A revelação partiu do próprio Primeiro-Ministro no debate de política geral de quarta-feira, 24 de maio. "Se eu disse de alguma forma que tinha informado o senhor Presidente da República sobre a intervenção do SIS, aproveito a sua pergunta para corrigir imediatamente. Eu nunca informei o senhor Presidente da República sobre a intervenção do SIS, que fique claro", garantiu Costa em resposta a André Ventura, líder do Chega.

Antes, já tinha sido questionado por Joaquim Miranda Sarmento sobre ter ou não informado Marcelo Rebelo de Sousa, mas foi na resposta a Ventura que clarificou o assunto. Costa reiterou que não teve conhecimento prévio e muito menos deu autorizou à intervenção do SIS. Deizxou também assente que quando relatou a Marcelo os incidentes que tinham ocorrido no ministério das Infraestruturas na noite de 26 de abril - supostas agressões que envolveram um adjunto demitido pelo ministro e quatro funcionárias, o Primeiro-Ministro omitiu a Marcelo que a história tinha ido ao ponto de incluir uma intervenção do SIS para recuperar o computador de serviço de Frederico Pinheiro.

Mas será que António Costa deveria ter informado Marcelo Rebelo de Sousa sobre a atuação dos serviços de informação portugueses?

Na Lei Quadro do Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP) dispõe-se, no artigo 17º, que compete ao Primeiro -Ministro "manter especialmente informado o Presidente da República acerca dos assuntos referentes à condução da atividade do SIRP, diretamente ou através do Secretário -Geral". Na Lei n.º 50/2014, que estabelece a orgânica destes serviços, define-se o SIS como "um serviço público que se integra no SIRP e depende diretamente do Primeiro -Ministro".

O organograma e estrutura dos serviços em causa mostram isso mesmo:

Contactado pelo Polígrafo, Vitalino Canas, constitucionalista e antigo secretário de Estado do PS e ex-membro do Conselho de Fiscalização das secretas refere que, do ponto de vista constitucional, "o Presidente da República não tem competências nesta área da segurança interna".

"A interpretação que faço em relação ao dever de informação é que o Primeiro-Ministro tem de informar o Presidente da República não sobre todos os aspetos operacionais referentes ao funcionamento dos serviços, mas em relação às questões de natureza mais programática, mais estratégica, sobre os grandes temas, as grandes prioridades e as grandes opções e não propriamente a propósito de todas as questões que tenham a ver com todos os eventos e questões que estejam relacionados com o SIS", defende o jurista.

Por outro lado, explica que "não se sabe exatamente que tipo de informação é que António Costa já dispunha nessa altura em relação à atuação do SIS". Ou seja, "se este [organismo] teria já informado o Primeiro-Ministro sobre o que tinha feito". Vitalino Canas admite que não, "porque se trata de uma ação de natureza operacional e não parece que o SIS informe o Primeiro-Ministro de todas as ações de natureza operacional que devem ser muito numerosas todos os dias".

O constitucionalista conclui que "não se pode falar de uma obrigação estrita" de António Costa em informar Marcelo Rebelo de Sousa. "Se estivéssemos a falar de um evento de magnitude gravíssima que o Primeiro-Ministro tivesse tido conhecimento ou intervenção, admito que sim", refere, mas entende que não é o caso. Já que não é algo que esteja resolvido com clareza na Constituição. A obrigação de informação que se poderia aplicar ao caso "resulta da lei e esta usa um conceito muito vago, indeterminado e aberto", esclarece.

Filipe de Almeida Calhau, advogado na Dantas Rodrigues & Associados é mais claro ao garantir que "o Primeiro-Ministro não tem que informar o Presidente da República de qualquer atividade em particular do SIS como a recuperação do computador do ex-assessor".

Na resposta ao Polígrafo, o advogado esclarece que compete a Costa, no exercício do seu poder de tutela, "determinar as atividades que o SIED e o SIS podem desenvolver", assim como "aprovar o plano anual de atividades do SIED, SIS e SIRP". É sobre estas temáticas que o chefe do Governo tem "o dever de manter especialmente informado o Presidente da República sobre a condução da atividade do SIRP", sublinha.

De resto, Almeida Calhau assegura de forma inequívoca que "não se encontra nem nas competências do Primeiro-Ministro nem nas Competências do Presidente da República controlar ou monitorizar as atividades desenvolvidas pelos serviços de informação, que estão devidamente enquadradas na lei e por isso sujeitas ao controlo dos tribunais como é apanágio do Estados de Direito Democrático".

____________________________

Avaliação do Polígrafo:

Assine a Pinóquio

Fique a par dos nossos fact checks mais lidos com a newsletter semanal do Polígrafo.
Subscrever

Receba os nossos alertas

Subscreva as notificações do Polígrafo e receba os nossos fact checks no momento!

Em nome da verdade

Siga o Polígrafo nas redes sociais. Pesquise #jornalpoligrafo para encontrar as nossas publicações.