“Este aquecimentista tem que ler Timothy Ball, PhD pela Universidade de Londres, até lá não perceberá o processo natural de alterações climáticas, cujo principal fator de influência é o Sol e não os gases atmosféricos. Dessa forma, com o aumento das atividades solares, a tendência é o aquecimento médio das temperaturas no planeta”, garante-se num post partilhado no Facebook.

No entanto, as alegações deste post não têm fundamento científico. Em primeiro lugar, é importante perceber a diferença entre “alterações climáticas” e “variabilidade climática”. Como explica o investigador do Instituto Dom Luiz da Universidade de Lisboa, Pedro Matos Soares, o sistema climático apresenta uma grande variabilidade climática, ou seja, as principais variáveis meteorológicas - tais como a temperatura e a precipitação - mudam, em escalas de dia para dia, ano para ano e até década para década. “De facto, o clima não é estático, ou seja, tem muita variabilidade. Essa variabilidade climática é natural”, reforça o especialista. 

A explicação de Soares é confirmada pelo relatório de 2021 do Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC) da Organização das Nações Unidas (ONU). Na secção “perguntas e respostas” do estudo, o IPCC esclarece que “a variabilidade natural refere-se a variações climáticas causadas por processos que não incluem a influência humana. Inclui a variabilidade que é gerada internamente dentro do sistema climático e a variabilidade que é impulsionada por fatores externos naturais”. 

Por outro lado, “quando falamos em alterações climáticas, o que normalmente estamos a designar são as alterações climáticas antropogénicas, ou seja, que têm origem nas atividades humanas”, garante o especialista do Instituto Dom Luiz. 

“Obviamente que o clima sempre teve alterações, ou seja, variações de origem natural”, reforça Pedro Matos Soares. O que se observa atualmente, continua o especialista, é que, “para além de termos um clima com a sua variabilidade natural, há um forçamento mais importante do ponto de vista de o conduzir [clima] a um aquecimento e alterações mais profundas, numa escala temporal muito expressiva, e é isso que chamamos de alterações climáticas antropogénicas”. 

O Sol é a principal causa das alterações climáticas?

Não. Aliás, de acordo com Pedro Matos Soares, a ligação entre alterações climáticas e o Sol não faz qualquer sentido. Como já foi explicado anteriormente, o termo “alterações climáticas” é utilizado para designar a variações climáticas com origem na ação humana. Ora, o Sol, apesar de ter uma pequena contribuição para a variação do clima, é um fator de origem natural e não humana.

Ao responder à questão “como sabemos que os humanos são responsáveis pelas mudanças climáticas”, o relatório do IPCC clarifica que “o clima é influenciado por uma série de fatores" naturais e humanos. Aponta como "naturais", as variações na atividade do Sol, que alteram a quantidade de energia enviada e recebida pela Terra, e “as grandes erupções vulcânicas, que aumentam o número de pequenas partículas (aerossóis) na atmosfera superior que refletem a luz solar e resfriam a superfície - um efeito que pode durar vários anos”. 

Soares admite que o Sol é um elemento importante do nosso sistema climático. No entanto, prossegue o especialista, “se olharmos para a constante solar, ou seja, a radiação solar que chega à nossa atmosfera, ela tem tido pequenas oscilações, mas tem estado relativamente constante nos últimos anos. Tem oscilações como tudo na natureza”. 

No que diz respeito aos fatores humanos, os indicados pelo IPCC como sendo os principais são “o aumento das concentrações atmosféricas de gases de efeito estufa e de aerossóis da queima de combustíveis fósseis, uso da terra e outras fontes”.

Além disso, refere-se que “as percentagens de aumento da concentração dos principais gases com efeito de estufa (dióxido de carbono, metano e óxido nitroso) atualmente registadas não têm precedentes, pelo menos nos últimos 800 mil anos”. Os cientistas responsáveis pelo estudo ainda sublinham que “várias linhas de evidência mostram claramente que esses aumentos resultam da atividade humana”.

Em termos de números, o mesmo relatório adianta que “quando estimado durante todo o período histórico (1850-2020), a contribuição da variabilidade natural para o aquecimento global da superfície de -0,23°C a +0,23°C é pequena em comparação com o aquecimento de cerca de 1,1°C observado durante o mesmo período, que tem sido quase inteiramente atribuída à influência humana”.

Outros estudos sobre este tema comprovam, da mesma forma, que os seres humanos são amplamente responsáveis pelo facto de o clima estar a mudar. Também a NASA, que tem um site dedicado às alterações climáticas e ao aquecimento global, publicou uma lista das principais organizações científicas ao nível mundial que emitiram declarações públicas onde apoiam a posição de que a probabilidade de o aquecimento global ser provocado pela atividade humana é extremamente elevada.

Em suma, o conteúdo partilhado na publicação é enganador. As alterações climáticas não podem ser consideradas “um processo natural”, porque a forma como termo é geralmente utilizado subentende a origem humana. Além disso, há um consenso científico em torno do impacto da atividade humana nas alterações climáticas.

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EMIFUND

Este artigo foi desenvolvido no âmbito do European Media and Information Fund, uma iniciativa da Fundação Calouste Gulbenkian e do European University Institute.

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