Luís Montenegro não leva muitos dias como novo presidente do PSD, sucessor de Rui Rio, mas já estabeleceu linhas de demarcação relativamente à extrema-direita: "Nunca nos associaremos a qualquer política xenófoba ou racista." As palavras foram proferidas no discurso de encerramento do 40.º Congresso do PSD, a 3 de julho, e o partido Chega não foi referido uma única vez. Mas não foi necessário:

"Comigo e com o PSD, antes quebrar que torcer. Jamais abdicarei dos princípios da social-democracia e da essência do nosso programa eleitoral para governar a qualquer custo. Acreditem, se algum dia for confrontado com a violação dos nossos princípios e valores para formar ou suportar um Governo, o partido pode decidir o que quiser, mas não serei eu o líder de um Governo desses."

As reações às palavras de Montenegro não tardaram e, no Facebook, a deputada socialista Isabel Moreira diz esperar que "os marcos terríveis de Montenegro em matéria de homofobia e a ausência total de gestos em matéria de combate ao racismo e outras desigualdades sejam sinal de nada". O apelo é que dali surja "um homem novo" que seja capaz de o dizer.

"Eu ainda me lembro de ver Montenegro ao lado de Isilda Pegado em 2004 - aquando da revisão constitucional que consagrou a proibição de discriminação com base na orientação sexual - a assinar esta declaração de voto que associava homossexualidade e abuso sexual de menores", recordou. A ideia foi repetida na página da deputada no Twitter, de forma mais sintética:

"Quando Montenegro assinou com Isilda Pegado e outros esta declaração de voto à revisão constitucional de 2004 que introduziu a proibição de discriminação com base na orientação sexual. Nada como associar a homossexualidade ao abuso sexual de menores. Temos memória."

O ano era 2004, corria a IX Legislatura e Durão Barroso era ainda primeiro-ministro. Na reunião plenária de 22 de abril, alguns deputados do PSD apresentavam uma declaração de voto relativamente às alterações aprovadas à Constituição da República Portuguesa. Ora, a 6.ª Revisão Constitucional, aprovada em 2004​, traduziu-se, entre outras alterações, num reforço do princípio da não discriminação, principalmente em função da orientação sexual

"No n.º 2 do Artigo 13.º da Constituição é eliminada a expressão 'ou' entre 'económica' e 'condição' e é aditada in fine a expressão 'ou orientação sexual', passando o número a ter a seguinte redacção: '2. Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual.'"

Apesar do progresso no sentido da não discriminação que esta alteração parecia consolidar, alguns deputados do PSD como Isilda Pegado, Paulo Batista Santos e Luís Montenegro, escreveram o seguinte em declaração de voto: "O princípio da igualdade entre homens e mulheres é hoje inquestionável. (...) Veio agora a ser aditado ao referido n.º 2 a 'orientação sexual' como causa específica de não discriminação, inciso constitucional que se afirma, aos deputados signatários, como redundante."

De acordo com este grupo de deputados, destacar a orientação sexual como fonte de discriminação podia mesmo "criar alguma confusão que importa remover". Para os signatários, "ciclicamente surgem correntes de opinião, cuja vertigem última distorce a própria natureza humana, mas que em nada têm contribuído para a prossecução da dignidade, destruindo pontualmente homens, mulheres, valores e, em geral, carregam consigo a degradação ética de gerações".

O facto de se instituir que "ninguém pode ser privado de qualquer direito ou isento de dever em razão da orientação sexual" não faz com que se crie "qualquer proteção ou concessão de direito que por virtude de orientação sexual possa suprir ou oferecer o que a natureza não confere", argumentaram.

Além disso, "estão entre estes institutos jurídicos o casamento e a adopção, cujos superiores interesses e pressupostos de facto não se compaginam com orientações sexuais que perfilhem a homossexualidade como forma de vida". O PSD e o CDS-PP "têm, em 30 anos de história ideológica e política, afirmado convictamente o casamento como expressão de uma relação entre um homem e uma mulher, figuras parentais, que contribuem para o saudável crescimento de filhos".

Por fim, defenderam que "também esta formulação do Artigo 13.º, n.º 2, não pode remover do Código Penal os artigos 172.º e 173.º - relativos ao abuso sexual de menores", inferindo uma conexão entre a prática de abusos e a orientação sexual.

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