“Para cumprir os objetivos do Pacto Ecológico Europeu, a União Europeia deve apostar nas energias renováveis ou na energia nuclear? Há outro caminho?” Em resposta a estas perguntas que lhe foram colocadas pelo jornal “Público”, a ex-líder do Bloco de Esquerda e agora candidata ao Parlamento Europeu defendeu que a União Europeia “tem de ter um grande plano de investimento de descarbonização” da economia, apostando nas energias renováveis, além de uma mudança nos “modos de produção e mobilidade”.
Na mesma resposta considerou que “o nuclear é que não é resposta”, exemplificando com os “acidentes nucleares” já registados “em várias zonas do mundo”. Mais, assinalou que “desde que foi assinado o Acordo de Paris, as emissões [de gases com efeito de estufa] não diminuíram. E, neste momento, o que os cientistas nos dizem é que as alterações provocadas pelo aquecimento global estão a ser mais rápidas do que se esperava”, daí a urgência da descarbonização.
Tem razão ao dizer que “as emissões não diminuíram”?
O referido Acordo de Paris foi adotado por 196 países na Conferência das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (COP21) em Paris, França, a 12 de dezembro de 2015 – tendo entrado em vigor cerca de um ano depois, a 4 de novembro de 2016. O seu principal objetivo consiste em assegurar um “aumento da temperatura média global bem abaixo dos 2°C em relação aos níveis pré-industriais” e encetar esforços para “limitar” esse aumento “a 1,5ºC”.
A alegação de Martins sustenta-se em dados do “Emissions Gap Report 2023” (“Relatório sobre o Défice de Emissões 2023”, em tradução livre), divulgado pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) no final do ano passado. O documento apresenta um gráfico que sistematiza o valor total de emissões de gases com efeito de estufa (GEE) líquidas entre 1990 e 2022, ao nível global.
De acordo com os dados do gráfico, o montante total das emissões aumentou gradualmente ao longo desse período, com ligeiras oscilações pelo meio. Subiu de 37,9 gigatoneladas de Dióxido de Carbono Equivalente (GtCO₂e) registadas em 1990 para 41,8 em 2000, 51,6 em 2010 e 54,5 em 2020. Entretanto atingiu um novo recorde de 57,4 gigatoneladas em 2022, valor mais alto de que há registo.
Entre 2010 e 2022, apenas se registou uma quebra nas emissões que pode ser considerada mais expressiva: de 2019 para 2020, “induzida pela pandemia de Covid-19”. Após esse breve período, “todos os setores, com exceção dos transportes, recuperaram totalmente da queda” registada nas emissões e “excedem agora os níveis de 2019”.
O mesmo relatório indica que as “emissões de CO₂ provenientes da combustão de combustíveis fósseis e dos processos industriais foram os principais contribuintes para o aumento global, representando cerca de dois terços das atuais emissões de GEE”. E também que as “emissões de metano (CH4), óxido nitroso (N2O) e gases fluorados (F-gases), que têm potenciais de aquecimento global mais elevados e representam cerca de um quarto das atuais emissões de GEE, estão a aumentar rapidamente: em 2022, as emissões de F-gases aumentaram 5,5%, seguidas das de CH4, 1,8%, e de N2O, 0,9%”.
Pelo que a alegação de Martins é verdadeira. Mas importa ter em atenção que, segundo um relatório lançado em 2022 pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês), “para limitar o aquecimento a cerca de 1,5°C (2,7°F) é necessário que as emissões globais de gases com efeito de estufa atinjam o seu máximo antes de 2025, o mais tardar” – ou seja, apenas no próximo ano -, “e sejam reduzidas em 43% até 2030”. Isto ao mesmo tempo que “o metano também teria de ser reduzido em cerca de um terço”.
Uma análise que resulta na seguinte conclusão: “Mesmo que o façamos, é quase inevitável que ultrapassemos temporariamente este limiar de temperatura, mas poderemos voltar a situar-nos abaixo dele até ao final do século.”
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