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Filhos de imigrantes têm prioridade nas vagas das escolas em detrimento de crianças portuguesas?

Sociedade
O que está em causa?
Desde há anos que se alega nas redes sociais que as crianças estrangeiras beneficiam de supostos privilégios no acesso às escolas ou creches em Portugal. Em publicação recente no X/Twitter, por exemplo, questiona-se sobre o porquê de um filho de imigrante "ter prioridade na seleção das escolas em comparação a uma criança portuguesa".
© Agência Lusa / José Coelho

“Nunca irei perceber o porquê de um filho de um imigrante que mal se mudou para Portugal ter prioridade na seleção das escolas em comparação a uma criança portuguesa que nasceu e sempre viveu aqui. É injusto! A primeira prioridade de seleção devia ser a nacionalidade portuguesa”, denuncia-se numa publicação de 17 de agosto no X/Twitter.

Esta ideia de suposta “prioridade” tem fundamento?

No que concerne ao regime de matrícula e frequência no âmbito da escolaridade obrigatória das crianças e jovens entre os 6 e os 18 anos, a legislação que estabelece os procedimentos e normas na distribuição de crianças e alunos consiste no Despacho Normativo n.º 10-B/2021. Nos respetivos Artigos 10.º e 11.º definem-se as “prioridades na matrícula ou renovação de matrícula”, sendo o primeiro caso referente à educação pré-escolar e o segundo ao ensino básico.

No Artigo 10.º indica-se que a prioridade relativamente a crianças em educação pré-escolar é dada em primeiro lugar em função da idade, ou seja, “crianças que completem os 5 e os 4 anos de idade até dia 31 de dezembro, sucessivamente pela ordem indicada”; “crianças que completem os 3 anos de idade até 15 de setembro” e “crianças que completem os 3 anos de idade entre 16 de setembro e 31 de dezembro”.

De seguida, “e como forma de desempate em situação de igualdade”, as prioridades passam a ser “crianças com necessidades educativas específicas“; “filhos de mães e pais estudantes menores” e “crianças com irmãos ou com outras crianças e jovens, que comprovadamente pertençam ao mesmo agregado familiar, a frequentar o estabelecimento de educação e de ensino pretendido”.

As prioridades seguintes dizem respeito a beneficiários de ASE (Ação Social Escolar) “cujos encarregados de educação residam, comprovadamente, na área de influência do estabelecimento de educação e de ensino pretendido”, ou “cujos encarregados de educação desenvolvam a sua atividade profissional, comprovadamente, na área de influência do estabelecimento de educação e de ensino pretendido”. Depois posicionam-se os alunos sem este benefício, mas cujos encarregados de educação residam na área de influência do estabelecimento.

Por último, existem “outras prioridades e ou critérios de desempate definidos no regulamento interno do estabelecimento de educação e de ensino”. Já na renovação de matrícula é dada “prioridade às crianças que frequentaram no ano anterior o estabelecimento de educação e de ensino que pretendem frequentar, aplicando-se sucessivamente as prioridades definidas nos números anteriores”.

O mesmo tipo de prioridades é estabelecido no Artigo 11.º relativamente ao ensino básico, à exceção da prioridade dada a crianças filhas de pais estudantes menores e somado o critério de que “no ano letivo anterior tenham frequentado a educação pré-escolar ou o ensino básico no mesmo agrupamento de escolas” e alunos “mais velhos, no caso de matrícula, e mais novos, quando se trate de renovação de matrícula, à exceção de alunos em situação de retenção que já iniciaram o ciclo de estudos no estabelecimento de educação e de ensino”.

Acresce ainda a Portaria n.º 198/2022, de 27 de julho, que “regulamenta as condições específicas” relativamente à gratuitidade das creches e creches familiares. No Artigo 9.º determina-se que “os critérios de admissão e priorização para as vagas” são “os definidos no anexo à presente portaria, que dela faz parte integrante”.

Nesse anexo define-se que têm prioridade as crianças que “frequentaram a creche no ano anterior“, “com deficiência/incapacidade“, “crianças filhos de mães e pais estudantes menores, ou beneficiários de assistência pessoal no âmbito do Apoio à Vida Independente ou reconhecido como cuidador informal principal, ou crianças em situação de acolhimento ou em casa abrigo”, e “crianças com irmãos, que comprovadamente pertençam ao mesmo agregado familiar, que frequentam a resposta social”.

Seguem-se as crianças beneficiárias da prestação social Garantia para a Infância e/ou com abono de família para crianças e jovens (1.º e 2.º escalões), cujos encarregados de educação residam ou desenvolvam a atividade profissional, comprovadamente, na área de influência da resposta social.

Nas prioridades constam ainda “crianças em agregados monoparentais ou famílias numerosas“, cujos encarregados de educação residam ou desenvolvam a atividade profissional, comprovadamente, na área de influência da resposta social e crianças cujos encarregados de educação residam ou desenvolvam a atividade profissional, comprovadamente, na área de influência da resposta social.

Em nenhum dos pontos prioritários, tanto no Despacho Normativo n.º 10-B/2021 como na Portaria n.º 198/2022, está expresso que os alunos vindos do exterior têm prioridade sobre os restantes.

Em suma, a legislação não contempla qualquer prioridade relacionada com alunos estrangeiros. Há apenas a indicação de que o estabelecimento de educação pode definir no regulamento interno “outras prioridades e ou critérios de desempate”, mas tal não pressupõe que as escolas definam como critério prioritário a criança ser estrangeira ou filha de imigrantes.

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Avaliação do Polígrafo:

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