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Guerra na Ucrânia. O PCP foi “o único partido” que não condenou a invasão militar ordenada por Putin?

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Ucrânia
Este artigo tem mais de um ano
O que está em causa?
A Comissão Permanente da Assembleia da República reuniu ontem para discutir a situação de guerra na Ucrânia, iniciada durante a madrugada por forças militares da Rússia. Nesse mesmo dia surgiu uma publicação no Facebook realçando que "o PCP foi o único partido a pôr-se ao lado de [Vladimir] Putin" e terá mesmo defendido que a "invasão da Ucrânia é uma perigosa estratégia de tensão e propaganda belicista promovida pelos EUA, a NATO e a União Europeia". Confirma-se?

“Na verdade, o Partido Comunista Português (PCP) jamais ultrapassará o trauma do fim da União Soviética e vai morrer com esse pesar. Por outro lado, já alguém do PCP classificou a Coreia do Norte como uma democracia. Também sabemos que Hitler e Stalin fizeram um pacto e por via do qual invadiram e dividiram entre eles países como a Polónia. Mas os tempos passaram, a História condenou essas atitudes e hoje as atitudes das nações e dos povos são outras. Apesar disto, alguns, como é o caso do PCP, nada mudaram e, mesmo às portas da morte, dá-nos este espetáculo de traição à nação e ao seu povo, ao apoiar a invasão de um dos nossos”, lê-se no texto em causa.

Foi publicado no mesmo dia em que a Comissão Permanente da Assembleia da República reuniu para discutir a situação de guerra na Ucrânia, iniciada durante a madrugada por forças militares da Rússia, sob a liderança do presidente Vladimir Putin. No decurso da reunião (que contou com a participação do ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva), o deputado João Oliveira, líder da bancada parlamentar do PCP, afirmou que “a guerra não é solução seja para que problema for e é preciso fazer esforços para a evitar“.

No entanto, tal como reportou a Agência Lusa, “o PCP foi o único partido até agora a recusar condenar o presidente da Federação Russa, Vladimir Putin, pela invasão do território ucraniano e João Oliveira referiu que é ‘evidente que a situação que se vive na Ucrânia não é um problema entre russos e ucranianos, nem apenas uma disputa por território ou demarcação de fronteiras”.

“O problema é mais profundo, mais amplo e ultrapassa em muito o Leste europeu“, disse Oliveira, atribuindo a responsabilidade aos Estados Unidos da América (EUA), “os verdadeiros interessados numa nova guerra na Europa” e que estão “dispostos a sacrificar até ao último ucraniano ou europeu para a promover“.

O deputado comunista denunciou que os EUA estão a promover uma nova guerra “a milhares de quilómetros das suas fronteiras” para “desviar atenções de problemas internos” e “assegurar a venda de armamento em larga escala”. E sublinhou:

“No quadro em que o conflito na Ucrânia está hoje colocado, a solução da paz só pode ser alcançada travando a escalada de confrontação da NATO, dos Estados Unidos e da União Europeia com a Rússia e contando com o contributo da Rússia para uma solução política e pacífica negociada.”

A intervenção de Oliveira no debate de ontem está transcrita na página do PCP (pode consultar aqui). Não encontramos qualquer tipo de condenação da invasão militar ordenada por Putin. A única declaração mais próxima de uma crítica é a que passamos a transcrever:

Sendo hoje a Rússia um país capitalista, o seu posicionamento é determinado no essencial pelos interesses das suas elites e dos detentores dos seus grupos económicos e apesar de os orçamentos militares dos países da NATO serem 10 vezes superiores ao da Rússia, não é expectável que a Rússia, cujo povo conheceu na história colossais agressões, venha a considerar aceitável que o inimigo esteja acampado nas suas fronteiras ou lhe faça um cerco militar por via de um ainda maior alargamento da NATO.”

Aliás, em resposta ao discurso do deputado comunista, o ministro dos Negócios Estrangeiros fez questão de registar que o PCP não tinha condenado a invasão da Ucrânia pela Rússia, ordenada por Putina. “Ainda tem 13 segundos para o fazer“, desafiou Santos Silva.

No entanto, Oliveira disse que o governante pediu ao PCP para condenar “apenas uma circunstância“.

“Condenamos todo o caminho que nos trouxe até aqui e condenamos todas as ações que contribuem para o mesmo objetivo. A escalada de confrontação política, económica e militar não é um ato ou uma circunstância isolada”, completou, alegando que para isso contribuiu a “extensão, durante 30 anos, das fronteiras da NATO” com a Rússia.

Ao que Santos Silva respondeu que “essa técnica de querer condenar tudo ao mesmo tempo é o melhor disfarce” para recusar condenar o regime de Putin.

Esta manhã, em declarações aos jornalistas sobre os ataques militares ordenados por Vladimir Putin contra a Ucrânia, António Costa abriu as portas a refugiados ucranianos e fez questão de tranquilizar os portugueses relativamente às potenciais consequências da guerra. Segundo garantiu o primeiro-ministro, "Portugal é menos dependente do que outros Estados da energia da Rússia". Confirma-se?

No mesmo dia, o PCP também publicou uma nota de imprensa através da qual “expressa a sua profunda preocupação pelos graves desenvolvimentos na situação no Leste da Europa, envolvendo operações militares de grande envergadura da Rússia na Ucrânia, muito para além da região do Donbass, e apela à urgente desescalada do conflito, à instauração de um cessar-fogo e à abertura de uma via negocial“.

Ora, esse texto não difere muito da intervenção de Oliveira na Assembleia da República, salientando novamente que “o agravamento da situação é indissociável da perigosa estratégia de tensão e confrontação promovida pelos EUA, a NATO e a União Europeia contra a Rússia, que passa pelo contínuo alargamento da NATO e o reforço do seu dispositivo militar ofensivo junto às fronteiras daquele país, e em que insere a instrumentalização da Ucrânia, desde o golpe de Estado de 2014, com o recurso a grupos fascistas, e que levou à imposição de um regime xenófobo e belicista, cuja violenta acção é responsável pelo agravamento de fracturas e divisões naquele país”.

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Avaliação do Polígrafo:

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