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Joana Mortágua: “80% da comunidade imigrante são pessoas trabalhadoras, ao contrário dos portugueses que se contam em 40%”

Política
O que está em causa?
Foi em análise ao referendo sobre imigração proposto pelo Chega que a deputada do Bloco de Esquerda salientou a importância dos imigrantes para as contas da Segurança Social. Os números indicados têm fundamento?
© Agência Lusa / Tiago Petinga

“Joana Mortágua diz que imigrantes trabalham ao contrário dos portugueses e devem por isso ter todos os direitos iguais aos portugueses”, destaca-se num tweet de 29 de agosto, apresentando um excerto de uma intervenção de Joana Mortágua num debate no canal Now.

O vídeo tem origem no programa “Now Notícias”, emitido no dia 28 de agosto, com enfoque na exigência do Chega de realizar um referendo sobre a imigração, como moeda de troca para viabilizar o próximo Orçamento do Estado.

Questionada sobre se concordava com as declarações de Marcelo Rebelo de Sousa em que disse ser necessário distinguir entre “realidade” e “narrativas” sobre imigração, a deputada bloquista afirmou que entende que o Presidente da República o faça porque “deteta na proposta do Chega uma base de intolerância religiosa e de racismo anti-muçulmano ou anti-determinadas comunidades”.

Mas, do ponto de vista do Bloco de Esquerda, “independentemente da comunidade maioritária, não há dúvida nenhuma de que a comunidade imigrante deve ter os mesmos direitos e deve ser tratada por igual em Portugal”.

Dito isto, acrescentou (sendo esta a frase que maior controvérsia gerou): “É uma comunidade que contribui muito positivamente para as contas da Segurança Social. 80 por cento da comunidade imigrante são pessoas trabalhadoras, ao contrário dos portugueses que se contam em 40 e tal por cento. Portanto, é uma população em idade muito ativa que emigra para trabalhar.”

A intervenção foi interrompida pelo deputado Bruno Nunes, do Chega, com a acusação de que Joana Mortágua teria dito que “os portugueses não trabalham“. Também motivou críticas nas redes sociais.

Mas os dados apontados por Joana Mortágua estão errados?

Nos comentários ao tweet é solicitado ao Polígrafo uma verificação às contas da bloquista com a indicação de que o vídeo mostra “Joana Mortágua a mentir com todos os dentes que tem na boca” porque existem “1.04 milhões de imigrantes legais, mas menos de 500 mil trabalham“, logo, estes números não resultam em 80% “nem aqui nem na China”.

Ora, de facto registam-se mais de um milhão de imigrantes em Portugal e perto de 500 mil estão empregados. É isso que nos diz a caracterização feita pelo Banco de Portugal num estudo inserido no Boletim Económico de junho. No entanto, este tem por base apenas os dados da Segurança Social e exclusivamente trabalhadores por conta de outrem.

“Em 2014, o número médio de trabalhadores estrangeiros era de 55,6 mil, tendo aumentado para 495,2 mil em 2023, o que representou 2,1% e 13,4% do número total de trabalhadores por conta de outrem em cada um destes anos”, indica o documento.

O problema está precisamente neste afunilamento aos trabalhadores por conta de outrem. Joana Mortágua referia-se antes aos dados do Observatório das Migrações (os mais recentes foram publicados em dezembro de 2023) em que se conclui que “em 2022, mantendo a tendência de anos anteriores, os estrangeiros mostram maior capacidade contributiva que os nacionais para o sistema de segurança social”.

De acordo com este relatório estatístico anual, “os estrangeiros mantêm mais contribuintes por total de residentes (87 contribuintes por cada 100 residentes em 2022) que a população total em Portugal (48 contribuintes por cada 100 residentes)”.

Neste documento, há outro dado importante em que se clarifica um dos motivos a que se deve o maior incremento de estrangeiros contribuintes nos últimos anos e que se distingue assim da caracterização do Banco de Portugal porque não contabiliza apenas os trabalhadores por conta de outrem. Em causa “a introdução da medida atribuição de NISS na hora para cidadãos estrangeiros que pretendem exercer uma atividade subordinada ou independente em Portugal e ter um relacionamento com o sistema de Segurança Social, no âmbito de uma obrigação contributiva”.

Segundo o Observatório, esta medida criada em 2020 “teve um impacto especialmente favorável no incremento do número de contribuintes estrangeiros no país”, tendo aumentado de “393.937 contribuintes estrangeiros em 2019”, passando “a 424.249 em 2020”, e continuando a crescer “para 475.892 em 2021” e “extraordinariamente para 682.719 em 2022”.

Em resposta a contacto do Polígrafo, fonte oficial do Bloco de Esquerda esclarece que “a afirmação baseia-se em dados do relatório anual do Observatório das Migrações, no qual se constata o facto de os estrangeiros terem maior capacidade contributiva para o sistema de Segurança Social”.

Sublinha ainda que “os números são, até, ligeiramente superiores ao que foi referido por Joana Mortágua” e conclui: “Os imigrantes ajudam a economia portuguesa e dão um contributo essencial para a Segurança Social.”

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Avaliação do Polígrafo:

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