- O que está em causa?Presidente da Juventude Socialista (JS) pediu que se "espalhasse a notícia", ontem à noite, pouco depois de António Costa ter anunciado a devolução das propinas aos jovens que permaneçam no mercado de trabalho português. "A propina acabou em Portugal", ampliou Miguel Costa Matos no Twitter. Nem o Primeiro-Ministro (PM) foi tão positivo no seu discurso em Évora: afinal, trata-se de uma afirmação descontextualizada.

O arranque da "Academia Socialista", ontem, em Évora, contou com a presença de dezenas de jovens, que aplaudiam o PM António Costa num discurso que se prolongou por cerca de uma hora. E foi para eles que Costa falou: para os jovens que deverão ver o seu IRS melhorado, o acesso à habitação facilitado e as propinas que pagaram ao Estado para estudar no Ensino Superior devolvidas. Isto, claro, se optarem por trabalhar em Portugal.
É um travão à emigração, garantiu Costa aos futuros contribuintes, e um incentivo à fixação: ser compensado por escolher o mercado de trabalho português. Embora positivo, o discurso do PM não se equipara às declarações que o líder da JS partilhou no Twitter, também na noite de ontem: "Évora, 6 de setembro de 2023. A propina acabou em Portugal. Por cada ano de trabalho, um ano de propina devolvido. Espalhem a notícia."
Os utilizadores da rede social seguiram o conselho: o "tweet" já tem mais de 120 mil visualizações, mas a "notícia" que Miguel Costa Matos queria ver espalhada parece estar, no mínimo, descontextualizada. "Que brincadeira. A propina acabaria se não fosse necessário o seu pagamento, mas como é preciso pagar primeiro, as famílias continuam afogadas"; "Passou a ser um empréstimo ao Estado. Os desempregados também terão direito a devolução?", lê-se na caixa de comentários.
Afinal, como se explica a medida anunciada por Costa?
Desde logo, é falso que a propina tenha acabado em Portugal. O "tweet" do Secretário-Geral da JS carece de contexto e funciona como chamariz para uma informação que não se confirma se ouvirmos falar o PM. Mas há mais: o Partido Socialista esteve sempre, a par com a direita, contra o fim das propinas no Ensino Superior (à exceção de alguns nomes que, ora votavam a favor, ora se abstinham). Os projetos inviabilizados do Bloco de Esquerda e do PCP chegaram a pedir o fim destes custos para todos os ciclos de estudo, mas Costa acabou por rejeitar.
Em 2019, o Orçamento do Estado estipulou, pela primeira vez em 15 anos, uma redução do tecto máximo nas propinas para as licenciaturas: 856 euros. Até 2021, o montante caiu para os 697 euros, com a ajuda do voto do PS em propostas da esquerda. O que Costa anuncia para os próximos anos é distinto: não mexe no valor da anualidade nem tampouco elimina este pagamento das despesas dos alunos portugueses. Em vez disso, opta por beneficiar aqueles que permaneçam em Portugal depois de concluir o ciclo de estudos.
Em suma, o valor pago anualmente será devolvido a cada ano de trabalho em Portugal, mesmo para os alunos que frequentem mestrados (neste caso, o montante ficou fixado nos 1.500 euros). Esta medida não implica o fim da propina: se frequentar uma licenciatura e, logo a seguir, um mestrado, mas no fim desse período receber uma proposta para trabalhar fora do país, a propina que pagou não será devolvida.
A deputada bloquista Joana Mortágua chamou-lhe, no Twitter, "engenharia da aldrabice", considerando que o Governo está a jogar com o tempo: "A resposta do Governo para as famílias que passam dificuldades agora é prometer devolução de propinas daqui a uns anos. Pode ser que entretanto se esqueçam ou emigrem. Pode ser que entretanto desistam da faculdade porque o apoio futuro não paga as propinas hoje."
Miguel Costa Matos tem outra opinião: medida do Governo vai "mais longe do que o reivindicado tantas vezes pelo movimento estudantil porque inclui a devolução das propinas de mestrado também". Quanto à formulação escolhida para "espalhar a notícia", o socialista admite que "foi uma forma simples de dizer que o custo da propina será integralmente devolvido".
"O Estado reembolsará todos os custos que todos os estudantes tiveram com a propina assim que começarem a trabalhar em Portugal e colocar-nos-á ao nível dos países que têm educação superior gratuita, através da sua devolução. A propina, no prazo de três anos depois de começar a trabalhar, é zero", explicou o líder da JS ao Polígrafo.
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Avaliação do Polígrafo:
