No contexto da controvérsia sobre a anulação do corte de 5% nos salários dos políticos que vigorava desde 2010, numa publicação de 30 de novembro no Facebook defende-se que “não deveria ser permitido a nenhum Governo mexer nos ordenados dos políticos – seja por reposição de cortes ou quaisquer outros motivos – sem primeiro repor os cortes dos enfermeiros, oficiais de justiça, professores, polícias e outras carreiras públicas, bem como cortes de outros benefícios à população em geral”.
Posto isto, sublinha-se também que “deveria ser proibido aos Governos aumentar a idade da reforma da população sem aumentar, também, a cada mexida, a idade de reforma dos políticos que é dada ao fim de apenas 15 anos de atividade política. Não me venham dizer que os políticos ganham mal quando podem acumular reformas adquiridas ainda em idade ativa, acumulável com outras atividades profissionais, sem falar nas inúmeras regalias que aumentam consideravelmente o salário”.
Começando pela alegação de que os Governos aumentam a idade da reforma da população. É verdade que a idade da reforma em Portugal deverá subir para os 66 anos e nove meses em 2026, um aumento de dois meses em relação ao que estará em vigor no ano de 2025. Mas não se trata de uma decisão política.
O valor provisório da esperança de vida aos 65 anos, apurado anualmente pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), é divulgado em novembro servindo de referência para efeitos de determinação da idade normal de acesso à pensão de velhice do regime geral de Segurança Social e do factor de sustentabilidade a aplicar ao montante estatutário das pensões de velhice do regime geral de Segurança Social.
O aumento da idade da reforma advém do aumento da esperança média de vida, um elemento integrado no factor de sustentabilidade. O factor de sustentabilidade é um mecanismo de cálculo, criado em 2008, com o objetivo de fazer refletir o aumento da esperança média de vida na idade de acesso à reforma sem penalizações.
Ou seja, todos os anos procede-se a um cálculo do fator de sustentabilidade para determinar se a idade de acesso à reforma aumenta, diminui ou permanece inalterada, de acordo com a evolução da esperança média de vida nos últimos anos. Esse mecanismo de cálculo está previsto na lei desde 2008, pelo que o aumento de dois meses não se deveu a uma alteração da lei por parte do atual Governo liderado por Luís Montenegro. É uma atualização como que automática, prevista na lei.
Quanto ao suposto aumento do vencimento dos deputados, na realidade trata-se da revogação de um corte de 5% que estava em vigor desde 2010.
No âmbito das votações na especialidade de alterações à proposta de Orçamento do Estado para 2025 foi aprovada uma iniciativa do PSD (com votos favoráveis dos deputados do PSD, CDS-PP, PS e PAN) que anula esse corte de 5% no vencimento dos titulares de cargos políticos a partir de janeiro de 2025.
Claramente falsa é a alegação de que os políticos têm direito a reforma “ao fim de apenas 15 anos de atividade”.
Na realidade, aos deputados e outros cargos políticos aplicam-se as mesmas regras (de acesso à pensão de velhice) que a população em geral, desde logo o número de anos de atividade e a idade normal de acesso.
Subvenções vitalícias foram revogadas em 2005
Ressalve-se que beneficiavam de subvenções vitalícias (distintas de pensões de velhice), mas esse regime já foi revogado.
Entre 1985 e 2005, os governantes e deputados (e também os juízes do Tribunal Constitucional) tiveram direito a uma subvenção vitalícia a partir do momento em que completaram 8 ou 12 anos de exercício dos cargos (consecutivos ou interpolados), independentemente da respetiva idade.
A subvenção mensal vitalícia é calculada à razão de 4% do vencimento base por ano de exercício, correspondente à data da cessação de funções em regime de exclusividade, até ao limite de 80%. A subvenção vitalícia pode ser acumulada com outras pensões e rendimentos. É paga através da Caixa Geral de Aposentações.
Em 2005, por iniciativa do Governo então liderado por José Sócrates, o direito à subvenção vitalícia foi revogado. Mas sem efeitos retroativos e criando um regime transitório. Ou seja, quem já recebia, continuou a receber. E quem já tinha direito à subvenção vitalícia até ao momento de revogação em 2005 (isto é, quem já tinha completado 8 ou 12 anos de exercício de cargos), ainda poderia requerer a mesma, nos anos seguintes.
Assunção Esteves era ex-juíza do Tribunal Constitucional
Além das subvenções vitalícias, o equívoco poderá ter origem no caso polémico de Assunção Esteves, ex-deputada do PSD e Presidente da Assembleia da República que se reformou aos 42 anos de idade. Beneficou de um regime que possibilita aos juízes do Tribunal Constitucional aposentarem‑se com 12 anos de serviço, independentemente da idade, ou aos 40 anos de idade e 10 anos de serviço.
Ou seja, um privilégio dos juízes do Tribunal Constitucional, não dos políticos.
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Avaliação do Polígrafo: