Quando escreveu a canção “He´s Gonna Step on You Again”, no início dos anos 70, em parceria com Christos Demetriou, o sul-africano John Kongos estava longe de imaginar que o tema se iria tornar num dos hits maiores da cena musical britânica de Manchester, no final dos anos 80/início dos anos 90 do século passado.
Inicialmente escrita como canção de protesto contra a apropriação do território nativo pela comunidade branca, na África do Sul, surgiria quase 20 anos depois, com título abreviado – apenas “Step On” – no alinhamento do disco “Pills ’n’ Thrills and Bellyaches”, de novembro de 1990. Foi o terceiro longa duração dos Happy Mondays, editado pela lendária Factory Records de Tony Wilson, que descobriu, entre outros, os Joy Division, New Order, Durutti Column, Orchestral Manoeuvres in the Dark e os James. A etiqueta também ficou conotada com aquele que terá sido um dos maiores falhanços de sempre da indústria discográfica: não ter assinado contrato com os The Smiths. O alegado falhanço está retratado no filme “24 Four Hour Party People” (2002), de Michael Winterbottom. Mas terá sido mesmo assim? Johnny Marr, guitarrista dos Smiths, disse ao The Guardian, em 2014, que a banda só teria assinado pela Factory “por cima do meu cadáver.” E explicou: “Se estavas no mundo da música em Manchester naquela época era quase lei ter que ir de mão estendida e de joelhos pedir ao Tony Wilson a sua benção papal para nos meter num estúdio. E eu não estava disposto a fazê-lo.”
“Step On” afirmou-se, assim, como um dos hinos da cena Madchester, movimento musical e cultural nascido em Manchester que funde um conjunto de estilos sonoros e tendências, como o rock alternativo, o psicadelismo, a música de dança eletrónica. Era o caldeirão perfeito para o nascimento da cena rave, a afirmação do acid House (um sub-género da House music), a consolidação do DJ como autor musical e a criação dos grandes clubes noturnos, marcados pelo consumo de drogas – é o reinado do ecstasy e da The Haçienda, espaço privilegiado desta tendência que funcionou entre 1982 e 1997, ano em que acabaria por fechar as portas devido a problemas de segurança e financeiros. Peter Hook, baixista dos New Order – a banda era uma das proprietárias (em parceria com a Factory Records) e a principal fonte de financiamento do espaço – confessou que os prejuízos foram superiores a 18 milhões de libras, nos últimos anos de funcionamento da Haçienda.
Regressando aos Mondays e a “Pills ’n’ Thrills and Bellyaches”, este foi o disco de maior êxito da banda de Shaun Ryder, com mais de 350 mil cópias vendidas. E “Step On” um dos singles de maior projeção, chegando a número 5 no Reino Unido, tal como “Kinky Afro”, outro dos 3 singles daquele álbum. O terceiro foi “Loose Fit”, mas ficou-se pela 17ª posição do top britânico.
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