“E no nosso Portugal, protestos muçulmanos por melhores condições“, indica-se num tweet publicado no dia 3 de setembro em que se apela a que, “se alguém souber”, possa traduzir, já que o idioma dos gritos de ordem que se ouvem não é português.
A acompanhar a alegação, é partilhado um vídeo, de curta duração, em que se vêem vários indivíduos, três deles vestidos com coletes refletores amarelos, com a bandeira do Banglandesh e vários cartazes erguidos.
Mas será este um protesto de reivindicação por “melhores condições” em Portugal?
O vídeo tem origem numa conta de TikTok e foi publicado originalmente a 19 de julho, ou seja, há mais de um mês. No mesmo dia foram partilhados outros três vídeos referentes ao mesmo evento e todos com referências, através das hashtags, aos estudantes do Bangladesh, que apelavam à demissão de Sheikh Hasina, Primeira-Ministra do país até agosto deste ano (demitiu-se a 5 de agosto e abandonou o país).
Não há qualquer evidência que indique que o protesto tenha tido como propósito reivindicar “melhores condições”. O que se entende é que se tratou de um protesto de solidariedade pelo movimento estudantil do Bangladesh.
É também isto que afirma uma outra publicação, partilhada a 19 de julho, no Facebook, na página “Portugal Bangla TV“. Na descrição do post indica-se que o protesto aconteceu “em solidariedade com os estudantes de Bangladesh” que “contarão com o apoio dos emigrantes [bengali] de todo o mundo”.
No início de julho, vários protestos estudantis eclodiram no Bangladesh contra o sistema de quotas de admissão profissionais, que favoreciam elites como os descendentes dos combatentes da guerra de libertação do Bangladesh em 1971. As manifestações acabaram por se tornar violentas resultando em pelo menos seis mortos no dia 16 de julho (três dias antes deste protesto em Lisboa) e escalando até quase 300 mortos no início de agosto.
Esses mesmos protestos exigiam a demissão da então Primeira-Ministra, Sheikh Hasina, que tinha conquistado o quarto mandato consecutivo em janeiro e que foi alvo das contestações dos estudantes.
Ao Polígrafo, Jayanti Dutta, docente e investigadora do Centro de Literaturas e Culturas Lusófonas e Europeias (CLEPUL) da Universidade de Lisboa, explicou que o protesto em causa partilhado nas redes sociais era contra Sheikh Hasina e que ninguém no vídeo está a “exigir ‘melhores condições’ cá em Portugal”. Aliás, uma das frases mais repetidas é precisamente “vergonha para Sheikh Hasina”.
“Há ainda uma palavra que se repete várias vezes: ‘Rajakar’. Esta palavra vem do urdu e significa voluntário. Quando os bengalis lutavam pela independência contra o Paquistão, os rajakares (também bengalis) eram contra a independência e ajudaram o exército do Paquistão”, explica a investigadora. Em conclusão, Dutta aponta que “provavelmente estas pessoas apoiam rajakares e são contra Sheikh Hasina”, e que o protesto “não tem nada a ver com Portugal”.
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Avaliação do Polígrafo: