“Será que o Polígrafo já confirmou isto ou é só quando interessa? Estão aí?”, questiona André Ventura num tweet em que partilha um artigo do jornal “Folha Nacional”, do seu partido. O artigo em questão foi publicado no dia 13 de outubro, com a informação de que “Portugal paga casa, alimentação e subsídios a requerentes de asilo“.
No início do artigo explica-se que “a União Europeia recebeu mais de um milhão de pedidos de asilo e em 2022 Portugal tornou-se no país da União Europeia com maior taxa de decisões positivas por cada 100 pedidos”. Acrescenta-se também que, “segundo a Lei do Asilo, estes requerentes mesmo que vejam o seu pedido ser-lhes negado, basta fazerem recurso da decisão” para que o Estado seja “obrigado a assegurar-lhes alojamento, alimentação, apoios sociais para outras despesas como vestuário, transportes”.
Mas será mesmo assim?
A resposta é afirmativa, mas carece de contextualização. É a Lei nº 27/2008 que regulamenta o direito de asilo e de proteção subsidiária em Portugal – seguindo as regras da Diretiva Europeia de Qualificação – e estabelece que “aos requerentes de asilo ou de protecção subsidiária em situação de carência económica e social e aos membros da sua família é concedido apoio social para alojamento e alimentação, nos termos da legislação em vigor”. Sendo que, “na concessão de alojamento devem ser tomadas, com o acordo dos requerentes, as medidas adequadas para manter tanto quanto possível a unidade da família que se encontre presente em território nacional”.
A mesma lei define que “é assegurado o acesso ao mercado de trabalho”. Mais, quando “demonstrado que o requerente e respetivos membros da família dispõem de meios suficientes para permitir a sua subsistência”, cessa-se “o regime de apoio social”.
Este regime está previsto no Artigo 56.º em que se determina que àqueles que “não tenham meios suficientes para permitir a sua subsistência”, são-lhes asseguradas “condições materiais de acolhimento, bem como os cuidados de saúde”. Por meios insuficientes para subsistência, entenda-se a carência de “recursos de qualquer natureza ou de valor inferior ao subsídio de apoio social apurado nos termos da legislação aplicável”.
A partir do momento em que a situação se inverta, e o requerente passe a ter recursos suficientes, “pode ser-lhe exigida uma contribuição, total ou parcial, para a cobertura das despesas decorrentes das condições materiais de acolhimento e dos cuidados de saúde”. No quinto ponto deste artigo estabelece-se ainda que “caso se comprove que um requerente dispunha de meios suficientes para custear as condições materiais de acolhimento e os cuidados de saúde na altura em que estas necessidades básicas foram providas, a entidade competente pode exigir o respectivo reembolso“.
Ou seja, nos termos do direito internacional e do direito comunitário, o acolhimento de requerentes de proteção internacional é da responsabilidade do Estado, onde o pedido de proteção é apresentado, e depois a Lei do Asilo nacional estabelece a distribuição da competência entre diferentes áreas de governação, de acordo com as fases do procedimento de proteção. Assim, no âmbito da 1.ª fase processual a competência pertence ao ministério responsável pela área das migrações (atualmente, o Ministério da Presidência e a AIMA), enquanto que na 2.ª fase, e até decisão final, pertence ao ministério responsável pela área da solidariedade, emprego e segurança social (como está inscrito no artigo 61.º da Lei do Asilo).
Tal como é evidenciado no relatório AIDA/ECRE relativamente às “Necessidades especiais de acolhimento de grupos vulneráveis” em Portugal, elaborado pelo Conselho Português para os Refugiados (CPR), o país oferece condições específicas de acolhimento, incluindo apoio psicológico, habitação adaptada e encaminhamentos para serviços de saúde mental a requerentes com necessidades específicas.
