A notícia foi amplamente divulgada, no final do mês de fevereiro, também nas redes sociais portuguesas e em órgãos considerados credíveis: «Tem barba ou bigode? É mais vulnerável ao coronavírus (…) A barba completa (…), bem como bigodes farfalhudos (…) podem reduzir a eficácia das máscaras, ao entrarem em contacto com elas, tenham ou não válvulas respiratórias. (…) as autoridades de saúde norte-americanas estão já a divulgar uma infografia que assinala os ‘penteados faciais’ seguros e aqueles que não o são».

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créditos: Pixabay

Nos Estados Unidos, onde terá surgido a recomendação, a notícia foi construída da mesma forma: «As máscaras e os respiradores têm sido usados em todo o mundo na tentativa de combater a disseminação global de coronavírus. O Centro de Controlo e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos (CDC) alerta que a barba pode interferir com estes dispositivos. Um gráfico do CDC mostra uma série de cortes, indicando aqueles que são compatíveis com máscaras com válvula respiratória. (…) A ideia é que o pêlo não atravesse a superfície de vedação da máscara.»

Os artigos sugerem, assim, que ter barba pode invalidar o efeito dos equipamentos de proteção, sobretudo aqueles com válvula respiratória, pelo que, para uma efetiva prevenção contra a Covid-19, os homens devem cortá-la, de modo a que este tipo de máscaras desempenhe a função para a qual foram criadas: não permitir nem a projeção, nem a inspiração de gotículas contaminadas com o vírus, através do isolamento total do nariz e da boca, e da filtragem do ar inspirado e expirado.

Porém, nem tudo o que parece é, e esta recomendação das autoridades de saúde norte-americanas para que os homens cortem a barba de forma a protegerem-se contra a Covid-19 é falsa, como revela o site norte-americano de verificação de factos Politifact.

A infografia a que as notícias se referem, e que desaconselha o uso de barba, é autêntica e da autoria do Centro de Controlo e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos. Porém, já foi elaborada no ano de 2017 e não está relacionada com a pandemia causada pelo novo coronavírus, nem com qualquer outra doença. O cartaz alerta, apenas, que alguns tipos de barba podem interferir com a correta utilização de máscaras com respirador, no local de trabalho. A imagem foi publicada no site do CDC durante o «no shave November», e é apenas uma das muitas infografias sobre proteção respiratória para ambientes laborais, feitas por aquele organismo de saúde pública.

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Na mesma página, o Centro deixa claro que não recomenda a utilização daquele tipo de máscaras fora do ambiente de trabalho, o que prova que a infografia não se refere especificamente à pandemia que o mundo atravessa.

Ainda assim, resta uma questão: como é que surgiu a informação falsa? A segunda notícia que transcrevemos parcialmente é do site Kron4.com que, curiosamente, cita a CNN como fonte para aquela informação. O Polígrafo visitou a página da televisão norte-americana que, em bom rigor, refere o constrangimento do uso de barba e de máscaras, mas de um modo genérico, sem particularizar a prevenção da Covid-19. No entanto, no final do artigo, há uma nota que responde à pergunta por esclarecer: «Correção: esta notícia foi atualizada para clarificar que o CDC lançou este guia em 2017 sobre a utilização de respiradores, e não é especificamente direcionado ao coronavírus».

Em conclusão, é possível afirmar que não existe qualquer indicação das autoridades de saúde norte-americanas para que homens com barba a cortem, de maneira a evitar a infeção por Covid-19. O que existe é um conjunto de diretrizes elaboradas pelo CDC há três anos, que desaconselham, de facto, o uso de barba, quando se utiliza uma máscara com respirador em ambiente laboral, para proteção respiratória mas não para combater o novo coronavírus. A título de exemplo, este equipamento é usado por profissionais de saúde ou até por trabalhadores da construção civil. Além disto, a autoridade de saúde pública dos Estados Unidos deixa claro que as máscaras com respirador não devem ser utilizadas em ambiente comunitário, pelo que fica de parte a proteção contra o vírus.

Esta, é a prova de que, sobretudo em tempos de crise e de muito fluxo noticioso, a desinformação também pode partir de órgãos de comunicação credíveis. É um facto que a CNN corrigiu o erro, porém a grande parte dos outros media que se baseou na televisão americana continua com os artigos inalterados e, por isso, a espalhar informação errada.

Avaliação do Polígrafo:

 

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