Ao fim de mais de uma década de investigação foi conhecida a data do julgamento da “Operação Marquês”: 3 de julho. No banco dos réus vão sentar-se José Sócrates e outros 21 arguidos.
A decisão foi anunciada aos advogados dos vários arguidos do processo esta segunda-feira, 17 de março, no Campus da Justiça, em Lisboa. O representante do antigo Primeiro-Ministro não esteve presente.
O arranque das audiências acontece quase 11 anos depois de José Sócrates – chefe de Governo entre 2005 e 2011- ter sido detido no Aeroporto de Lisboa e cerca de oito anos depois de o Ministério Público (MP) formalizar a acusação contra os arguidos da “Operação Marquês”.
A defesa do antigo Primeiro-Ministro contesta a marcação do julgamento. Numa nota enviada hoje à comunicação social, citada pelo Jornal “Público“, Pedro Delille assegura que “o Processo Marquês não ultrapassou ainda a fase de instrução” e que, “por essa razão, não pode haver julgamento”. E conclui: “O que realmente fica destes doze anos de ‘Processo Marquês’ é o seu miserável rasto de abuso e de violência.”
José Sócrates foi acusado pelo MP de 31 crimes: três de corrupção passiva de titular de cargo político; 16 de branqueamento de capitais, nove de falsificação de documento e três de fraude fiscal qualificada. No entanto, em 2021, cerca de dois anos e sete meses depois do início do debate instrutório, o juiz Ivo Rosa deixou cair 25 crimes, pronunciando-o para julgamento apenas pela prática de três crimes de branqueamento e três de falsificação de documento.
Em janeiro do ano passado, o Tribunal da Relação de Lisboa deu razão a um recurso do MP, recuperando a maioria dos crimes e estabelecendo que todos os arguidos teriam de ir a julgamento. Com esta decisão, Sócrates passou a estar acusado de 22 crimes: três de corrupção, 13 de branqueamento de capitais e seis de fraude fiscal.
O Polígrafo entrou em contacto com os advogados especialistas em Direito Penal Paulo Saragoça da Mata e Nuno Brandão para perceber se existe forma de José Sócrates evitar o início do julgamento, como aparentemente o seu advogado pretende.
Para Paulo Saragoça da Mata, trata-se de uma impossibilidade prática. “Já estarão passados todos os prazos e não haverá sequer decisões recorríveis no Tribunal de Primeira Instância”, pelo que Sócrates apenas poderá adiá-lo por circunstâncias excecionais, como em caso de doença grave ou hospitalização. “As decisões judiciais são para se cumprir; se está decidido, vai ter de ser cumprido e se é mandado para o tribunal de julgamento, é óbvio que o processo não está na fase da instrução”, aponta.
Para o penalista, o antigo Primeiro-Ministro pode estar a utilizar a defesa de não conformidade, em que o arguido não aceita o poder judiciário. “O que me parece é que o senhor engenheiro José Sócrates não reconhece sequer aos tribunais a autoridade para mandar o processo para julgamento e tudo fará para o evitar”, refere Saragoça da Matta, que encara a estratégia em causa como mera “afirmação política”, tendo em conta que não é possível alterar o que já foi estabelecido pelo Tribunal. “Poderá estar a tentar obter a prescrição do procedimento criminal e poderá ser bem-sucedido em alguns crimes com pena mais baixa, mas não para os mais graves” conclui o advogado.
Nuno Brandão, também penalista, concorda com Saragoça da Matta: “Estando José Sócrates no rol dos acusados, como qualquer outra pessoa, tem o dever de se apresentar ao julgamento (…) O Tribunal recebeu a pronúncia e decidiu que havia condições de fazer audiência de julgamento e, por isso, marcou uma data”, sustenta.
O mesmo advogado conclui sublinhando que mesmo que José Sócrates coloque algum recurso, alegando a nulidade da decisão do tribunal, “isso é algo para ser apreciado muito no final do julgamento, não antes das audiências”.