Com o debate sobre a nova Lei de Bases da Saúde no seu auge – afinal, Marcelo Rebelo de Sousa aprovará ou não a proposta do governo liderado por António Costa? -, a desinformação sobre o tema tem-se acumulado nas redes sociais e na blogosfera. As dúvidas são variadas: afinal o que separa os partidos nesta matéria?; o PSD e o CDS querem privatizar a Saúde?; os partidos à esquerda pretendem acabar com a atividade privada?; quem criou afinal o SNS?
Nos últimos dias, foram muitos os leitores do Polígrafo que nos fizeram chegar, via WhatsApp (968213823) informação contraditória ou pouco rigorosa que tem vindo a ser veiculada sobre o tema, essencialmente através de plataformas ligadas à disseminação de fake news. De todas as questões, a mais insistente tem sido a que se relaciona com a rejeição, pelo PSD, da lei que criou o Serviço Nacional de Saúde em 1979 – sobretudo desde a noite de quarta-feira, quando, no seu programa de comentário semanal na TVI, Manuela Ferreira Leite afirmou que “foi o PSD que criou o SNS”.
A verdade é que o PSD, juntamente com o CDS, votou contra a chamada “lei Arnaut”, quando ela foi levada ao Parlamento, onde foi aprovada com os votos favoráveis do PS, do PCP, da UDP e do deputado independente Brás Pinto. Na base da recusa da direita esteve o facto de o texto consagrar um SNS “universal e gratuito”.
O PSD viria, em 1990, embalado pela maioria absoluta cavaquista, a fazer aprovar uma nova Lei de Bases da Saúde em que introduzia a palavra “maldita” para a esquerda: “privado”. Cavaco fez questão de deixar expresso que os cuidados de saúde seriam prestados em articulação com o sector privado – o então primeiro-ministro colocava no terreno a pretensão de abrir vários sectores da economia à iniciativa privada e a saúde não foi exceção. A seu lado esteve o CDS. Do outro lado da barricada estavam os “vencedores” de 1979.
Agora segue-se a tréplica de António Costa, que no recente debate quinzenal na Assembleia da República sublinhou que “é muito importante que a Lei de Bases da Saúde em discussão na Assembleia da República seja aprovada, não por uma maioria qualquer, mas pela maioria que criou, apoiou, defendeu e desenvolveu o SNS”.
A qualidade daqueles que votaram a lei não é nunca, nem pode ser, razão para chumbar a lei”, afirmou Carlos César.
Afirmar que Manuela Ferreira Leite garantiu na TVI 24 que o SNS foi uma criação do PSD, como muitos fizeram nas redes sociais, não é rigoroso: na verdade, o que a ex-líder pretendeu dizer é que foi o governo PSD que implementou a lei aprovada pela esquerda, uma vez que terá sido, na sua opinião, apenas a partir do cavaquismo que se construiu verdadeiramente aquilo que encaramos hoje como SNS.
Marcelo Rebelo de Sousa já fez saber que, se a Lei de Bases da Saúde for aprovada somente com os votos dos partidos de esquerda, não merecerá a sua promulgação. O PS, através de Carlos César, líder parlamentar, reagiu com humor às intenções do Presidente da República: “Pensei, quando vi essas declarações, que o Presidente da República estava a estimular o PSD a aproximar-se”. E acrescentou: caso o veto se confirme, “o Parlamento avaliará a forma de reconfirmar esta lei, com ou sem alterações (…) a qualidade daqueles que votaram a lei não é nunca, nem pode ser, razão para chumbar a lei”.
Avaliação do Polígrafo: