“O Estado, claro, diz que os proprietários têm que fazer o seu papel. Os proprietários, sempre os proprietários, a velha obsessão da extrema-esquerda em acabar com tudo o que ainda tem propriedade em Portugal. Só que esquecem o essencial: é que 60% dos terrenos que não são limpos são terrenos do próprio Estado. Onde é que está essa responsabilidade, senhor primeiro-ministro, e onde é que está a responsabilidade do Governo”, afirmou ontem André Ventura, deputado e líder do partido Chega, na sua última intervenção no debate sobre o “Estado da Nação”.
A percentagem indicada por Ventura tem sustentação factual?
Importa desde logo salientar que, de acordo com as regras em vigor de limpeza dos terrenos, o Estado, como proprietário, também tem obrigações a cumprir nesse âmbito, tal como os proprietários privados. Não são obrigações exclusivas dos proprietários privados.
Por outro lado, de acordo com os últimos dados do Eurostat, serviço de estatística da União Europeia, o facto é que Portugal é o país da União Europeia que apresenta a maior percentagem de área florestal com propriedade privada, 97%, ao passo que a propriedade pública corresponde a apenas 3%.
Estima-se, aliás, que existam entre 200 mil a 400 mil proprietários privados de área florestal em Portugal, além de cerca de 20% sem proprietário conhecido.

Na vizinha Espanha, por exemplo, 70,8% da área florestal tem propriedade privada. Na Itália, outro país do Sul da Europa muito fustigado por incêndios rurais, essa percentagem cifra-se em 66,4%. No extremo oposto da tabela destacam-se países como a Bulgária (12,1% de propriedade privada) ou a Polónia (18,1%).
Outro elemento a ter em conta é que, de acordo com as últimas estimativas, apenas cerca de 20% da área florestal em Portugal dispõe de um plano de gestão. Mais, os dados apurados não indicam uma relação direta entre o tipo de propriedade – floresta pública ou privada – e a respetiva gestão. Ou seja, não é por ser pública ou privada que tem uma maior ou menor gestão, ou pelo menos não são identificadas diferenças significativas.
De resto, não encontramos quaisquer dados que sustentem a alegação de que “60% dos terrenos que não são limpos são terrenos do próprio Estado“, nem no Instituto Nacional de Estatística (INE), nem no Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), entre outras fontes primárias.
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