Circulam nas redes sociais, especialmente no Facebook e no X, várias publicações a alegar que Kamala Harris, atual candidata à Presidência dos Estados Unidos da América (EUA), teria afirmado que pretende “acabar com a plataforma X” caso vença as eleições.
Algumas publicações sugerem que a vice-presidente norte-americana teria declarado apoio à censura governamental de redes sociais, citando como exemplo o Brasil e as recentes decisões judiciais que afetaram a operação da plataforma X naquele país.
Uma publicação no Facebook, datada a 3 de setembro, por exemplo, destaca que “Kamala disse que quer acabar com a plataforma X se ela vencer”. Outra no X indica que “Kamala avisou” que “se vencer as eleições americanas, vai fechar o Twitter nos Estados Unidos”. Logo conclui que “a esquerdalhada globalista não está a brincar”.
Mas será que Kamala Harris manifestou mesmo a intenção de suspender o X/Twitter?
Não. Na entrevista em causa, concedida à CNN após um debate em 2019, Kamala Harris defendeu o encerramento da conta de Donald Trump no Twitter, que agora é denominado X, mas em nenhum momento sugeriu suspender a rede social nos EUA.
A alegação – que distorce o discurso da adversária de Trump – começou a circular logo após o anúncio feito pelo regulador de telecomunicações do Brasil, em 30 de agosto de 2024, de suspender temporariamente o acesso à plataforma X no país. Ganhou ainda mais destaque após Robert F. Kennedy Jr., ex-candidato à Presidência dos EUA, partilhar no X uma suposta citação da entrevista de Kamala Harris.
No entanto, estas publicações deturparam a entrevista original. Durante esse confronto de ideias, Kamala Harris, então senadora, apelou ao apoio de Elizabeth Warren na sua proposta para que o X encerrasse a conta de Donald Trump, devido a violações dos termos de uso.
Nessa entrevista, o jornalista Jake Tapper perguntou a Kamala Harris a sua posição, tendo a então senadora respondido: “Estamos a falar de uma empresa privada, o Twitter, que tem termos de uso. A meu ver, e acredito que a maioria concordaria, incluindo membros do Congresso que foram ameaçados por ele, que Trump perdeu os seus privilégios e o Twitter deveria removê-lo.”
Kamala Harris também mencionou que as mesmas regras devem ser aplicadas a todas as redes sociais, destacando a necessidade de maior responsabilidade e regulamentação dessas plataformas, que comunicam diretamente com milhões de pessoas sem supervisão adequada.
É importante ressaltar que Harris não afirmou que bloquearia ou suspenderia o Twitter se fosse eleita presidente, e também não mencionou Elon Musk em momento algum (recorde-se que o empresário só comprou a plataforma em 2022).
O Twitter havia banido a conta de Donald Trump em janeiro de 2021, após o ataque ao Capitólio, por violar as políticas relacionadas à glorificação da violência. A conta foi posteriormente restaurada por Elon Musk em novembro de 2022.
Já a suspensão da plataforma X no Brasil, que ocorreu em 31 de agosto de 2024, está relacionada com uma decisão judicial do ministro Alexandre de Moraes, sem qualquer conexão com as declarações de Kamala Harris.
Desta forma, o vídeo utilizado é descontextualizado, com o propósito de difundir uma afirmação falsa. Kamala Harris justificou o seu pedido para que a conta do Twitter de Donald Trump fosse suspensa, sem sugerir a suspensão da rede social nos EUA ou fazer qualquer menção a Elon Musk, que na época ainda não era proprietário da plataforma.
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Este artigo foi desenvolvido pelo Polígrafo no âmbito do projeto “Geração V – em nome da Verdade”, uma rede nacional de jovens fact-checkers. O projeto foi concretizado em parceria com a Fundação Porticus, que o financia. Os dados, informações ou pontos de vista expressos neste âmbito, são da responsabilidade dos autores, pessoas entrevistadas, editores e do próprio Polígrafo enquanto coordenador do projeto.
*Texto editado por Marta Ferreira.
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