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Governo obriga escolas a deixarem as crianças “escolher a casa de banho e o balneário de acordo com o seu ‘género'”?

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Este artigo tem mais de um ano
O que está em causa?
"Educação: Despacho do Governo leva a ideologia de género para a casa de banho das crianças", denuncia-se no título de uma nova publicação na página "Notícias Viriato". No respetivo texto salienta-se que "uma das medidas mais polémicas deste despacho é que as escolas são obrigadas a deixarem a criança, de qualquer idade, escolher a casa de banho e o balneário de acordo com o seu 'género'". Verdade ou falsidade?

Surgiu hoje uma nova publicação na página “Notícias Viriato” (cujos conteúdos já analisámos aqui, por exemplo), alertando para uma iniciativa do Governo que supostamente instruiu as escolas a deixarem que “um rapaz, de qualquer idade, que se identifique como rapariga, pode utilizar os balneários femininos mesmo tendo os órgãos sexuais masculinos” (e vice-versa, embora essa possibilidade não seja invocada na publicação em causa).

“Educação: Despacho do Governo leva a ideologia de género para a casa de banho das crianças“, denuncia-se no título da publicação. E no respetivo texto salienta-se que “uma das medidas mais polémicas deste despacho é que as escolas são obrigadas a deixarem a criança, de qualquer idade, escolher a casa de banho e o balneário de acordo com o seu ‘género'”.

 

 

“No dia 16 de agosto, o Conselho de Ministros, e mais especificamente a secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade, Rosa Monteiro, e o secretário de Estado da Educação, João Costa publicaram o Despacho nº 7247/2019 que ‘estabelece as medidas administrativas para a implementação do previsto no nº1 do Artigo 12º da Lei nº 38/2018‘. Por outras palavras, o Governo oficializa a implementação da ideologia de género nas escolas“, começa por se indicar no artigo.

“Este despacho vem estabelecer as medidas que as escolas têm que tomar, para respeitar o ‘direito à autodeterminação da identidade de género e expressão de género e o direito à proteção das características sexuais de cada pessoa‘. Uma das medidas mais polémicas deste despacho é que as escolas são obrigadas a deixarem a criança, de qualquer idade, escolher a casa de banho e o balneário de acordo com o seu ‘género'”, prossegue.

“Outras medidas incluem: ‘canais de comunicação e deteção’ para identificar o responsável na escola a quem pode ser comunicada a situação de ‘crianças e jovens que manifestem uma identidade ou expressão de género que não corresponde à identidade de género à nascença‘; alterar a documentação escolar para se adequar ao ‘nome e/ou género autoatribuído, em conformidade com o princípio do respeito pelo livre desenvolvimento da personalidade da criança ou jovem em processo de transição social de género, conforme a sua identidade autoatribuída’; ‘obrigar os docentes e os outros alunos a usar o nome ‘autoatríbuído’ pela criança ou jovem que está em ‘transição social de identidade e expressão de género’; ‘ser respeitada a utilização de vestuário no sentido de as crianças e dos jovens poderem escolher de acordo com a opção com que se identificam‘; ‘ações de formação dirigidas ao pessoal docente e não docente […] de forma a impulsionar práticas conducentes a alcançar o efetivo respeito pela diversidade de expressão e de identidade de género, que permitam ultrapassar a imposição de estereótipos e comportamentos discriminatórios‘”, acrescenta.

Ora, confirma-se que o Governo obriga as escolas a deixarem as crianças “escolher a casa de banho e o balneário de acordo com o seu ‘género'”? Ou seja – no sentido da interpretação difundida na publicação em análise -, obriga as escolas a deixarem que “um rapaz, de qualquer idade, que se identifique como rapariga, pode utilizar os balneários femininos mesmo tendo os órgãos sexuais masculinos”? Verificação de factos.

De acordo com o disposto no referido Despacho nº 7247/2019, no terceiro ponto do Artigo 5º (Condições de proteção da identidade de género e de expressão), “as escolas devem garantir que a criança ou jovem, no exercício dos seus direitos, aceda às casas de banho e balneários, tendo sempre em consideração a sua vontade expressa e assegurando a sua intimidade e singularidade“.

É a partir deste ponto específico do despacho que a publicação na página “Notícias Viriato” avança para a conclusão de que o Governo obriga as escolas a deixarem as crianças “escolher a casa de banho e o balneário de acordo com o seu ‘género'” e, desenvolvendo ainda mais tal interpretação, obriga as escolas a deixarem que “um rapaz, de qualquer idade, que se identifique como rapariga, pode utilizar os balneários femininos mesmo tendo os órgãos sexuais masculinos“.

Trata-se de uma interpretação errada que deturpa e extrapola a formulação original da medida no referido diploma do Governo. O que está em causa é que as crianças possam aceder às casas de banho e balneários, “tendo sempre em consideração a sua vontade expressa e assegurando a sua intimidade e singularidade”. É uma medida sobretudo defensiva, no sentido de proteger a “intimidade e singularidade” de cada criança.

Concluindo, o Governo não obriga as escolas a deixarem que “um rapaz, de qualquer idade, que se identifique como rapariga, pode utilizar os balneários femininos mesmo tendo os órgãos sexuais masculinos” e vice-versa. O que é assegurado através do referido diploma é que um rapaz que se identifique como rapariga não seja obrigado/a a utilizar os balneários masculinos, ou que uma rapariga que se identifique como rapaz não seja obrigada/o a utilizar os balneários femininos. Acrescem as situações de identidade não binária.

No limite, a solução para estas situações poderá passar pela disponibilização de espaços neutros ou vazios – isto é, utilizarem a casa de banho e balneário (masculinos ou femininos) quando não estão a ser utilizados por outras crianças, cuja presença possa colocar em causa a sua “intimidade e singularidade”. É o que se depreende a partir do disposto no diploma do Governo.

Há uma componente de interpretação subjetiva/opinativa na publicação em análise que extravasa o perímetro de fact-checking. No entanto, a publicação não é sinalizada como um artigo de opinião e está a propagar-se nas redes sociais como sendo uma notícia objetiva. Difundindo assim uma interpretação errada que deturpa e extrapola o sentido original da medida inscrita no diploma, acrescentando elementos de alarmismo e sensacionalismo. Em suma, desinformando a opinião pública.

 

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Nota editorial: este conteúdo  foi selecionado pelo Polígrafo no âmbito de uma parceria de fact-checking com o Facebook, destinada a avaliar a veracidade das informações que circulam naquela rede social.

Na escala de avaliação do Facebook este conteúdo é:

Falso: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

Na escala de avaliação do Polígrafo este conteúdo é:

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