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Passos Coelho, agora na luta contra a “destruição da família tradicional”, defendia em 2010 a adoção por casais homossexuais?

Política
Este artigo tem mais de um ano
O que está em causa?
Terá sido apenas por falta de oportunidade que o ex-Primeiro-Ministro não colaborou com nenhum texto para o livro que ontem apresentou - “Identidade e Família” -, com direito à presença de algumas das mais conhecidas caras da direita conservadora em Portugal. André Ventura e Diogo Pacheco de Amorim, do Chega, também estavam na plateia enquanto Pedro Passos Coelho falava no fim da família tradicional. Mas será que, em 2010, o candidato à liderança do PSD afirmava que "a homossexualidade ou a heterossexualidade não têm de ser o critério para a adopção"?
© Manuel de Almeida/Lusa

O discurso de Pedro Passos Coelho foi contido: enquanto apresentava, ontem à tarde, um livro que, entre outras coisas, considera “destruidora” a adoção por casais do mesmo sexo, o ex-Primeiro-Ministro (PM) não fez uma única referência ao tema. Sobre o conceito de família, limitou-se a intitular-se como “pai solteiro”, um “ideal” que não era o seu: “Eu posso conceber que haja alguém que tenha como ideal de família esse, mas não creio que seja a grande maioria das pessoas. E se fosse, digamos assim, nós teríamos uma sociedade muito diferente nos valores, na forma como nos comportamos solidariamente com os outros, muito diferente daquela que conhecemos.”

Na parte inicial da apresentação, Passos Coelho, mais tarde questionado sobre uma aproximação ao Chega, até se justificou: “Trata-se de uma matéria que eu acho que é fundamental na discussão do espaço público em Portugal. E a discussão em torno das questões da família, da identidade e da íntima conexão que existe entre estes dois conceitos, que é a família e a identidade, a identidade individual, a identidade coletiva, a identidade que nos define como portugueses, como cada cidadão, como pessoas, merece uma discussão séria.”

“Apesar de a família hoje ter formas bastante diversificadas, eu julgo que não ofendo ninguém se disser que a grande maioria das pessoas tem um ideal de família muito mais próximo do que aquilo que parece”, afirmou o ex-líder do PSD. A expressão “aquilo que parece” assenta na biparentalidade, mas não apenas. Assenta também na visão de família como um seio onde estão um pai e uma mãe. Se Passos não o disse explicitamente, os autores do livro que ali apresentava já o tinham expressado de forma bastante clara.

Escreve Paulo Otero, professor catedrático de direito na Universidade de Lisboa, no capítulo chamado “As tripla (sic) dimensão da identidade e família: parâmetros éticos e jurídicos de vinculação”:

“Compreende-se que existam movimentos de cariz político apostados na destruição do papel ‘natural e fundamental da sociedade’ da família e na tentativa de edificação de um novo paradigma de família, por via da educação nas escolas ou da imposição geral de condutas: i) a ideologia de género, negando a verdade biológica da identidade do homem e da mulher; ii) a adulteração do conceito de casamento, fazendo nele incluir uniões de pessoas do mesmo sexo; iii) a destruição da biparentalidade como base do vínculo da filiação, através da adoção ou da procriação medicamente assistida por parte de pessoas solteiras ou casais do mesmo sexo.”

Passos Coelho não poderá discordar. Em dezembro de 2015, o líder dos sociais-democratas votou contra a proposta conjunta do PS, BE, PEV e PAN. No PSD, só 17 deputados votaram a favor. Apenas cinco anos antes, porém, era o ex-JSD que, numa entrevista ao jornal “I”, defendia que “a homossexualidade ou a heterossexualidade” não tinham “de ser o critério para a adopção”.

“Quando avaliamos as condições em que determinada pessoa deve poder adoptar, o critério não é saber qual é a sua orientação sexual“, afirmava Passos Coelho. Em substituição, condições como a “estabilidade emocional”, a “maturidade” ou a “autonomia financeira” dos futuros pais deviam ser tidas em conta.

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Avaliação do Polígrafo:

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