De acordo com informação do Instituto de Segurança Social, os “requerentes de asilo são maioritariamente alojados em alojamentos privados (apartamentos/casas e quartos arrendados), sem prejuízo do alojamento fornecido por familiares em Portugal e da colocação em alojamentos colectivos, como hostels ou centros de acolhimento não dedicados, como por exemplo, abrigos de emergência ou lares de idosos”.
Segundo o relatório, requerentes apoiados pela Santa Casa da Misericórdia de Lisboa são alojados quer em alojamentos privados, quer em hostels e “um número muito limitado de requerentes de asilo é por vezes encaminhado para abrigos para pessoas sem-abrigo geridos pela organização” de forma temporária “para resolver vulnerabilidades específicas”.
Contactado pelo Polígrafo, o CPR explica que todas estas despesas “são da competência do Estado português, que conta com o financiamento do Fundo para o Asilo, a Migração e a Integração (FAMI)”. Ou seja, “a responsabilidade do acolhimento durante a primeira fase do asilo é do Estado português, neste caso da AIMA que tem que assegurar estas despesas”.
Como esclarece a mesma entidade, nos termos da lei, o “Estado (neste caso a AIMA) subcontrata a entidades privadas sem fins lucrativos (por exemplo, o CPR), a prestação de condições materiais de acolhimento a requerentes de proteção em Portugal, através da celebração de protocolos de cooperação/contrato de prestação de serviços”.
“Notamos que, estas entidades, incluindo o CPR, só acolhem requerentes de proteção internacional devidamente encaminhados pelas autoridades competentes (atualmente a AIMA). Estes Protocolos de
Cooperação/Contratos de Prestação de Serviços funcionam em regime de complementaridade com os Fundos Europeus à disposição das entidades sem fins lucrativos que prestam serviços de acolhimento e integração de requerentes de proteção internacional, nomeadamente do FAMI, de modo a garantir uma maior eficiência e eficácia dos recursos financeiros disponíveis”, aponta o CPR.
Refira-se que o Programa do Fundo para o Asilo, a Migração e a Integração (FAMI 2030) disponibilizou a Portugal um total de “74,5 milhões de euros para financiar investimentos na área da gestão dos fluxos migratórios”. Só para a questão do asilo, foram alocados 20 milhões de euros cujo valor é distribuído “por objetivos específicos e assistência técnica”.
O financiamento destina-se a “entidades públicas da administração central, regional e local; entidades privadas sem fins lucrativos ou equiparadas; organizações internacionais; associações de refugiados ou de migrantes; associações de empresários ou de trabalhadores e entidades do ensino superior e centros de investigação”.
Há, no entanto, um dado importante a sublinhar: todos os apoios que possam ser atribuídos têm um “carácter transitório“. Segundo esclarece o CPR ao Polígrafo, “só tem direito a apoio na avaliação que é feita pela Segurança Social” quem não tenha meios de subsistência, o que decorre de uma “avaliação e monitorização regular que é efetuada pela AIMA durante a primeira fase do procedimento e pelo Instituto da Segurança Social durante a segunda fase do procedimento e até existir uma decisão final do pedido”.
Assim, um requerente de asilo “pode chegar a Portugal e não tem direito a apoio nenhum, porque não precisa”.
“O apoio não é dado a todos os requerentes automaticamente. Ou seja, é feita uma avaliação regular das necessidades da pessoa enquanto decorre o procedimento de asilo”, ressalva o CPR.
Acresce que “é sempre feito um seguimento de cada caso individual, no sentido de determinar se as pessoas precisam ou não de apoio” e se ainda precisam de alojamento e alimentação ou se passam a precisar “só de apoio para a alimentação”.
A título de exemplo, “um agregado familiar composto por dois adultos e três menores, receberá, no início, um apoio mais elevado enquanto os pais se encontram desempregados”. Porém, os “apoios vão sendo regularmente revistos e os valores diminuídos à medida que aumente o grau de autonomia financeira da família, até que os dois adultos já estejam integrados no mercado de trabalho e já não necessitem de qualquer apoio”.
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Avaliação do Polígrafo: