A 28 de novembro, o ministro da Educação, Fernando Alexandre, reconheceu, uma semana depois de sublinhar a queda de 89% no número de alunos que não tinha aulas a pelo menos uma disciplina, em comparação com o ano passado, que os números afinal, não estavam corretos. Segundo a deputada socialista Mariana Vieira da Silva, este é apenas um dos casos em que o Governo teve de corrigir dados que apresentou, em várias áreas distintas.
No X (antigo Twitter), a deputada referiu que, “em 9 meses, o Governo já teve de reconhecer ter dado números que afinal estavam errados na descida do IRS, nas cirurgias oncológicas, nas licenças de parentalidade, no orçamento do SNS, nas pensões e nos alunos sem professor”. Será verdade?
Descida prometida do IRS
No primeiro dia de discussão do Programa do Governo, a 11 de abril, Luís Montenegro anunciou uma descida de IRS global “de cerca de 1500 milhões de euros (…) face ao ano passado”.
Em entrevista à RTP, no dia seguinte, o ministro das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento, esclareceu que os 1500 milhões “face ao ano passado” incluíam, na verdade, a descida de 1327 milhões que já estava em vigor. Em rigor, a nova redução do IRS rondava os 200 milhões.
Em comunicado, a Presidência do Conselho de Ministros sublinhou que, efetivamente, a afirmação de Luís Montenegro na apresentação do Programa do Governo foi “factualmente verdadeira e indesmentível”. E foi, até porque Montenegro disse que o a descida era “face ao ano passado”. No entanto, aquando do anúncio do Primeiro-ministro, ficaram a pairar dúvidas sobre a dimensão do corte fiscal, o que motivou o esclarecimento do ministro das Finanças.
Número de cirurgias oncológicas realizadas
Na apresentação do Plano de Emergência e Transformação na Saúde, o Governo contava que em abril de 2024 havia 9374 doentes oncológicos com um tempo de espera por cirurgia superior aos TMRG [tempos máximos de resposta garantidos].
Porém, este número foi, como noticiou a Lusa e o Diário de Notícias, corrigido uns meses depois pela Direção Executiva do Serviço Nacional de Saúde. Afinal, eram 2654. O número inicialmente indicado, os 9374 doentes, correspondia ao total de doentes oncológicos a aguardar cirurgia no final de abril.
Custo das licenças de parentalidade
No início de outubro, de acordo com um ofício enviado ao presidente da Assembleia da República e ao qual o Observador e o Público tiveram acesso, o Governo apontava que a aprovação do alargamento da licença parental acarretaria uma “despesa estimada de 400 milhões de euros”.
A 13 de novembro, o ministro dos Assuntos Parlamentares, Pedro Duarte, citado pelo Público, disse que o custo da medida em 2025 se estimava “num intervalo entre os 228 milhões de euros e os 404 milhões de euros”. O primeiro cenário é mais conservador, mantendo constantes todas as outras variáveis, ao contrário do segundo, que inclui “efeitos comportamentais” e de “segunda ordem”, como escreveu o jornal diário.
Maria do Rosário Ramalho, ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, já tinha mencionado o número de 230 milhões para o custo da medida, noticiou o Observador. Também indicando o valor como a estimativa “mais conservadora”.
Neste caso, o que aconteceu foi um esclarecimento sobre os possíveis custos da medida. Não houve propriamente a substituição de um valor apresentado por um outro, mas o alargamento do intervalo dentro do qual pode ficar o custo da medida.
Orçamento do SNS
Na primeira nota explicativa do Orçamento do Estado para a saúde em 2025, como escreveu o Público, o Governo indicou “por lapso” que o saldo da Conta Consolidada do SNS estimado para 2025 seria positivo, na ordem dos 1,2 milhões de euros.
O número foi corrigido numa nova nota explicativa, que passou a prever um saldo negativo de 217,2 milhões de euros, “como resultado da estimativa de aumento de despesa ainda não totalmente quantificada, pela reforma dos SNS iniciada em 2024 com a extinção das ARS [Administrações Regionais de Saúde] e a criação das ULS [Unidades Locais de Saúde], nomeadamente nas principais rubricas de pessoal, medicamentos e restantes aquisições de bens e equipamentos”.
Pensões
A 15 de novembro, a ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social estimava que as pensões mais baixas e o Indexante de Apoios Sociais deveriam aumentar 3,1%. No entanto, a estimativa do Governo, segundo o Público, foi calculada com base na taxa média de inflação harmonizada e não com a inflação calculada pelo INE para Portugal, que é a utilizada na fórmula prevista na lei.
Como noticiou o mesmo jornal e o Jornal de Negócios, os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) apontam para um aumento de 2,6% (sem contar os 1,25 pontos percentuais adicionais da medida do PS) na maioria das pensões, um valor inferior ao inicialmente indicado pelo Governo.
A 29 de novembro, em declarações ao Jornal de Negócios, uma fonte oficial do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social afirmou que “a fórmula de atualização será clarificada com a publicação da portaria em meados de dezembro”.
Número de alunos sem aulas a pelo menos uma disciplina
A 22 de novembro, um dia depois de o Expresso ter noticiado que o número de alunos sem aulas a pelo menos uma disciplina desde o início do ano tinha caído 90% em relação ao ano passado, o Governo fez uma publicação no seu site oficial a dar conta dos números.
“2.338 alunos dos Ensinos Básico e Secundário estão sem aulas a uma disciplina desde o início das aulas, menos 89% do que no ano letivo passado, afirmou o Ministro da Educação, Ciência e Inovação, Fernando Alexandre”, podia ler-se na página, que agora não está disponível, mas pode ser acedida através do Wayback Machine. No ano passado, de acordo a publicação, “houve 20.887 alunos sem aulas a uma disciplina durante todo o 1.º período”.
No entanto, uns dias mais tarde, ao Expresso, o Ministério da Educação, Ciência e Inovação admitiu “não existir fiabilidade na informação prestada pelos serviços sobre o ano letivo de 2023/24, colocando em causa o rigor de todos os dados que têm vindo a público”.
Em suma, há pelo menos dois casos (descida do IRS e licenças de parentalidade) em que não foram divulgados dados “errados”, mas sim ligeiramente enganadores. Nos restantes exemplos, Mariana Vieira da Silva está correta.
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Avaliação do Polígrafo: