- O que está em causa?"O acréscimo de receita nos primeiros sete meses do ano é o dobro daquele que o Orçamento do Estado (OE) previa para a totalidade de 2023", declarou ontem à tarde o deputado do PSD, Hugo Carneiro, na Comissão Permanente que marcou presença na Assembleia da República para algumas declarações políticas. Têm fundamento as acusações do social-democrata?

A Comissão Permanente marcou ontem presença na Assembleia da República, desde logo para que Augusto Santos Silva pudesse ler aos deputados a mensagem do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, sobre o veto ao pacote legislativo "Mais Habitação". Mas, para os "ouvintes", os problemas que o país atravessa vão além da crise habitacional. Prova disso foram as declarações políticas que se seguiram.
Hugo Carneiro, deputado do PSD, aproveitou a sua intervenção para se focar na política fiscal portuguesa. "O país tem hoje condições ímpares para baixar os impostos, ponto parágrafo", começou por sublinhar o social-democrata. "São condições que não existiam com esta magnitude em janeiro de 2022 e que resultam, em grande parte, do imposto da inflação. Recordo que em janeiro de 2022 a previsão da inflação era de cerca de 1,5% e acabou por ser de 7,4%. Os portugueses sentem-se esmagados pelo peso da carga fiscal, que atingiu em 2022 máximos históricos. E mesmo em termos relativos, face à riqueza per capita, Portugal tem o sexto maior esforço fiscal da União Europeia", elaborou Carneiro.
"Para que os portugueses percebam, pagar um café em Portugal não é a mesma coisa que pagar um café na Dinamarca”, exemplificou. "O Governo prometeu, no Programa de Estabilidade, que baixaria o IRS no montante de dois mil milhões de euros até 2027, isto são 500 milhões em cada ano. Mas o Executivo socialista omite que as condições existentes hoje, por força de uma arrecadação de receita muito superior ao estimado no Orçamento do Estado (OE), vão já para lá das estimativas que apresentou", afirmou o deputado.
"Por isso temos de reduzir já em 2023 pelo menos 1.200 milhões de euros. E porquê? Porque o Estado está a arrecadar muito mais do que o que esperava em receita fiscal em 2023. Este ano, a previsão era de que a receita de impostos aumentasse face a 2022 em 1.373 milhões de euros. Até julho, o aumento face ao mesmo período de 2022 já ascende a 2.607 milhões de euros. O acréscimo de receita nos primeiros sete meses do ano é o dobro daquele que o OE previa para a totalidade de 2023", concluiu o deputado.
Estará correto?
Olhando para os dados que constam no boletim de "Síntese da Execução Orçamental" de julho deste ano (pode consultar aqui), elaborado pela Direção-Geral do Orçamento (DGO), "em julho de 2023, as Administrações Públicas (AP) registaram um saldo orçamental de 5.135,9 milhões de euros, o que traduz uma melhoria de 4.564,2 milhões de euros, face ao registado em igual período do ano anterior, em resultado do crescimento da receita (14%) superior ao da despesa (5,9%). O saldo primário situou-se em 9.305 milhões de euros, mais 4.768,1 milhões de euros do que em julho de 2022".
No período a que se referia o deputado social-democrata, entre janeiro e maio de 2023, a receita fiscal executada foi de 34.434,3 milhões de euros, mais 2.815,4 milhões de euros do que no mesmo período de 2022, traduzindo-se assim num aumento de 8,9% da receita fiscal.
Quanto à previsão do OE para 2023 relativamente à receita fiscal, estimava-se que esta ascendesse a 54.278,8 milhões de euros em 2023, resultando num aumento de 1,4% em comparação com o ano anterior. Em 2022 a receita fiscal ascendeu a 53.503,7 milhões de euros, um aumento de 15,9% em relação a 2021.
Ou seja, no OE2023 estava previsto um aumento de cerca de 775 mil euros para o ano inteiro, uma estimativa já ultrapassada há muito. Com base nos dados destes primeiros sete meses de 2023, verifica-se que até julho houve um aumento de 2.815,4 milhões de euros em relação ao período homólogo, mais do triplo do estimado no OE2023.
Hugo Carneiro referia-se, no entanto, à receita fiscal líquida do subsetor Estado, que totalizou 30.925,8 milhões de euros até julho de 2023, uma subida de 9,2% (2.606,9 milhões de euros). Em julho de 2022, a receita fiscal do subsetor Estado executada fixava-se em 28.156,1, uma variação de cerca de 2.769 milhões de euros.
Neste sentido, no que diz respeito à receita fiscal líquida do subsector Estado, o OE2023 estimava que "deverá refletir um crescimento correspondente a 811 milhões de euros (1,5%) (e não 1.373 milhões como referiu Carneiro) face à estimativa de receita para 2022, ascendendo a 53.637 milhões de euros". Ou seja, também aqui se verifica que a receita é mais do que o dobro do estimado pelo OE2023, chegando mesmo ao triplo do previsto para o ano completo.
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Avaliação do Polígrafo:
