- O que está em causa?Faz perguntas relacionadas com a orientação sexual e com o histórico de namoro a crianças de 9 anos e está programada para ser entregue nas escolas, ou assim faz crer "tweet" de 26 de setembro. Esta "ficha sociodemográfica" tem, no entanto, pelo menos cinco anos e a docente responsável pela distribuição foi alvo de um processo disciplinar.

"E há quem ache isto bem. Colocar estas questões a crianças de nove anos. Ficha sociodemográfica? Ficha feita por um/a atrasado/a que se diz professor/a a quem não devia ser permitida esta 'merda'". O autor do "tweet" divulgado esta terça-feira (26) no X não poupou nas críticas a um documento que fez questão de partilhar, alegadamente entregue a alunos do 5.º ano a frequentar a disciplina de Educação para a Cidadania.
A "ficha sociodemográfica" tem pouco de elementos sociais e demográficos. Depois da idade, nacionalidade, escola que frequentam, ano e turma, o questionário pede aos alunos de nove anos que indiquem o seu "sexo/identidade de género" (uma resposta à qual os estudantes podem responder com "homem, mulher ou outro"). Depois, pede que as crianças selecionem por quem se sentem "atraídas": "homens, mulheres ou ambos."
https://twitter.com/Russowsky1959/status/1706473044783341767/photo/1
Entre estas duas perguntas, outras sobre o histórico de namoro dos alunos (se namoram ou se já namoraram). O questionário fotografado está cheio de pontos de interrogação e exclamação a vermelho, sobretudo nas questões que motivaram mais polémica nas redes sociais. Mas será autêntico? Onde foi distribuído? Quando? E o Ministério da Educação está a par?
Sim, a ficha é autêntica. Foi preenchida por uma turma do 5.º ano na Escola Básica Francisco Torrinha, no Porto, durante uma aula de Educação para a Cidadania. O caso remonta a 2018, ou seja, faz mais de cinco anos desde que foi amplamente noticiado em Portugal. Há três anos, o Polígrafo verificou pela primeira vez esta história, que tinha voltado às redes sociais como atual.
Começar por esclarecer que, além de antiga, a ficha sociodemográfica não foi elaborada pelo corpo docente da escola. Em 2018 a direção do estabelecimento de ensino alegou desconhecer o conteúdo do questionário e a distribuição do mesmo aos alunos. Maia tarde, as responsabilidade recaíram sobre a Associação Plano i, uma Organização Não-Governamental (ONG) que procura dar respostas a questões sociais como a desigualdade, a discriminação, a violência e a pobreza.
Ao Polígrafo, em 2020, fonte oficial da instituição remeteu esclarecimentos para um comunicado emitido dois anos antes. Segundo o documento, o inquérito em causa fazia parte de uma intervenção já habitual junto da escola, relacionada com a “prevenção da violência no namoro”, tema previsto no plano da disciplina de Educação para a Cidadania.
A Plano i esclareceu ainda que as fichas, que não recolhiam dados que permitissem identificar os alunos, foram validadas por vários investigadores e garantiu que nada foi executado à revelia do estabelecimento de ensino: "Todas as ações realizadas pela Associação Plano i com menores de idade são autorizadas (…) pelas respetivas direções das escolas. Os materiais são disponibilizados previamente a estas para aprovação, sendo prestados todos os esclarecimentos." Além disso, o documento deixava claro que os encarregados de educação tinham a possibilidade de escolher se os filhos participavam, ou não, na iniciativa.
A organização visada fez ainda saber que os dados recolhidos, ou seja, “a caracterização sociodemográfica”, tinham por objetivo a adaptação do programa de combate à violência no namoro às diferentes especificidades. Tudo porque, defendeu a Plano i, “processos como a identidade de género e a orientação sexual constroem-se desde a infância e influenciam o modo como determinados fenómenos sociais, nomeadamente no âmbito da vitimação, são geridos”.
À data, vários especialistas e a associação de pais da escola defenderam que o questionário era "desadequado" à idade das crianças a que foi entregue. Porém, o organismo que representa os encarregados de educação defendeu que o tema educação para a igualdade de género estava “previsto no programa, no âmbito da estratégia nacional para a cidadania” e considerou que a proporção que o caso tomou era “ainda mais desadequada do que o próprio inquérito”, uma vez que “não feria suscetibilidades”.
O caso foi entregue à Inspeção-Geral da Educação e Ciência e esta apurou que a ficha foi entregue aos alunos pela professora da disciplina à revelia da direção da escola. A averiguação terminou “com a instauração de um processo disciplinar a uma docente e o sancionamento posterior da mesma”, de acordo com uma nota enviada ao Polígrafo pelo Ministério da Educação.
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Avaliação do Polígrafo:
