“61% dos adultos portugueses tem rendimentos dependentes do Estado, seja este o pagador direto dos mesmos (50%), seja o decisor do rendimento pago pelo setor produtivo (11% recebe o salário mínimo, fixado pelo Estado)”, destaca-se num tweet do Instituto “+Liberdade”, que se dedica à “produção e divulgação de ideias/conhecimento para uma sociedade livre, democrática e desenvolvida”, no dia 22 de janeiro.
O tweet é acompanhado por um gráfico em que se compara a estrutura de rendimentos da população adulta portuguesa que vota, em percentagem, entre 1980 e 2022. E conclui-se que 61% do eleitorado tem rendimento diretamente dependente do Estado, com destaque para os pensionistas (35%), os trabalhadores com o salário mínimo (11%) e os funcionários públicos.
O gráfico em causa é uma adaptação de um outro que integrava o ensaio sobre “Eleições e Reformas” do economista e atual presidente da Associação Portuguesa de Bancos, Vítor Bento, publicado em 6 de fevereiro de 2022 no jornal “Observador“.
O original fazia a comparação entre 1980 e 2020, ao passo que o mais recente atualiza os dados para o ano de 2022. Mas como é que se chega a estas contas?
O Polígrafo contactou o autor do gráfico original que explicou que o universo utilizado para calcular estas percentagens é a população residente de nacionalidade portuguesa com mais de 18 anos. Tendo em conta que os Censos de 2021, os mais recentes realizados (os Censos realizam-se de 10 em 10 anos), dividem a população em blocos etários, e que a população a partir dos 18 anos se encontra inserida no bloco dos 15 aos 19 anos, Vítor Bento estimou que dois quintos desse bloco fossem a proporção de pessoas entre os 18 e 19 anos.
Com base nestes cálculos, o economista afirma que chegou ao número de 6.759.216 eleitores em 1981 e 8.234.805 em 2021.
Quanto ao número de funcionários públicos, Bento explica que inclui os trabalhadores das Administrações Públicas e Segurança Social e empresas das Administrações Públicas e se baseia nos dados da Pordata (que, por sua vez, têm como fonte o Instituto Nacional de Estatística). Chegou à conclusão de que o número de funcionários públicos em 1981 era de 476.726 e em 2021 a cifra era de 879.952, o que se traduz em 7% e 10,7%, respetivamente.
Passando aos trabalhadores com subsídio de desemprego, eram, segundo Vítor Bento, 58.869 em 1981 e 212.978 em 2021, o que reflete uma percentagem de 0,8% e 2,5%. Já em relação aos beneficiários de Rendimento Social de Inserção (RSI), em 1981 não existia e em 2021 eram 262.210 beneficiários, traduzindo-se em 3,2%.
Relativamente aos pensionistas, sublinha que “não existe um número de pensionistas, mas sim o número de pensões atribuídas” e, havendo pessoas que acumulam mais do que uma pensão, considerou “que o número de pensionistas era de 85% do número de pensões porque cerca de 15% são duplicadas”. Assim, estimou que o número de pensionistas seja de 1.786.749 em 1981 e 2.899.832 em 2021. Portanto, 26% e 35%.
Por fim, nos trabalhadores com salário mínimo, o também professor universitário afirma que, mesmo não sendo pago pelo Estado, este é “um valor determinado pelo Estado, isto é, não resulta de uma um processo negocial da economia”. Tendo em conta que as estatísticas não fornecem o valor exato e trabalhadores que auferem o salário mínimo, “aplicando as percentagens à população empregada, cheguei em 2021 a um número que são 907.425 e em 1981 a 155.900”. Ou seja, 11% em 2021 e 2,3% em 1981.
Ainda que estes dados digam respeito a 2021, a base é a mesma: os Censos de 2021. As percentagens a que Bento chegou – com base em dados da Pordata – são coerentes com as apontadas no gráfico atualizado pelo Instituto “+Liberdade”.
Sobre estas conclusões, Bento deixa a seguinte nota: “Os números não são exatos, mas são a melhor estimativa possível da informação que existe. Se a percentagem é mais 1% ou menos 1% é irrelevante porque não altera a essência da comparação”.
O economista reforça que “não há nenhum juízo moral associado a esta comparação”, e dá o exemplo dos pensionistas, o grupo mais dependente, em termos percentuais, do rendimento do Estado. “Isto apenas mostra o resultado da evolução demográfica, o país tem envelhecido e, como tal, há mais pensionistas face à população ativa, mas não há nenhum qualificativo negativo que possa ser atribuído a estas pessoas”, conclui.
Em conclusão, ainda que as percentagens estejam alinhadas com os valores apresentados por Vítor Bento, esta é uma estimativa baseada em dados da Pordata e INE, a par de cálculos do próprio economista. A par disso, a questão do salário mínimo poderá ser questionável tendo em conta que esta remuneração não é paga pelo Estado, ou seja, não há uma dependência direta do Estado.
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Avaliação do Polígrafo: