A vacinação em massa contra a Covid-19 em Portugal e na União Europeia iniciou-se com a vacina da Pfizer. No entanto, tanto a Pfizer como a AstraZeneca e a Moderna já avisaram que poderão ocorrer atrasos ou perturbações na distribuição das vacinas. Sendo necessária uma segunda dose de vacina para garantir a imunidade, seria possível combinar diferentes vacinas? Isto é, administrar uma segunda dose de vacina diferente da primeira dose?

Questionado pelo Polígrafo, João Gonçalves, diretor do Instituto de Investigação do Medicamento, sublinha que a teoria e a prática não coincidem nesta matéria. "Tecnicamente podem ser combinadas. Existe a experiência na vida real de misturar diferentes vacinas, de diferentes fabricantes, com o objetivo de estimular a proteção contra diferentes infeções. No entanto, na prática isso não deve acontecer".

Segundo Gonçalves, as vacinas aprovadas "utilizam o mesmo antigénio do coronavírus para estimular a imunidade", ou seja, a mesma amostra isolada do vírus. Porém, "como são feitas por diferentes tecnologias, é mais aconselhável estudar antes e depois aprovar estas misturas", algo que ainda não está a acontecer.

"A regulamentação de aprovação pelas autoridades regulamentares da vacina da Pfizer e da Moderna - e posteriormente a da AstraZeneca - foi baseada em estudos de segurança e eficácia de desenvolvimento de imunidade com duas doses da mesma vacina. Sabemos quantificar essa imunidade através destes estudos. Com duas vacinas de diferentes fabricantes não sabemos quantificar a proteção das pessoas e o grau de segurança", explica Gonçalves, professor de Microbiologia e Imunologia na Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa. 

Por outro lado salienta que a vacina da Pfizer "utiliza tecnologia de mRNA (ARNm em português) que introduz no corpo uma sequência de código que contém as instruções genéticas, para que as próprias células da pessoa vacinada possam produzir o antigénio viral da espicula viral e gerar uma resposta imunológica". Enquanto a vacina da AstraZeneca "utiliza a tecnologia de vacina mais padronizada, introduzindo o gene do coronavírus nas células humanas através de um adenovírus de macaco que não se replica para produzir proteína da espicula do SARS-Cov2 e produzir uma resposta imunitária". 

Autoridades norte-americanas e britânicas aprovam

Esta possibilidade, ainda que sem testes realizados, já está a ser viabilizada pelas autoridades de Saúde em vários países. No mais recente guia de práticas para a Covid-19 do Reino Unido encontra-se classificada como "razoável" a possibilidade de inoculação com doses de vacinas diferentes, referindo-se às vacinas da Pfizer e da AstraZeneca, aprovadas no Reino Unido. 

"Para os indivíduos que iniciaram a vacinação e que compareceram para a segunda dose num local onde a mesma vacina não está disponível, ou se o primeiro produto recebido for desconhecido, é razoável administrar uma dose do produto disponível nesse local. Esta opção é preferível se o indivíduo estiver em alto risco imediato ou se considere improvável que compareça novamente. Nessas circunstâncias, visto que ambas as vacinas são baseadas na proteína spike, é provável que a segunda dose ajude a aumentar a resposta à primeira dose", recomenda-se no documento.

Em linha com esta decisão, nos EUA, o Centro para o Controlo e Prevenção de Doenças (CDC) acrescentou também à sua lista de recomendações que embora a vacina da Pfizer e da Moderna não sejam "permutáveis entre si ou com outras vacinas Covid-19", tal poderia ser feito em "situações excepcionais". 

"Em situações excepcionais em que a vacina de primeira dose não pode ser determinada ou não está mais disponível, qualquer vacina de ARNm disponível pode ser administrada num intervalo mínimo de 28 dias entre as doses para completar a série de vacinação de ARNm COVID-19", indica o CDC, estabelecendo como obrigatório que as vacinas sejam da mesma tecnologia.

Pode assim concluir-se que, em teoria, as diferentes vacinas para a Covid-19 possam ser combinadas na altura da inoculação, com o paciente a levar a primeira dose de uma e a segunda dose de outra. No entanto, esta prática ainda não foi amplamente testada, nem aprovada pela OMS. Países como os EUA ou o Reino Unido viabilizam essa hipótese, mas como medida excepcional.

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Avaliação do Polígrafo:

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