"A nova norma de cibersegurança no país contra a publicação de conteúdos subversivos na Internet. O decreto tem gerado críticas de cidadãos e ativistas internacionais de direitos humanos, que já falam em 'lei da mordaça'. O novo quadro regulamentar das telecomunicações do país determina que 'tentar alterar a ordem pública' ou 'promover a indisciplina social' por meio das tecnologias de informação e comunicação é um 'incidente de agressão', pode ler-se na publicação, partilhada a 21 de agosto.

O Polígrafo verifica.

Um mês depois dos protestos em Cuba, o Governo aprovou o Decreto n.º35 que regulamenta a utilização da Internet e das redes sociais. O documento de 78 páginas, aprovado em Conselho de Estado a 17 de agosto, sublinha logo no início que "o Estado Cubano tem o direito irrenunciável e soberano de regulamentar as telecomunicações e as tecnologias de informação e comunicação (TIC), as quais desempenham um papel significativo no desenvolvimento político, económico e social do nosso país e constituem um meio efetivo para a consolidação das conquistas do socialismo e bem-estar do povo cubano".

O decreto determina que os servidores de Internet devem cortar o acesso a quem "espalhar notícias falsas ou prejudicar a imagem do Estado". É proibida a "difusão através das infraestruturas, plataformas ou serviços de telecomunicações/TIC de conteúdos que atentam contra os preceitos constitucionais, sociais e económicos do Estado, incitam a mobilizações ou outros atos que alterem a ordem pública; difundam mensagens que fazem apologia de violência, acidentes de qualquer tipo que afetem a intimidade e dignidade das pessoas", pode ler-se.

O decreto classifica ainda de ciberterrorismo ações "cuja finalidade é subverter a ordem constitucional, ou suprimir ou desestabilizar gravemente o funcionamento das instituições políticas e de comunicação social, as estruturas económicas e sociais do Estado, ou obrigar os poderes públicos a realizar uma ação ou a abster-se de o fazer. Alterar gravemente a paz pública. Desestabilizar gravemente o funcionamento de uma organização internacional. Provocar um estado de terror na população ou em parte desta".

No Twitter, a 18 de agosto, o presidente cubano Miguel Díaz-Canel elogiou o decreto que considera ser "contra a desinformação e as mentiras cibernéticas".

Já o vice-ministro das Comunicações, Ernesto Rodríguez Hernández, afirmou que as novas normas "promovem o avanço da informatização da sociedade, defendendo os direitos dos cidadãos consagrados na Constituição: igualdade, privacidade e sigilo das comunicações". Um outro vice-ministro das Comunicações, Wilfredo González, disse à agência France Presse (AFP) que a norma pretende que "ninguém seja capaz de distorcer a verdade, para que ninguém possa depreciar um funcionário do nosso país ou do nosso processo revolucionário".

A nova lei de cibersegurança do país, em vigor há uma semana, provocou de imediato reações e críticas de cidadãos cubanos e ativistas internacionais de direitos humanos que consideram o decreto uma forma de reprimir a dissidência política. A norma surge numa altura tensa em Cuba depois de, a 11 de julho, milhares de pessoas terem protestado contra o Governo para pedir o fim da ditadura de décadas e exigir alimentos e vacinas contra a Covid-19.

Os críticos da norma chamam-lhe "a lei da mordaça", pois o decreto classifica a disseminação de informações falsas com a intenção de subverter a ordem constitucional como um delito passível de processo criminal e cria o Escritório de Segurança de Redes Informáticas (OSRI, na sigla em espanhol) para receber denúncias.

"É grave pelo que diz e pelo momento em que está a ser publicada, um mês depois dos protestos, quando a comunidade internacional esperava mais um passo para ouvir a população e não para reprimir mais o discurso. Por um lado, os direitos humanos dos cidadãos não são reconhecidos, a liberdade de expressão não é reconhecida. E, por outro, o que os cidadãos podem ou não publicar na Internet é visto a partir de uma perspetiva criminosa e de guerra", afirmou à BBC News Mundo Pedro Vaca, relator especial para a liberdade de expressão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos.

Nas redes sociais, multiplicam-se os memes sobre o tema.

Laritza Diversent, diretora da consultoria jurídica independente Cubalex, especializada em questões de direitos humanos, sublinha à BBC News Mundo que as redes sociais são atualmente o único espaço que os cubanos têm para se queixar, manifestar ou organizar, algo que se tornou mais evidente com a pandemia e com os protestos de julho.

Durante os protestos, o regime cortou a Internet e plataformas como o WhatsApp, Facebook, Instagram e Telegram funcionaram com instabilidade. Com o novo decreto, a Etecsa — empresa estatal que detém o único servidor de Internet em Cuba — fica legalmente autorizada a cortar a Internet quando o governo considerar conveniente, impor multas, confiscar cartões SIM ou telefones da população.

"O que eles estão a propor agora não é novidade. É algo que já era feito com artistas e dissidentes. Agora ganhou um apoio jurídico. Faz parte de um sistema jurídico que está a estruturar-se desde o momento em que se começou a dar acesso à Internet para a população e que valoriza a ideologia como alicerce da cibersegurança", alerta Laritza Diversent.
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Nota editorial: este conteúdo foi selecionado pelo Polígrafo no âmbito de uma parceria de fact-checking (verificação de factos) com o Facebook, destinada a avaliar a veracidade das informações que circulam nessa rede social.

Na escala de avaliação do Facebook, este conteúdo é:

Verdadeiro: as principais alegações do conteúdo são factualmente precisas; geralmente, esta opção corresponde às classificações "Verdadeiro" ou "Maioritariamente Verdadeiro" nos sites de verificadores de factos.

Na escala de avaliação do Polígrafo, este conteúdo é:

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