O processo de erradicação do analfabetismo tem sido motivo de orgulho em Portugal, mas as altas taxas registadas durante o Estado Novo deixaram marcas que permanecem nas gerações mais antigas. Um post divulgado esta semana no Facebook comprova isso mesmo, ao destacar que "em 1970, quase uma em cada três portuguesas era analfabeta".

O Polígrafo consultou os dados relativos a esse ano e estabeleceu uma comparação com os mais recentes. Como evoluiu esta taxa para as mulheres? E no geral, para toda a população? Como nos posicionamos em relação ao total da população?

Tendo por base os censos populacionais realizados na transição do século XIX para o século XX, disponibilizados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), podemos atentar na evolução da taxa de analfabetismo da população com idades iguais ou superiores a sete anos - alteração promovida pela primeira vez nos Censos de 1920, sendo a taxa de analfabetismo até essa data calculada sobre o total da população. Verifica-se assim uma queda de 78% em 1878 para 62% em 1930, cerca de 18 pontos percentuais (p.p).

De notar que as estatísticas publicadas na segunda metade do século XIX colocaram a descoberto os valores traumáticos relativos às taxas de analfabetismo, uma vez que a esmagadora maioria da população portuguesa nunca tinha frequentado a escolanão sabendo ler ou escrever. Este foi, assim, o grande foco do ativismo político republicano, sendo que a escola, em particular o ensino primário, passou a ser vista como o lugar privilegiado para a formação do cidadão eleitor.

  • Nível de escolaridade da população dos países da Europa de Leste é muito superior à de Portugal?

    O economista Ricardo Paes Mamede apresenta dados estatísticos que apontam nesse sentido, referentes à população entre 25 e 64 anos de idade que tem pelo menos o ensino secundário completo. Portugal destaca-se (pela negativa) na cauda da Europa, em contraste com os países da Europa de Leste que fizeram parte integrante da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) ou do Pacto de Varsóvia. Esses dados estão corretos?

Ainda assim, e não obstante esse investimento, a taxa de analfabetismo sofreu uma redução frugal. Entre os Censos de 1911, em que a taxa de analfabetismo dos maiores de sete anos era de 69%, e os Censos de 1930, intervalo que abrange genericamente o período republicano, essa descida foi de apenas sete pontos percentuais, atingindo cerca de 62% no final deste último ano, valor sustentado por variáveis como o atraso económico do país ou ainda a concentração da população em zonas rurais.

Salto para 1970, ano destacado na publicação e período no qual, segundo a Pordata, 25,7% da população era ainda analfabeta, perfazendo um total de dois milhões de cidadãos que não sabiam ler ou escrever. À data, de facto, 31% das mulheres não sabiam ler ou escrever. Ou seja, quase uma em cada três.

Nos homens, a percentagem era de apenas 19,7% e este fosso permaneceu até 2011, ano em que 6,8% das mulheres ainda eram analfabetas, face a apenas 3,5% dos homens. Neste ano, e comparativamente a 1960 (26,6% homens analfabetos e 39% de mulheres analfabetas), importa no entanto notar uma descida significativa da taxa geral de analfabetismo relacionada com a dissolução do Império Português.

Em consequência das transformações económicas, sociais e culturais de Portugal ao longo do século XX, a taxa de analfabetismo foi sendo cada vez menor, atingindo valores mínimos de cerca de 5%. Ou seja, meio milhão de pessoas, registadas no último momento censitário, em 2011.

Ainda assim, se atentarmos no universo populacional verificamos que estas descidas e subidas não são, ao contrário do previsto, tão significativas: a população portuguesa foi aumentando à medida que a taxa de analfabetismo foi descendo, o que significa que o número de analfabetos se manteve elevado e dentro de valores semelhantes durante alguns anos.

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Avaliação do Polígrafo:

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