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O novo coronavírus “acomoda-se mais rápido em garganta seca”?

Coronavírus
Este artigo tem mais de um ano
O que está em causa?
É uma publicação viral nas redes sociais, na forma de lista de recomendações sobre a pandemia do novo coronavírus, atribuídas a uma enfermeira não identificada "que está no combate" à Covid-19. Entre as sugestões destaca-se uma que alega que se deve beber muitos líquidos, uma vez que "o vírus se acomoda mais rápido em garganta seca". Mas será verdade?

“Conselho de uma enfermeira que está no combate: tenho visto muitas recomendações sobre medidas a tomar para a prevenção do vírus. Lavar bem as mãos, práticas de higiene pessoal e distância social. Mas não tenho visto recomendações sobre o que fazer se por acaso for infectado pelo vírus. Como enfermeira, deixo algumas sugestões”, começa por ler-se na publicação.

Segue-se uma lista com várias recomendações mais concretas, como “comprar qualquer xarope de tosse disponível nas farmácias, limão e mel funciona da mesma maneira”. A enfermeira citada na publicação deixa outras dicas:  “Se tiver um humidificador, use no seu quarto quando for dormir, se não tiver pode ligar o chuveiro na água quente e ficar na casa de banho fechado inalando o vapor da água”; “Se tiver febre acima dos 38°C, é melhor tomar paracetamol em relação ao ibuprofeno”; “Hidrate, porque o vírus acomoda-se mais rápido em garganta seca“; “Não deve sair de casa mesmo se começar a se sentir melhor, porque estará infectado durante 14 dias.”

Confirma-se? Verificação de factos. 

Em declarações ao Polígrafo, Celso Cunha, virologista, defende que o xarope para a tosse não é eficaz “nem para a tosse quanto mais para a Covid-19”, e que o limão, mel e a pomada Vick Vaporub também não são úteis no combate à infeção. Quanto aos humidificadores, o especialista sublinha que só servem “para ajudar a dispersar o vírus e transmitir a infeção a outras pessoas”.

E o novo coronavírus acomoda-se mesmo mais rapidamente na garganta seca? “Não há nenhum estudo nem nenhuma evidência que indique isso”, disse, sublinhando que “beber líquidos faz bem para manter o corpo hidratado caso haja febre ou transtornos gastrointestinais, por exemplo”.

Em declarações ao Polígrafo, Celso Cunha, virologista, defende que o xarope para a tosse não é eficaz “nem para a tosse quanto mais para a Covid-19”, e que o limão, mel e a pomada Vick Vaporub também não são úteis no combate à infeção. Quanto aos humidificadores, o especialista sublinha que só servem “para ajudar a dispersar o vírus e transmitir a infeção a outras pessoas”.

Sobre o suposto tempo de duração da doença, Celso Cunha alerta para o facto de este ser um critério que varia consoante o paciente. “Se estivermos comprovadamente infetados, com teste positivo, manda a prudência, o respeito pela saúde dos outros e as recomendações das autoridades sanitárias, que nos mantenhamos confinados pelo menos durante 14 dias e já sem sintomas. Pode ser necessário mais tempo porque o critério para ter alta continua a ser ter dois testes negativos consecutivos. Por vezes há quem considere que um é suficiente”, sublinha.

As dúvidas relativas ao uso do ibuprofeno, tal como o Polígrafo já verificou (pode ler aqui), surgiram na sequência de um estudo publicado no dia 11 de março na revista científica The Lancet. No artigo, os investigadores afirmam que o ibuprofeno aumenta a quantidade no organismo da enzima ACE2, que são recetores utilizados pelo novo coronavírus para entrar nas células humanas. Quanto mais ACE2 no organismo, argumentam, mais as probabilidades de contrair a doença crescem. Os dados do artigo, explicam os investigadores, ainda são sujeitos a confirmação.

Júlio Cerqueira, médico especialista em Medicina Geral e Familiar e criador do projeto Scimed, recorda que se gerou “algum pânico na altura, com instituições internacionais, incluindo a Organização Mundial da Saúde, a desaconselhar a toma de ibuprofeno perante sintomas que possam indiciar infeção por Covid-19″

Júlio Cerqueira, médico especialista em Medicina Geral e Familiar e criador do projeto Scimed, recorda que se gerou “algum pânico na altura, com instituições internacionais, incluindo a Organização Mundial da Saúde, a desaconselhar a toma de ibuprofeno perante sintomas que possam indiciar infeção por Covid-19″. “No entanto, essa posição foi imediatamente retirada após perceberem que não havia qualquer evidência científica sólida que comprovasse que o risco era real”, alerta.

“A ausência de risco tem vindo a ser confirmada por estudos científicos mais recentes”, sublinha o especialista, embora recorde que, apesar destes estudos proporcionarem alguma segurança, “são estudos observacionais”. “Só com estudos experimentais teremos a certeza que o ibuprofeno é totalmente seguro em comparação com as alternativas. Dito isto, as pessoas deveriam optar primeiro pelo paracetamol e, em segunda linha de tratamento, pelos anti-inflamatórios não esteróides como o caso do ibuprofeno como habitualmente é recomendado na presença de qualquer tipo de dor ou febre”, conclui.

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Nota editorial: este conteúdo foi selecionado pelo Polígrafo no âmbito de uma parceria de fact-checking (verificação de factos) com o Facebook, destinada a avaliar a veracidade das informações que circulam nessa rede social.

Na escala de avaliação do Facebookeste conteúdo é:

Falso: as principais alegações dos conteúdos são factualmente imprecisas; geralmente, esta opção corresponde às classificações “Falso” ou “Maioritariamente Falso” nos sites de verificadores de factos.

Na escala de avaliação do Polígrafoeste conteúdo é:

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