No debate parlamentar com o primeiro-ministro, realizado esta quinta-feira na Assembleia da República, a deputada centrista Cecília Meireles apontou o dedo ao Governo (em especial a António Costa) em relação aos preços dos combustíveis.
“Falando em gasolina e alívio fiscal para a classe média, eu gostava de lembrar do seu adicional ao Imposto Sobre Produtos Petrolíferos e Energéticos (ISP) que criou em 2016. E gostava de lhe lembrar porque cada vez que um português enche um depósito com 67 euros de gasolina, quase 40 euros são para o Estado. Portanto, a grande margem é para o Estado. E, senhor primeiro-ministro, é fundamental que explique porque, em vez de resolver o problema da ‘margem de leão’, que é a margem do Estado, em vez de regular a sua margem, resolveu regular a margem de outros operadores. Gostava só de lhe dizer que quer a ERSE, regulador da energia em Portugal, quer a Autoridade da Concorrência vieram não apenas dizer com palavras que o grande responsável do custo do gasóleo e da gasolina em Portugal são os impostos, como trouxeram um desenho a explicar de onde vem o diferencial. Eu gostava de saber se está disponível para reverter o adicional do gasóleo e da gasolina”, questionou a deputada do CDS-PP.
Em resposta, António Costa disse que “não houve qualquer alteração da fiscalidade por parte deste Governo, não está aí nenhuma explicação para o aumento dos custos do gasóleo, e portanto não vale a apena ir por aí” e rejeitou qualquer influência do atual Governo no aumento do preço dos combustíveis
No entanto, Cecília Meireles insistiu no mesmo assunto, citando a Portaria n.º 24-A/2016, “a qual aumentou seis cêntimos por litro no ISP“. Segundo a deputada, o Governo “aumentou o preço por esta via e prometeu que baixava logo que o preço do petróleo voltasse a aumentar”, o que “nunca cumpriu“.
“O custo tributário que tem subido é o que resulta da taxa de carbono. Resulta e bem. Porque é preciso de uma vez por todas, os responsáveis políticos deixarem de ter dois discursos e deixarem de se fazer de sonsos perante a opinião pública. Os responsáveis políticos não podem dizer durante metade da semana que há uma emergência climática e na outra metade da semana dizer que não querem medidas para combater a emergência climática. A emergência climática é uma emergência de todos os dias. Exige uma taxa de carbono e essa taxa de carbono vai continuar a aumentar. E é uma política correta não dar o menor contributo para baixar a fiscalidade sobre os combustíveis carbonizados. Ponto final”, respondeu, com veemência, o primeiro-ministro.
“A emergência climática é uma emergência de todos os dias. Exige uma taxa de carbono e essa taxa de carbono vai continuar a aumentar. E é uma política correta não dar o menor contributo para baixar a fiscalidade sobre os combustíveis carbonizados. Ponto final”.
António Costa tomou posse pela primeira vez como primeiro-ministro no dia 26 de novembro de 2015. Nesse ano, de acordo com os dados da Pordata, o preço médio de venda do gasóleo rodoviário foi de 1,20 euros por litro. Esse preço baixou ligeiramente em 2016 (1,18 euros), mas depois, até 2019, houve uma tendência de crescimento. De 2016 para 2017 aumentou dez cêntimos (1,28 euros), em 2018 subiu mais 11 cêntimos (1,39 euros) e em 2019 chegou aos 1,41 euros por litro. No ano passado, o preço médio de venda do gasóleo caiu para os 1,30 euros por litro.
De acordo com o Boletim do Mercado de Combustíveis e GPL de agosto de 2021 (último disponível), elaborado pela Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE), o preço médio de venda ao público do gasóleo era de 1,498 euros e o da gasolina era de 1,717 euros por litro.
Quanto aos impostos, o Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), desde logo, está fixado em 23% do custo total, ou seja, só sobe caso as restantes componentes do preço subirem. Já os outros impostos que compõem o preço dos combustíveis são o Imposto dobre Produtos Petrolíferos (ISP), a Contribuição Rodoviária e a Taxa de Carbono. De acordo com os dados da Direção-Geral de Energia e Geologia (DGEG), divulgados pela Associação Portuguesa de Empresas Petrolíferas (APETRO), o total destes impostos tem vindo a oscilar, embora seja tendencialmente crescente. O mesmo aconteceu com a gasolina.
No gasóleo, em 2015, quando António Costa tomou posse, esses impostos somavam 0,40201 euros por litro de gasóleo, mas aumentou para 0,46592 euros por litro no ano seguinte. O valor manteve-se estável, com muito pequenas variações, até 2019. Em 2020, os impostos aumentaram alguns cêntimos e atingiram os 0,51260 euros por litro, valor muito semelhante ao atual (0,51335 euros por litro).
Já na gasolina, os mesmos impostos somavam 0,61751 euros por litro, em 2015. Esse valor, entre aumentos e reduções, chegou aos 0,66798 euros por litro atuais. Como se vê nos gráficos, o ISP tem tido poucas alterações e é a taxa de carbono que tem aumentado nos últimos anos, como referiu António Costa.
Assim, apesar de ser verdade que na atual legislatura o Governo socialista não teve grande influência no aumento do preço dos combustíveis, como afirmou Costa, também é verdade que na legislatura anterior o Executivo assinou o maior aumento do ISP dos últimos anos.
Na altura, em 2016, o ministro das Finanças, Mário Centeno, justificou o aumento para garantir a neutralidade fiscal tendo em conta a descida das cotações do petróleo. Uma vez que o Estado estava a perder receitas no IVA, o Governo subiu o ISP para seis cêntimos por litro. No entanto, assumiu o compromisso de rever em baixa o imposto quando o valor do petróleo subisse, o que provocaria um aumento do preço e uma subida do IVA cobrado. O Executivo ainda ajustou o imposto ao longo de 2016, mas deixou de o fazer em 2017, quando anunciou que o compromisso da neutralidade fiscal apenas era válido para 2016.
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Avaliação do Polígrafo: