“Não podem alterar a fachada nunca, é património. Arquiteto: ’tá'”, lê-se numa publicação que tem circulado nos últimos dias no Facebook com a indicação de que a fotografia foi captada na Figueira da Foz. A alegação é acompanhada de uma imagem de um edifício moderno em tons de branco e cinzento com uma fachada cor-de-rosa, de aspeto mais clássico e com uma abertura para a entrada de carros para a garagem, colocada à frente do prédio.
A mesma imagem é partilhada no X com os seguintes comentários em tom crítico: “passei a ser favorável à pena de morte” e “bom dia, pós-modernos”. O tweet de 13 de junho lançou uma onda de comentários negativos à obra criticando a autarquia por autorizar este tipo de obra e questionando como foi possível. Entre estes comentários, surge também uma pista: a de que aquele edifício se encontra na Rua Joaquim Sotto Mayor, na Figueira da Foz.
Confirma-se? E é verdade que a autarquia da Figueira da Foz autorizou a colocação desta fachada frente a um edifício novo?
Através do Google Maps verifica-se que, nas últimas imagens disponíveis do local, em 2020, não existia naquele espaço nenhum edifício ou fachada. Existia um espaço vazio com alguma vegetação já evidente. Recuando às imagens de 2019, é visível o mesmo espaço vazio, mas sem vegetação e com alguma gravilha.
Já em 2014 o cenário era diferente. No local encontrava-se uma construção antiga, coberta com azulejos semelhantes aos que surgem na nova fachada e visivelmente degradada com sinais de abandono ou falta de manutenção.
Após a análise das imagens, o Polígrafo contactou a Câmara Municipal da Figueira da Foz (CMFF), solicitando um esclarecimento sobre a referida obra. Em resposta, a autarquia refere que o pedido de licenciamento “deu entrada nos serviços em 5 de fevereiro de 2018” e, portanto, antes do atual executivo que iniciou funções em 2021.
“Em simultâneo, deu entrada o pedido de demolição da totalidade dos edifícios existentes no prédio, tendo sido realizada vistoria com o objetivo de avaliar o estado de conservação estrutural dos edifícios e a qualidade arquitetónica do mesmo, nos termos do n.º 2 e no n.º 3 do artigo 91.º do regulamento do Plano Diretor Municipal (PDM) da Figueira da Foz”, acrescenta a autarquia liderada por Pedro Santana Lopes.
Perante o relatório da comissão de vistorias, realizado no dia 27 de fevereiro de 2018, foi decidida a “demolição total dos edifícios existentes, atendendo ao estado de degradação de todo o conjunto edificado e tendo em consideração o agravamento do estado da estrutura do edifício principal e anexos”. De acordo com a autarquia, a comissão entendeu que o edifício principal “apresentava perigo para a saúde pública e segurança das pessoas, podendo o edifício principal e anexos ser demolidos na totalidade”.
A demolição foi então concretizada, mas com a salvaguarda dos “azulejos do friso superior para posterior recolocação na nova fachada”, que foram retirados no âmbito do parecer da Divisão da Cultura com o fim de “reintegração dos azulejos íntegros na nova construção ou ser os mesmos entregues para conservação no Museu Municipal da Figueira da Foz”.
O parecer, refere a CM da Figueira da Foz, vai ao encontro do regulamento do PDM da Figueira da Foz, que obriga a que “em situações de demolição parcial e de demolição total para posterior reconstrução, quando se considerar que na fachada ou no interior do edifício existem elementos decorativos que importa salvaguardar“, deve estar prevista a “reintegração e/ou a adequada conservação por entidade competente” destes elementos.
Em conclusão, a “fachada original foi demolida“, mas foi apresentado um projeto de arquitetura que “previu a reconstituição da fachada e dos seus elementos, incluindo a colocação dos azulejos existentes, propondo o corpo do edifício na continuidade da fachada a reconstituir”. O projeto “obteve deferimento final no dia 30 de abril de 2019, tendo sido emitido o respetivo alvará de obras no dia 16 de outubro de 2019”.
Por isso, o Polígrafo opta pela classificação “Verdadeiro, mas”, uma vez que a imagem é verdadeira mas carece de enquadramento e contexto. Além de se tratar de um projeto que salvaguardou os azulejos que integravam a antiga construção, as decisões que resultaram nesta obra remontam ao anterior mandato da autarquia.
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Avaliação do Polígrafo: