PIB tiver um crescimento real médio igual ou superior a 3%, a atualização corresponde ao Índice de Preços no Consumidor (IPC) [valor que se utiliza para calcular a inflação] + 12,5% da taxa de crescimento real do PIB;
  • Se o PIB tiver um crescimento real médio entre igual ou maior a 2% e inferior a 3%, a atualização corresponde ao IPC;
  • Se o PIB tiver um crescimento real médio inferior a 2%, a atualização corresponde ao IPC – 0,5 p.p.

Na lei, esclarece-se que, para o cálculo, o “crescimento real do produto interno bruto (PIB), correspondente à média da taxa do crescimento médio anual dos últimos dois anos, terminados no 3.º trimestre do ano anterior àquele a que se reporta a atualização ou no trimestre imediatamente anterior, se aquele não estiver disponível à data de 10 de Dezembro”. O valor do IPC corresponde à “variação média dos últimos 12 meses”.

De acordo com o Livro Verde para a Sustentabilidade do Sistema Previdencial da Segurança Social, “entre 2008 e 2023, o crescimento médio do PIB considerado para efeitos da aplicação do mecanismo só por uma vez excedeu os 3% (em 2023), e só por três vezes excedeu os 2% (entre 2018 e 2020)”. Disto, indica o relatório, “resultou uma penalização contínua das pensões cujo valor está situado acima do dobro do IAS”.

“As pensões incluídas nos 2.º e 3.º escalões sofreram fortes perdas do respetivo poder de compra, tendência essa que se tem vindo a agravar”, começa por explicar o documento. Refere ainda que “a acumulação de perdas [no poder de compra] ao longo do período 2008-2022 atinge (…) 10.581,00€ para um pensionista com um valor inicial de pensão de 1000,00€”.

Ao Polígrafo, o fiscalista Luís Leon explicou que se se perder poder de compra num determinado ano, nunca mais se recupera, de acordo com a fórmula, esse poder de compra. “O poder de compra perdido é permanente”, garantiu o fiscalista, a não ser que haja algum apoio extraordinário.

Assim sendo, verifica-se que entre 2008 e 2022, os pensionistas que recebem “acima de pouco mais de mil euros”, que se encaixam no escalão dos 2IAS até os 6IAS, perderam poder de compra em quase todos os anos. No entanto, houve anos em quem como o crescimento real médio do PIB foi superior a 2%, os pensionistas não perderam poder de compra em relação ao ano anterior.

Ou seja, a afirmação de Catarina Martins é verdadeira para a maior parte dos anos desde 2008, mas não para todos. Como houve quatro anos em que o crescimento médio do PIB foi de mais de 2%, nesses anos, os pensionistas não perderam poder de compra em relação ao ano anterior.

______________________________

Avaliação do Polígrafo:

Partilhe este artigo
Facebook
Twitter
WhatsApp
LinkedIn

Relacionados

Em destaque