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Partículas em suspensão na atmosfera, como as poeiras de África, são cancerígenas?

Sociedade
Este artigo tem mais de um ano
O que está em causa?
Nas redes sociais está a ser difundida a ideia de que as "partículas em suspensão", como as poeiras provenientes de África que deixaram os céus mais alaranjados este fim-de-semana, podem ser "cancerígenas". Será que se confirma?

“As partículas em suspensão na atmosfera são cancerígenas“, destaca-se numa publicação partilhada no Facebook no último sábado, dia 23 de março, na sequência das notícias que davam conta de que a atmosfera ficaria poluída nesse fim-de-semana devido a poeiras vindas de África.

O post partilha uma notícia, aparentemente o jornal “Público”, em que se lê que “as partículas em suspensão podem ligar-se a outros poluentes atmosféricos, como hidrocarbonetos e metais pesados”.

A notícia em causa é verdadeira, mas não diz respeito às poeiras deste fim-de-semana uma vez que não é atual. Foi publicada no dia 8 de agosto de 2023 e informava que a “nuvem de poeiras do Norte de África” à data afetava “a qualidade do ar em Portugal”.

A informação relativa às partículas em suspensão se poderem ligar a outros poluentes atmosféricos provém do site da Agência Portuguesa do Ambiente (APA) que detalha que “a dimensão das partículas em suspensão pode variar significativamente e, quanto menor for essa dimensão, maior a probabilidade de penetrar no aparelho respiratório e maiores os efeitos negativos que podem causar“.

Mas será que se pode afirmar que estas “partículas em suspensão” são cancerígenas?

O site da APA explica que “as partículas mais nocivas para a saúde humana são as que possuem um diâmetro aerodinâmico inferior a 10 µm (micrómetros), denominadas PM10, pois podem entrar no sistema respiratório”, sendo que, dentro dessas, existem partículas mais finas, “com diâmetro aerodinâmico inferior a 2,5 µm, denominadas PM2,5, ou partículas ainda menores” que podem penetrar no “sistema respiratório até ao nível alveolar interferindo no processo respiratório e acarretando risco grave para a saúde“.

Detalha-se ainda que “a exposição crónica a este poluente aumenta o risco de desenvolvimento de doenças respiratórias e cardiovasculares e cancro de pulmão, contribuindo para agravar sintomas de outras doenças”.

Cristina Bárbara, diretora do Serviço de Pneumologia do Hospital de Santa Maria, explica ao Polígrafo que as partículas em suspensão “são poeiras que viajam grandes distâncias”, podendo vir do norte de África ou do deserto do Sara, como tem acontecido nos últimos anos. Dentro dessas partículas, existem as “de tamanho maior e de tamanho menor”, sendo as menores “mais lesivas para a saúde humana”.

“As maiores causam danos sobretudo à pele e aos olhos, mas as que têm capacidade de entrar nos pulmões e até mesmo atravessar os pulmões ou entrar na circulação sanguínea são piores por causarem danos sobretudo de natureza respiratória e cardiovascular”, explica a especialista.

Ainda que existam riscos, Cristina Bárbara explica que “não há nenhuma evidência científica” de que as poeiras como as deste fim-de-semana possam provocar cancro “porque esta exposição é uma exposição aguda“.

É verdade que a poluição atmosférica tem sido relacionada a doenças cardíacas ou pulmonares, incluindo cancro, tal como aponta a Agência Europeia do Ambiente, mas isso acontece quando se trata de “uma exposição prolongada durante bastante tempo e crónica”, conclui Cristina Bárbara.

Episódios como os deste fim-de-semana “são ocasionais”, mesmo que estejam “a ocorrer com mais frequência, são episódios agudos que duram um determinado período de tempo”, sublinha a diretora do Serviço de Pneumologia.

Portanto, os efeitos afetam “sobretudo populações mais vulneráveis” como “crianças, adultos, idosos ou pessoas com doenças respiratórias ou cardíacas”. Nesta população, as poeiras podem desencadear o “agravamento de doenças crónicas, como por exemplo asma, doença pulmonar obstrutiva crónica ou doença cardiovascular”, levando consequentemente a “maior afluência às urgências e até maior número de internamentos”.

Por esse motivo, Cristina Bárbara aconselha a população mais vulnerável a “não sair tanto à rua e não fazer exercício físico intenso” quando ocorrem estes episódios de poeiras. Caso se tenha de sair, é recomendada a utilização de “máscaras que impedirão essas partículas mais pequenas de entrar”.

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Avaliação do Polígrafo:

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