“Com papas e bolos se enganam os tolos. E a verdade é que funciona em Portugal, ou não fosse a maioria absoluta prova provada disso”, comenta-se num tweet que difunde a tabela em causa, datado de 22 de junho.
Supostamente baseada em dados da Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO), na tabela estabelece-se uma comparação entre o último ano do Governo de Pedro Passos Coelho e os primeiros quatro anos do Governo de António Costa no que respeita aos valores orçamentados e executados de investimento no SNS.
Esses dados indicam que os valores executados entre 2016 e 2019 (mínimo de 110 milhões de euros a máximo de 156 milhões de euros) permaneceram sempre abaixo do valor executado em 2015 (total de 163 milhões de euros). Mais, a taxa de execução em 2015, ao nível de 68%, também foi superior à registada nos quatro anos seguintes (de 42% a 54%).

Em julho de 2021, o Polígrafo já tinha verificado (e validado, através dos Boletins de Execução Orçamental e dos Orçamentos do Estado) um gráfico com a evolução dos valores orçamentados e executados para investimento no SNS entre 2015 e 2020.
Ora, esta tabela que surgiu mais recentemente no Twitter apresenta valores próximos, mas diferentes, com destaque para o ano de 2019: no gráfico, o investimento executado no SNS em 2019 superou o de 2015, ao passo que na tabela permaneceu abaixo, tal como nos três anos anteriores.
Na medida em que se indica a UTAO como fonte dos dados da tabela, o Polígrafo questionou esssa entidade – uma unidade especializada que funciona sob orientação da comissão parlamentar permanente com competência em matéria orçamental e financeira, prestando-lhe apoio pela elaboração de estudos e documentos de trabalho técnico sobre a gestão orçamental e financeira pública – no sentido de esclarecer a discrepância dos valores.
Depois de analisar a tabela em causa, a UTAO concluiu que “os números provêm de fontes não comparáveis entre si, inviabilizando conclusões baseadas na comparação interanual”.
“A UTAO buscou as várias fontes que produzem dados primários sobre finanças públicas e, em particular, sobre a contabilidade das entidades do Ministério da Saúde para descobrir a origem” dos dados da tabela, apurando que “provieram de fontes diferentes que não são comparáveis por razões metodológicas. Por exemplo, o investimento orçamentado corresponde à dotação orçamental corrigida a 31 de dezembro no caso dos anos 2015 a 2017 e à previsão no relatório do Ministério das Finanças que acompanhou a Proposta de Orçamento do Estado no caso de 2018. Esta previsão foi feita a 16 meses do fecho do ano a que respeita, enquanto que as dotações corrigidas são verbas conhecidas no último dia do exercício económico a que o investimento respeita”.
“Também no caso do investimento executado são mostrados valores não comparáveis: para 2015 a 2017, são dados em contabilidade orçamental (princípio de caixa) correspondentes ao fecho de contas definitivo efetuado pelo Ministério das Finanças (Conta Geral do Estado); já para os dois últimos anos, o investimento executado está expresso noutra ótica contabilística, a contabilidade financeira (princípio do acréscimo), e provém de outra entidade, a Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS), constando também de uma publicação da Direção-Geral do Orçamento”, explicou a UTAO na resposta ao Polígrafo.
Em conclusão, a tabela partilhada nas redes sociais “foi construída com números provenientes de fontes primárias oficiais. Porém, as fontes usam sistemas contabilísticos diferentes, definições de variáveis diferentes e conjuntos de informação diferentes para elaboração de previsões. Estas incoerências impedem a extração de comparações entre anos”.
Posto isto, a UTAO forneceu ao Polígrafo “um quadro metodologicamente correto para permitir aferir a evolução, entre 2015 e 2020, das três variáveis acima mencionadas”. Trata-se do Quadro 3 que publicamos neste artigo.

“O universo institucional coberto corresponde ao conjunto de entidades que integrou o Ministério da Saúde em cada um dos anos observados. O SNS faz parte deste universo e, na verdade, agrega a maior parte da despesa pública em saúde. Por limitações de tempo, não foi possível à UTAO apurar aquelas variáveis em termos consolidados para o conjunto SNS. (…) Os dados no Quadro 3 provêm do Orçamento do Estado aprovado na Assembleia da República (investimento orçamentado) e da Conta Geral do Estado do ano respetivo (no caso do investimento executado). A taxa de execução é calculada como o rácio entre aquelas variáveis”, detalhou a UTAO.
“O Quadro 3 apresenta séries coerentes e comparáveis ao longo dos anos para o investimento do Ministério da Saúde. Este inclui todo o SNS e um conjunto de outras entidades que, não sendo prestadoras de cuidados de saúde, apoiam o SNS e conduzem tecnicamente a política pública de saúde”, sublinhou.
Em suma, confirma-se que o Governo de Costa investiu menos no SNS entre 2016 e 2019 do que o Governo de Passos Coelho em 2015, mas os valores indicados na tabela (difundida no Twitter) “provêm de fontes não comparáveis entre si”.
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Avaliação do Polígrafo: