“Ontem a ex-ministra da Justiça explicou no ‘Expresso’ o enorme êxito da consensual estratégia nacional contra a corrupção; hoje anunciam que a nova ministra da Justiça tem dois meses para apresentar a nova e sempre consensual estratégia nacional contra a corrupção”, escreveu Nuno Garoupa, professor de Direito na Universidade George Mason nos EUA (e ex-presidente da FFMS), em publicação de 3 de abril no X/Twitter.
Referia-se, no primeiro caso, a um artigo de opinião que Francisca Van Dunem, ministra da Justiça entre 2015 e 2022, publicou no jornal “Expresso” a 2 de abril (pode consultar aqui). Sob o título “António Costa: uma estranha ironia”, a ex-ministra garante que “no Portugal democrático” não houve “outro decisor político que tenha ido tanto para além das palavras no combate à corrupção“.
Num artigo em que faz uma espécie de balanço das medidas contra a corrupção que foram tomadas durante o período de governação de Costa, com a sua participação na pasta da Justiça, Van Dunem realça a aprovação em 2021 de uma Estratégia Nacional Anticorrupção, da qual fazem parte o Regime Geral de Prevenção da Corrupção e o Mecanismo Nacional Anticorrupção, “a operar essencialmente na vertente preventiva e na recolha e tratamento de informação”.
Salienta também que “foram adotadas medidas legislativas visando favorecer a quebra dos pactos de silêncio entre corruptores e corrompidos, a separação de processos, para evitar os megaprocessos e a facilitação da produção de prova em julgamento”, considerando que “terá sido, porventura, a maior e mais integrada intervenção legislativa orientada para a prevenção e repressão da corrupção, desde 2002″.
Daí a “estranha ironia histórica das circunstâncias” da demissão de Costa – suspeito de alegada prática de crime de prevaricação no âmbito da “Operação Influencer” – que Van Dunem sinaliza na conclusão do texto.
As iniciativas legislativas referidas por Van Dunem resultaram, de facto, de uma concertação ao nível parlamentar entre o PS e o PSD, o que valida o termo “consensual” invocado por Garoupa no tweet em causa. Ou pelo menos foi “consensual” entre os dois maiores partidos. O diploma que ficou conhecido como “pacote anticorrupção”, segundo noticiou a Agência Lusa a 19 de novembro de 2021, “passou inicialmente sem votação no plenário para sede de especialidade, onde foi atualizado com um texto de substituição coordenado por PS e PSD, num trabalho essencialmente desenvolvido pelas deputadas Cláudia Santos (PS) e Mónica Quintela (PSD)”.
Entretanto, ao discursar na cerimónia de tomada de posse do novo Governo da AD, a 2 de abril, no Palácio Nacional da Ajuda, o Primeiro-Ministro Luís Montenegro anunciou: “Irei propor a todos os partidos com assento parlamentar a abertura de um diálogo com vista a fixar uma agenda ambiciosa, eficaz e consensual de combate à corrupção.”
Aliás, Montenegro definiu mesmo um prazo de “dois meses”, tal como referiu Garoupa. “O objetivo é no prazo de dois meses ter uma síntese de propostas, medidas e iniciativas que seja possível acordar e consensualizar, depois de devidamente testada a sua consistência, credibilidade e exequibilidade”, afirmou.
E logo no dia seguinte, após a primeira reunião do Conselho de Ministros no Palacete de São Bento, o ministro da Presidência, António Leitão Amaro, informou que o Governo decidiu mandatar a ministra da Justiça, Rita Júdice, para iniciar um processo de diálogo com todos os partidos com assento parlamentar – além “dos agentes do setor e a sociedade civil” – com o objetivo de aprovar “um pacote de medidas para combater a corrupção“.
______________________________
Avaliação do Polígrafo: