"Acabou a época de monitorização 2020/2021 na Gronelândia. O 'Balanço de Massa à Superfície' foi superior à média de 1981-2010, apesar das notícias apocalípticas e catastróficas sobre os eventos de derretimento 'sem precedentes'", alega o autor de uma publicação que está a circular no Facebook desde 2 de setembro.

No mesmo post são incluídos dois gráficos que supostamente demonstram essa melhoria, contudo não apresentado nenhum enquadramento ou legenda para as imagens.

Confirma-se que o derretimento da camada de gelo da Gronelândia abrandou?

O Polígrafo contactou Francisco Ferreira, presidente da Zero - Associação Sistema Terrestre Sustentável, que denotou algumas imprecisões na publicação.

"De acordo com o relatório do 'Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas' recentemente apresentado, em agosto deste ano, e que constitui o documento científico mais credível nesta matéria, as coberturas de gelo da Gronelândia e da Antártica estão a diminuir, assim como a grande maioria dos glaciares em todo o mundo, contribuindo fortemente para o aumento observado do nível do mar. O derretimento das coberturas de gelo na Gronelândia e na Antártica contribuiu com cerca de 13% e 7%, respetivamente, durante 1971-2018, mas o derretimento acelerou nas últimas décadas, aumentando a sua contribuição para 22% e 14% desde 2016", começou por explicar.

"De acordo com o relatório do 'Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas' recentemente apresentado, em agosto deste ano, e que constitui o documento científico mais credível nesta matéria, as coberturas de gelo da Gronelândia e da Antártica estão a diminuir, assim como a grande maioria dos glaciares em todo o mundo, contribuindo fortemente para o aumento observado do nível do mar".

O ambientalista esclarece que "as coberturas de gelo da Gronelândia e da Antártica estão já lentamente a responder mudanças recentes no clima, mas o tempo para que estas enormes massas de gelo se ajustem às mudanças na temperatura global é ainda longo", ou seja, "todos os efeitos do aquecimento do clima podem levar centenas ou milhares de anos para se manifestarem".

"O relatório considera que é muito provável que a influência humana tenha contribuído para o derretimento observado da superfície do manto de gelo da Gronelândia nas últimas duas décadas. A perda contínua de gelo ao longo do século XXI é virtualmente certa para a camada de gelo da Gronelândia. Há grande confiança de que a perda total de gelo do manto de gelo da Gronelândia aumentará com as emissões cumulativas de gases com efeito de estufa", refere.

Francisco Ferreira afirma que "a aceleração na perda de massa passou de positiva em 2000-2010 para negativa em 2010-2018 devido a uma série de verões frios, o que ilustra a dificuldade de extrapolar registos curtos em tendências de longo prazo. O ritmo a que a perda de massa de gelo, que se deu entre 2000 e 2010, passou depois a continuar a ocorrer a um ritmo médio menor entre 2010 e 2018 apesar de 2011 e 2012 terem sido anos recordes. Contudo, 2019 voltou a ser um ano recorde de perda rápida de gelo".

Francisco Ferreira afirma que "a aceleração na perda de massa passou de positiva em 2000-2010 para negativa em 2010-2018 devido a uma série de verões frios, o que ilustra a dificuldade de extrapolar registos curtos em tendências de longo prazo.

Assim, a publicação carece de vários contextos. Segundo o presidente da Zero, "o degelo da Gronelândia envolve uma análise de todo um vasto conjunto de variáveis que no total conduzem à conclusão clara que o 'Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas' (IPCC) publicou há semanas e que confirma que tal está a acontecer e com implicações na subida do nível do mar à escala global".

"Analisar-se os dados apenas do balanço de massa à superfície (SMB) como sendo o fator único ou principal do derretimento do gelo está errado porque tal representa apenas um terço do fenómeno, sendo o principal determinante a dinâmica dos glaciares", garante. (ndr: ver Nota Editorial 2 a este propósito).

"Analisar-se os dados apenas do balanço de massa à superfície (SMB) como sendo o fator único ou principal do derretimento do gelo está errado porque tal representa apenas um terço do fenómeno, sendo o principal determinante a dinâmica dos glaciares", garante.

Por fim, "​​comentar o valor de um ano não tem significado; é natural observarem-se oscilações ano a ano e houve efetivamente períodos com uma desaceleração do ritmo de degelo traduzido pelo balanço de massa à superfície (SMB) como é o caso de 2020-21; porém, uma desaceleração desse fator é diferente de um balanço positivo de formação de gelo e isso em média não tem acontecido", informa.

Em suma, apesar de o balanço de massa à superfície traduzir uma desaceleração do degelo na Gronelândia, Francisco Ferreira alerta que é errado analisar-se esse dado como único, nem se deve extrapolar para um contexto de longo prazo.

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Nota Editorial: este conteúdo foi selecionado pelo Polígrafo no âmbito de uma parceria de fact-checking (verificação de factos) com o Facebook, destinada a avaliar a veracidade das informações que circulam nessa rede social.

Nota Editorial 2: Depois da publicação deste fact-check, o Polígrafo foi abordado pelo autor da publicação, que garantiu não ser um negacionista ambiental e nunca ter tido a intenção de disseminar dúvidas relacionadas com os perigos do aquecimento global. De tal modo que se disponibilizou a atualizar o seu post no sentido de lhe acrescentar informação adicional susceptível de inibir a instrumentalização do seu conteúdo por parte de grupos ligados a ideais negacionistas. Por esse motivo - e seguindo as boas práticas que nos norteiam desde o primeiro dia - decidimos alterar a avaliação de Descontextualizado para Verdadeiro.

Na escala de avaliação do Polígrafo, este conteúdo é:

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