- O que está em causa?Na "Grande Entrevista" à RTP, emitida ontem à noite, o ministro da Saúde destacou que "atualmente, independentemente de todas as contratações que possamos vir a fazer, no SNS [Serviço Nacional de Saúde] há cerca de 1.700 médicos que não são portugueses, não são de origem portuguesa". Esta alegação tem fundamento?

"Atualmente, independentemente de todas as contratações que possamos vir a fazer, no SNS [Serviço Nacional de Saúde] há cerca de 1.700 médicos que não são portugueses, não são de origem portuguesa. O maior grupo é o brasileiro, o segundo [maior] grupo é o espanhol... E até, entre esses 1.700 há pouco mais de meia centena de médicos cubanos que já trabalham no nosso SNS", afirmou o ministro da Saúde, Manuel Pizarro, na "Grande Entrevista" à RTP, emitida ontem à noite.
"Portanto, o que é que nós pretendemos fazer? Nós reconhecemos que vai haver um período de dois ou três anos de grandes dificuldades. E nós quereríamos mitigar as dificuldades do acesso das pessoas a médicos", acrescentou Pizarro, justificando a aposta na "solução transitória" da contratação de mais médicos estrangeiros para o SNS, desde longo oriundos de Cuba.
Confirma-se que "no SNS há cerca de 1.700 médicos estrangeiros" em atividade?
De acordo com os últimos dados estatísticos divulgados pela Ordem dos Médicos (OM), no final de 2022 estavam inscritos 61.235 médicos na OM, dos quais 4.503 tinham nacionalidade estrangeira.
Contudo, entre os 4.503 médicos oriundos de outros países, apenas 1.270 estavam a trabalhar no SNS. Um número muito inferior ao indicado por Pizarro na referida entrevista.

Segundo os dados da OM, no final de 2022 registavam-se 2.473 médicos inscritos com nacionalidade de outros países da União Europeia. O segundo grupo mais representado era o dos médicos oriundos do Brasil, 1.060 no total.
Em abril deste ano, aliás, o "Jornal de Notícias" já tinha avançado com estes números, realçando que "o SNS só atrai um em cada 10 médicos estrangeiros em Portugal".
"Apenas 28,2% dos médicos estrangeiros a exercer em Portugal têm um vínculo contratual com o SNS. Os dados do final de 2022 mostram que, dos 4.503 médicos oriundos de outros países inscritos na Ordem dos Médicos, somente 1.270 estão contratados pelo serviço público. Segundo o bastonário Carlos Cortes, analisando em detalhe as entradas de profissionais em Portugal nos últimos cinco anos, um em cada 10 ficou vinculado ao SNS. O responsável culpa a falta de atratividade do serviço público e pede melhoria das condições de trabalho", informou o "Jornal de Notícias".
"Na verdade, o número de médicos estrangeiros a trabalhar para o SNS tem aumentado de ano para ano. Em 2018, eram 1.192, tendo havido um acréscimo de mais de 6,5% nos últimos cinco anos. Contudo, no mesmo período, o número de estrangeiros inscritos na Ordem dos Médicos aumentou a um ritmo superior às entradas no setor público, com uma taxa de crescimento de quase 11%", ressalvou o mesmo jornal.
Em declarações à RTP na mesma altura, o bastonário da Ordem dos Médicos, Carlos Cortes, salientou que "nos últimos cinco anos, nós tivemos a entrada, a inscrição na Ordem dos Médicos, de 819 médicos [estrangeiros]. E, desses, somente 78 entraram para o SNS. (...) Obviamente que são oportunidades perdidas. É um ambiente que se vive com todos os médicos, estrangeiros e portugueses, que não têm sentido - infelizmente - atração pelo SNS. E desenvolvem a sua atividade através de empresas de contratação de médicos, ou muitos deles trabalham em hospitais e clínicas privadas".
De resto, o número de novos médicos estrangeiros inscritos na OM atingiu um pico de 222 em 2022, mas nos anos anteriores oscilou - a um nível mais baixo - entre 145 (2018), 171 (2019), 173 (2020) e 133 (2021).
Questionado pelo Polígrafo sobre esta matéria, contudo, o Ministério da Saúde explicou a origem do número evocado por Pizarro: corresponde não apenas aos médicos estrangeiros contratados (cerca de 1.200), mas também aos que são prestadores de serviços e aos que trabalham nas PPP - Parcerias Público-Privadas.
Classificamos a alegação de Pizarro como imprecisa, pois inclui médicos a trabalhar em hospitais sob gestão privada (nas PPP), além de prestadores de serviços que não estão vinculados ao SNS.
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Avaliação do Polígrafo:
