- O que está em causa?O primeiro-ministro António Costa pediu hoje a demissão e garantiu que não se recandidata ao cargo. A "bola" está agora do lado do Presidente da República que aceitou a demissão e convocou uma reunião do Conselho de Estado para depois de amanhã. Vai dissolver a Assembleia da República e convocar novas eleições legislativas, ou tentará encontrar uma solução alternativa com base na atual composição parlamentar? No âmbito desta dúvida, o líder do Iniciativa Liberal recordou que, na tomada de posse do Governo, Marcelo Rebelo de Sousa tinha dito que "esta era uma eleição pessoal de Costa e, em caso de saída, era necessário ir a eleições". Em várias publicações nas redes sociais aponta-se no mesmo sentido. O que disse realmente Marcelo a 30 de março de 2022?

"Obviamente, apresentei a minha demissão" e "não, não me vou recandidatar ao cargo de primeiro-ministro", anunciou hoje António Costa, sob a justificação de que foi "surpreendido com a informação da Procuradoria-Geral da República de que já foi ou irá ser instaurado um processo-crime contra mim". Poucos minutos depois, o Presidente da República informou que "aceitou" o pedido de demissão de Costa e, como tal, "decidiu convocar os partidos políticos representados na Assembleia da República para amanhã" e "convocar o Conselho de Estado (...) para se reunir depois de amanhã".
O país fica assim em suspenso até quinta-feira, dia 9 de novembro, para saber qual será a decisão de Marcelo Rebelo de Sousa. Vai dissolver a Assembleia da República e convocar novas eleições legislativas, ou tentará encontrar uma solução alternativa com base na atual composição parlamentar? Para o líder do partido Iniciativa Liberal, Rui Rocha, a segunda hipótese não é plausível. Nesse âmbito recordou - em declarações aos jornalistas, logo após o discurso de Costa - que, na tomada de posse do Governo, Rebelo de Sousa tinha dito que "esta era uma eleição pessoal de Costa e, em caso de saída, era necessário ir a eleições".
Em várias publicações nas redes sociais aponta-se no mesmo sentido. Com destaque para Nuno Melo, líder do CDS-PP, ao sublinhar que "em janeiro, o Presidente da República foi claro: 'Se mudar o primeiro-ministro, há dissolução do Parlamento'. António Costa caiu, sendo que os factos afetam todo o Executivo. Logo, a decisão não poderá ser outra. Portugal precisa de um novo ciclo."

Mas o que disse realmente o Presidente da República na tomada de posse do atual Governo?
A cerimónia de tomada de posse do XXIII Governo Constitucional realizou-se no dia 30 de março (pode consultar aqui a gravação em vídeo). Rebelo de Sousa foi o primeiro a tomar a palavra, no Palácio Nacional da Ajuda, e não deixou de "amarrar" o primeiro-ministro aos quatro anos (e meio) de mandato, através de uma ameaça mais ou menos velada:
"Os portugueses deram a maioria absoluta a um partido, mas também a um homem, V. Exa., um homem que, aliás, fez questão de personalizar o voto, ao falar da escolha entre duas pessoas para a chefia do Governo. Agora que ganhou e ganhou por quatro anos e meio, tenho a certeza que V. Exa. sabe que não será politicamente fácil que esse rosto, essa cara que venceu de forma incontestável e notável as eleições, possa ser substituído por outro a meio do caminho."
E acrescentou: "Já não era fácil no dia 30 de janeiro. Tornou-se ainda mais difícil depois do dia 24 de fevereiro. É o preço das grandes vitórias inevitavelmente pessoais e intencionalmente personalizadas. E é, sobretudo, o respeito da vontade inequivocamente expressa pelos portugueses para uma legislatura."
Não há dúvida de que Rebelo de Sousa deu a entender que uma eventual saída de Costa antes do final da legislatura resultaria na convocação de novas eleições. Mas não foi definitivo ao dizer que "não será politicamente fácil que esse rosto (...) possa ser substituído", ou "tornou-se ainda mais difícil depois do dia 24 de fevereiro", com a conquista de uma maioria absoluta nas eleições legislativas. Algo "difícil" não equivale a "impossível".
Por outro lado, importa ressalvar o contexto: nessa altura era intensa a especulação sobre a putativa vontade de Costa vir a assumir um cargo na União Europeia, para o que teria de cessar as funções de primeiro-ministro antes do final da legislatura. Foi nesse contexto que Rebelo de Sousa proferiu tais declarações, não sendo possível aferir se também teria em mente uma eventual saída de Costa por outros motivos - nomeadamente a instauração de um processo-crime.
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Avaliação do Polígrafo:
