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Comer toranja durante a quimioterapia agrava efeitos secundários? Depende da medicação

Saúde
O que está em causa?
Nas redes sociais sugere-se que comer toranja ou beber sumo de toranja pode agravar os efeitos secundários da quimioterapia. Será mesmo assim?

É uma afirmação recorrente em vários vídeos nas redes sociais: comer toranja ou beber sumo de toranja pode agravar os efeitos secundários da quimioterapia e, por isso, quem estiver a fazer esse tratamento não deve comer a fruta.

Mas será verdade? E o que é que explica esse fenómeno? Cláudia Caeiro, coordenadora do serviço de Oncologia do Hospital CUF Porto, explica, em conversa com o Viral, que é possível que aconteça com alguns medicamentos — não necessariamente apenas aqueles utilizados na quimioterapia.

Quem está a fazer quimioterapia não pode comer toranja?

Não há uma resposta concreta. A toranja pode ser um alimento contraindicado, mas só em alguns casos, e, quando acontecer, a equipa médica irá alertar o doente. 

A toranja pode interagir com medicação de duas formas, diz Cláudia Caeiro. Pode atuar sob “um sistema de enzimas que ajuda a processar e a metabolizar os medicamentos”, inibindo-o. 

Ao fazer isso, “os medicamentos não vão ser degradados e vão atingir concentrações muito mais elevadas no organismo”, “terão mais efeitos secundários, mais toxicidade”, porque vão existir no organismo em concentrações superiores às esperadas. 

Não há nenhum efeito secundário específico que advenha da ingestão de toranja: “Se eu tiver a acumulação de determinado medicamento vai ter uns efeitos secundários, se tiver a acumulação de outro medicamento vai ter outros efeitos secundários”, explica a médica.

Isso acontece não necessariamente com os medicamentos utilizados em quimioterapia, mas com “fármacos de nova geração utilizados para tratar cancro”, como Everolímus ou Pazopanib. 

E mesmo “coisas tão simples como os medicamentos que utilizamos para tratar a elevação do colesterol, as estatinas”, podem ter uma atuação mais agressiva quando consumidas com sumo de toranja.

O contrário também pode acontecer: a toranja pode fazer com que não haja absorção suficiente no intestino. É o caso de “algumas quimioterapias mais antigas, como a Temozolomida e a Lomustina, que devem ser tomadas com o estômago vazio, precisamente por isso”.

Também não é recomendável que se tome este tipo de fármacos com sumo de toranja “porque efetivamente vai haver uma inibição da sua absorção”, o que vai fazer com que não haja o efeito pretendido devido à baixa concentração do fármaco no sangue.

Cláudia Caeiro sublinha que a toranja só será contraindicada “se realmente estiver demonstrado que existe uma interação com aquele medicamento em específico”. 

“Diremos aos doentes que não devem consumir toranja durante o período do tratamento consoante o tipo de fármaco envolvido”, adianta.

Por tudo isto, a alegação de que qualquer pessoa que esteja a fazer quimioterapia não pode comer toranja porque irá desenvolver efeitos secundários mais agressivos não é inteiramente verdade. 

Muitos dos fármacos com os quais a toranja interage não são sequer utilizados em quimioterapia, mas noutros tratamentos de cancro.


Este artigo foi desenvolvido no âmbito do “Vital”, um projeto editorial do Viral Check e do Polígrafo que conta com o apoio da Fundação Champalimaud.

A Fundação Champalimaud não é de modo algum responsável pelos dados, informações ou pontos de vista expressos no contexto do projeto, nem está por eles vinculado, cabendo a responsabilidade dos mesmos, nos termos do direito aplicável, unicamente aos autores, às pessoas entrevistadas, aos editores ou aos difusores da iniciativa.

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