Sendo justos, há um elemento na argumentação de Luís Montenegro em que terá razão: no dia 7 de novembro de 2023, quando reagiu à sucessão de acontecimentos em torno da “Operação Influencer” e declarou que era urgente “que se devolva a palavra ao povo“, com eleições antecipadas, o facto é que António Costa já tinha apresentado o seu pedido de demissão do cargo de Primeiro-Ministro.
Por sua vez, Miguel Albuquerque começou por garantir que não se demitia da Presidência do Governo Regional da Madeira e foi nesse contexto que Montenegro reagiu inicialmente, dizendo então que mantinha a confiança política no líder do PSD-Madeira e presidente da Mesa do Congresso do PSD.
Na entrevista à CNN Portugal emitida ontem à noite, 30 de janeiro, Montenegro justificou essa posição com um imperativo de “lealdade” em relação ao próprio Albuquerque e à “autonomia regional”, considerando também que foi a decisão “correta” e que teria feito o mesmo, embora recusando desvendar se “os nossos tempos [de tomar a decisão] seriam os mesmos”.
Após seis longos minutos de justificações e equilibrismo sobre a crise política na Madeira, porém, o líder do PSD procurou sacudir a pressão e avançou para a revelação de “uma coisa de que toda a gente se está a esquecer, incluindo aqueles que agora me atiram essa pedra“.
Como assim? “Eu fui o único líder da oposição, dos partidos da oposição, que nunca votou uma moção de censura, nem a apresentou nem votou favoravelmente uma moção de censura a um Governo”, afirmou Montenegro.
E passou a explicar: “O que é que isso quer dizer? Quer dizer que eu não andei a pedir eleições todos os dias, sempre que acontecia um caso. O caso da demissão do Primeiro-Ministro fez toda a diferença face a um percurso que tinha cerca de um ano e meio, no qual o Governo esteve de uma forma constante a perder autoridade política, ao ponto de se chegar exatamente àquele dia e eu ter dito que não havia mais nenhuma solução.”
Confirma-se que Montenegro sobressai como “o único líder da oposição que nunca votou [a favor de] uma moção de censura”?
Não. Nem na versão de “líder da oposição”, nem na versão de “líder dos partidos da oposição”, expressas na mesma frase.
Da segunda versão (mais dúbia) pode inferir-se que se referia a qualquer líder de um partido da oposição, com maior ou menor representação parlamentar. E nesse caso teria um carimbo de falso logo na XV Legislatura, entre 2022 e 2023.
Durante esse período foram apresentadas três moções de censura, duas do Chega e uma do Iniciativa Liberal. É verdade que o PSD sob a liderança de Montenegro (que não era deputado à Assembleia da República, sublinhe-se) optou pela abstenção nessas três votações. No entanto, outros partidos da oposição como o BE e o PCP também não votaram a favor de nenhuma dessas moções de censura.
Mas Montenegro estaria a referir-se mais estritamente a “líder da oposição”, isto é, um qualquer líder do maior partido da oposição, sem incluir os outros partidos. Nem assim escapa ao carimbo de falso, porém, embora seja necessário recuar na história até à XI Legislatura, entre 2010 e 2011 (interrompida a meio pelo pedido de resgate financeiro à Troika), quando o Primeiro-Ministro dava pelo nome de José Sócrates.
Nesse conturbado período temporal registam-se duas moções de censura, apresentadas pelo PCP e BE. Em ambos os casos, o então “líder da oposição” (i.e., líder do PSD, maior partido da oposição), Pedro Passos Coelho, optou pela abstenção. Tal como Montenegro que, assim, não foi o único.
“Em política não vale tudo“, afirmou Passos Coelho em fevereiro de 2011, ao justificar a decisão de se abster na votação da moção de censura do BE ao Governo de Sócrates.
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Avaliação do Polígrafo: